VERSO 6
etāṁ sa āsthāya parātma-niṣṭhām
adhyāsitāṁ pūrvatamair mahadbhiḥ
ahaṁ tariṣyāmi duranta-pāraṁ
tamo mukundāṅghri-niṣevayaiva
etām — isto; saḥ — tal; āsthāya — estando inteiramente fixo em; para-ātma-niṣṭhām — devoção pela Pessoa Suprema, Kṛṣṇa; adhyāsitām — adorado; pūrvatamaiḥ — por anteriores; mahadbhiḥ — ācāryas; aham — eu; tariṣyāmi — cruzarei; duranta-pāram — o intransponível; tamaḥ — o oceano de ignorância; mukunda-aṅghri — aos pés de lótus de Mukunda; niṣevayā — pela adoração; eva — com certeza.
[Conforme disse um brāhmaṇa de Avantī-deśa:] “Cruzarei o intransponível oceano de ignorância me fixando firmemente no serviço aos pés de lótus de Kṛṣṇa. Isso foi aprovado pelos ācāryas anteriores, que estavam fixos em firme devoção pelo Senhor, Paramātmā, a Suprema Personalidade de Deus.”
SIGNIFICADO—Em relação a este verso, citado do Śrīmad-Bhāgavatam (11.23.58), Śrīla Bhaktisiddhānta Sarasvatī Ṭhākura diz que, dos sessenta e quatro itens necessários para se prestar serviço devocional, a aceitação das marcas simbólicas de sannyāsa é um princípio regulador. Se alguém aceita a ordem de sannyāsa, sua obrigação principal é dedicar sua vida inteiramente a serviço de Mukunda, Kṛṣṇa. Quem não ocupa mente e corpo integralmente no serviço ao Senhor não se torna um sannyāsī de verdade. Não se trata apenas de trocar de vestimenta. A Bhagavad-gīta (6.1) também afirma que anāśritaḥ karma-phalaṁ kāryaṁ karma karoti yaḥ/ sa sannyāsī ca yogī ca: sannyāsī é aquele que trabalha devotadamente para a satisfação de Kṛṣṇa. A vestimenta não é sannyāsa, mas, sim, a atitude de serviço a Kṛṣṇa.
A expressão parātma-niṣṭhā significa “ser devoto do Senhor Kṛṣṇa.” Parātmā, a Pessoa Suprema, é Kṛṣṇa. Īśvaraḥ paramaḥ kṛṣṇaḥ sac-cid-ānanda-vigrahaḥ. Verdadeiros sannyāsīs são aquelas pessoas que se dedicam inteiramente aos pés de lótus de Kṛṣṇa em serviço. Por questão de formalidade, o devoto aceita a vestimenta de sannyāsa, como o fizeram os ācāryas anteriores. Ele também aceita os três daṇḍas. Posteriormente, Viṣṇu Svāmī considerou ser parātma-niṣṭha o ato de aceitar a vestimenta de tridaṇḍī. Os devotos sinceros, portanto, acrescentam outro daṇḍa, o jīva-daṇḍa, aos três daṇḍas existentes. O sannyāsī vaiṣṇava é conhecido como tridaṇḍī-sannyāsī. O sannyāsī māyāvādī aceita apenas um daṇḍa, não compreendendo o propósito do tridaṇḍa. Mais tarde, muitas pessoas da comunidade de Śiva Svāmī abandonaram o ātma-niṣṭha (serviço devocional) ao Senhor e seguiram o caminho de Śaṅkarācārya. Ao invés de aceitarem 108 nomes, os membros da Śiva Svāmī-sampradāya seguiram o caminho de Śaṅkarācārya e aceitaram os dez nomes de sannyāsa. Embora Śrī Caitanya Mahāprabhu aceitasse a então existente ordem de sannyāsa (a saber, ekadaṇḍa), Ele, mesmo assim, recitou um verso do Śrīmad-Bhāgavatam sobre o tridaṇḍa-sannyāsa aceito pelo brāhmaṇa de Avantīpura. Indiretamente, Ele declarou que, dentro daquele ekadaṇḍa, um daṇḍa, existiam quatro daṇḍas como um. Para Śrī Caitanya Mahāprabhu, aceitar ekadaṇḍa-sannyāsa sem parātma-niṣṭha (serviço devocional ao Senhor Kṛṣṇa) não é admissível. Além do mais, segundo os princípios reguladores exatos, deve-se acrescentar o jīva-daṇḍa ao tridaṇḍa. Esses quatro daṇḍas, atados juntos como se fossem um, simbolizam o serviço devocional puro ao Senhor. Como os ekadaṇḍī-sannyāsīs da escola māyāvāda não se dedicam ao serviço a Kṛṣṇa, eles procuram se fundir na refulgência de Brahman, que é uma posição marginal entre a existência material e a espiritual. Eles aceitam essa posição impessoal como liberação. Os sannyāsīs māyāvādīs, ignorando que Śrī Caitanya Mahāprabhu era um tridaṇḍī, consideram-nO um ekadaṇḍi-sannyāsī. Isso se deve a vivarta, ou confusão. No Śrīmad-Bhāgavatam, não há tal coisa como um ekadaṇḍi-sannyāsī; de fato, aceita-se o tridaṇḍi-sannyāsī como a representação simbólica da ordem de sannyāsa. Ao citar esse verso do Śrīmad-Bhāgavatam, Śrī Caitanya Mahāprabhu aceitou a ordem de sannyāsa recomendada no Śrīmad-Bhāgavatam. Os sannyāsīs māyāvādīs, estando enamorados da energia externa do Senhor, não podem entender a mente de Śrī Caitanya Mahāprabhu.
Até a presente data, todos os devotos de Śrī Caitanya Mahāprabhu, seguindo Seus passos, aceitam a ordem de sannyāsa e mantêm o cordão sagrado e o tufo de cabelo não raspado. Os ekadaṇḍi-sannyāsīs da escola māyāvādī abandonam o cordão sagrado e não mantêm nenhum tufo de cabelo. Eles são, portanto, incapazes de compreender o significado de tridaṇḍa-sannyāsa, de maneira que não se sentem inclinados a dedicar suas vidas a serviço de Mukunda. Por estarem desgostosos com a existência material, só fazem pensar em fundir-se na existência de Brahman. Os ācāryas defensores do daiva-varṇāśrama (a ordem social de cātur-varṇyam mencionada na Bhagavad-gītā) não aceitam a proposta do āsura-varṇāśrama, a qual sustenta que a ordem social de varṇa é determinada pelo nascimento.
O devoto mais íntimo de Śrī Caitanya Mahāprabhu, a saber, Gadādhara Paṇḍita, aceitou tridaṇḍa-sannyāsa e também aceitou Mādhava Upādhyāya como seu discípulo tridaṇḍi-sannyāsī. Afirma-se que, desse Mādhavācārya, originou-se o sampradāya conhecido na Índia ocidental como Vallabhācārya-sampradāya. Śrīla Gopāla Bhaṭṭa Gosvāmī, conhecido como um smṛty-ācārya no Gauḍiya-vaiṣṇava-sampradāya, mais tarde aceitou de Tridaṇḍipāda Prabodhānanda Sarasvatī a ordem de tridaṇḍa-sannyāsa. Embora não se mencione distintamente na literatura vaiṣṇava gauḍīya a aceitação de tridaṇḍa-sannyāsa, o primeiro verso do Upadeśāmṛta, de Śrīla Rūpa Gosvāmī, advoga que se deve aceitar a ordem de tridaṇḍa-sannyāsa através do controle dos seis impulsos:
vāco vegaṁ manasaḥ krodha-vegaṁ
jihvā-vegam udaropastha-vegam
etān vegān yo viṣaheta dhīraḥ
sarvām apīmāṁ pṛthivīṁ sa śiṣyāt
“Aquele que pode controlar os impulsos da fala, da mente, da ira, do estômago, da língua e dos órgãos genitais é conhecido como gosvāmī, sendo competente para aceitar discípulos em todo o mundo.” Os seguidores de Śrī Caitanya Mahāprabhu jamais aceitaram a ordem de sannyāsa māyāvāda, e não se pode censurá-los por isso. Śrī Caitanya Mahāprabhu aceitou Śrīdhara Svāmī, que era um tridaṇḍi-sannyāsī, mas os sannyāsīs māyāvādīs, não compreendendo Śrīdhara Svāmī, às vezes pensam que ele pertencia à comunidade māyāvāda de ekadaṇḍa-sannyāsa. Na realidade, não é esse o caso.