Capítulo 2
Orações dos Semideuses ao Senhor Kṛṣṇa Situado no Ventre
O rei Kaṁsa não só ocupou os reinos das dinastias Yadu, Bhoja e Andhaka e o reino de Śūrasena, como também fez alianças com todos os outros reis demoníacos. Esses reis eram o demônio Pralamba, o demônio Baka, o demônio Cāṇūra, o demônio Tṛṇāvarta, o demônio Aghāsura, o demônio Muṣṭika, o demônio Ariṣṭa, o demônio Dvivida, a demônia Pūtanā, o demônio Keśī e o demônio Dhenuka. Naquela época, Jarāsandha era o rei de Magadha (conhecida hoje como o estado de Bihar). Desta forma, mediante sua política e diplomacia, Kaṁsa consolidou o reino mais poderoso de seu tempo, sob a proteção de Jarāsandha. Kaṁsa ainda fez alianças com reis tais como Bāṇāsura e Bhaumāsura, até se tornar o mais forte de todos os reis. Então, começou a agir com muita hostilidade contra a dinastia Yadu, na qual nasceria Kṛṣṇa.
Sendo atormentados por Kaṁsa, os reis das dinastias Yadu, Bhoja e Andhaka começaram a buscar refúgio em diferentes estados, como o estado dos Kurus, o estado dos Pañcālas e os estados conhecidos como Kekaya, Śālva, Vidharba, Niṣadha, Videha e Kośala. Kaṁsa rompeu a solidariedade dos reinos Yadu, Bhoja e Andhaka. Ele fez com que sua posição fosse a mais sólida em todo o subcontinente indiano, conhecido naquele tempo como Bhārata-varṣa.
Quando Kaṁsa matou os seis bebês de Vasudeva e Devakī, um após o outro, muitos amigos e parentes seus aproximaram-se dele e pediram-lhe que parasse com essas atividades odiosas. Contudo, todos se tornaram seus adoradores e bajuladores.
Quando Devakī ficou grávida pela sétima vez, uma expansão plenária de Kṛṣṇa conhecida como Ananta apareceu dentro de seu útero. Devakī ficou cheia de júbilo e de lamentação. Ela estava alegre porque podia compreender que o Senhor Viṣṇu Se refugiara em seu ventre, mas, ao mesmo tempo, estava triste, pois, logo que seu filho aparecesse, Kaṁsa O mataria. Naquela ocasião, a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, ordenou o aparecimento de Sua potência interna, ou Yogamāyā, por ter compaixão da lamentável situação dos Yadus, graças às atrocidades cometidas por Kaṁsa. Kṛṣṇa é o Senhor do universo, mas Ele é especialmente o Senhor da dinastia Yadu.
Esta Yogamāyā é a principal potência da Personalidade de Deus. Afirma-se nos Vedas que o Senhor, a Suprema Personalidade de Deus, tem multipotências. Parāsya śaktir vividhaiva śrūyate. Todas as diferentes potências estão agindo externa e internamente, sendo Yogamāyā a principal de todas as potências. O Senhor ordenou o aparecimento de Yogamāyā na terra de Vrajabhūmi, em Vṛndāvana, que está sempre enfeitada e cheia de belas vacas. Em Vṛndāvana, Rohiṇī, uma das esposas de Vasudeva, estava residindo na casa do rei Nanda e da rainha Yaśodā. Não só Rohiṇī, mas muitos outros da dinastia Yadu estavam espalhados por todo o país por temerem as atrocidades de Kaṁsa. Alguns deles até mesmo viviam nas cavernas das montanhas.
O Senhor assim informou Yogamāyā: “Na prisão de Kaṁsa estão Devakī e Vasudeva, e, neste momento, Minha expansão plenária, Śeṣa, está dentro do útero de Devakī. Você pode arranjar a transferência de Śeṣa do ventre de Devakī para o útero de Rohiṇī. Depois deste arranjo, Eu aparecerei pessoalmente no útero de Devakī com todas as Minhas potências. Então, aparecerei como o filho de Devakī e de Vasudeva. E você deve aparecer como a filha de Nanda e Yaśodā em Vṛndāvana”.
“Considerando que você aparecerá como Minha irmã contemporânea, as pessoas dentro do mundo vão adorá-la com todas as espécies de presentes valiosos: incensos, velas, flores e oferendas de sacrifício. Você satisfará rapidamente os desejos de gozo dos sentidos de seus adoradores. As pessoas que buscam perfeição materialista vão adorá-la sob as diferentes formas de suas expansões, que se chamarão Durgā, Bhadrakālī, Vijayā, Vaiṣṇavī, Kumudā, Caṇḍikā, Kṛṣṇā, Mādhavī, Kanyakā, Māyā, Nārāyaṇī, Īśānī, Śāradā e Ambikā”.
Kṛṣṇa e Yogamāyā apareceram como irmão e irmã – o Poderoso Supremo e o poder supremo. Embora não exista uma distinção nítida entre o Poderoso e o poder, o poder está sempre subordinado ao Poderoso. Aqueles que são materialistas são adoradores do poder, mas aqueles que são transcendentalistas são adoradores do Poderoso. Kṛṣṇa é o Poderoso Supremo, e Durgā é o poder supremo dentro do mundo material. Na verdade, as pessoas na cultura védica adoram a ambos, o Poderoso e o poder. Há muitas centenas de milhares de templos de Viṣṇu e de Devī, e, às vezes, eles são adorados ao mesmo tempo. Quem adora o poder, ou seja, Durgā, a energia externa de Kṛṣṇa, pode ter muita facilidade em conseguir todos os tipos de sucesso material, mas qualquer pessoa que queira elevar-se transcendentalmente, deve ocupar-se em adorar o Poderoso em consciência de Kṛṣṇa.
O Senhor também declarou a Yogamāyā: “Minha expansão plenária, Ananta Śeṣa, está dentro do útero de Devakī. Por ter sido atraído à força para o útero de Rohiṇī, Ele será conhecido como Saṅkarṣaṇa e será a fonte de todo o poder espiritual, ou bala, através do qual será possível alcançar a mais alta felicidade da vida, que se chama ramaṇa. Por isso, a porção plenária Ananta será conhecida depois de Seu aparecimento como Saṅkarṣaṇa ou Balarāma”.
Afirma-se nos Upaniṣads que nāyam ātmā bala-hīnena labhyaḥ. O significado é que não se pode alcançar a suprema plataforma da autorrealização sem ser suficientemente favorecido por Balarāma. Bala não significa força física. Ninguém pode alcançar a perfeição espiritual pela força física. Deve-se ter força espiritual, que é infundida por Balarāma ou Saṅkarṣaṇa. Ananta, ou Śeṣa, é o poder que sustenta todos os planetas em suas diferentes posições. Materialmente, esse poder sustentador é conhecido como a lei da gravidade, mas, na verdade, ele é a exibição da potência de Saṅkarṣaṇa. Balarāma ou Saṅkarṣaṇa é o poder espiritual, ou o mestre espiritual original. Por isso, o Senhor Nityānanda Prabhu, que é também a encarnação de Balarāma, é o mestre espiritual original. E o mestre espiritual é o representante de Balarāma, a Suprema Personalidade de Deus, que fornece força espiritual. Confirma-se no Caitanya-caritāmṛta que o mestre espiritual é a manifestação da misericórdia de Kṛṣṇa.
Quando Yogamāyā recebeu essa ordem da Suprema Personalidade de Deus, ela circungirou o Senhor e, então, apareceu neste mundo material em cumprimento a essa ordem. Quando Yogamāyā, o poder supremo da Suprema e Poderosa Personalidade de Deus, transferiu o Senhor Śeṣa do útero de Devakī para o ventre de Rohiṇī, ambas estavam sob o seu encanto, também chamado de yoga-nidrā. Quando isso aconteceu, as pessoas pensaram que a sétima gravidez de Devakī fora um aborto. Assim, embora Balarāma tivesse vindo como filho de Devakī, Ele foi transferido para o ventre de Rohiṇī para aparecer como seu filho. Depois desse arranjo, a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, que está sempre pronto para proteger Seus devotos puros, entrou na mente de Vasudeva como o Senhor de toda a criação, com plenas potências inconcebíveis. Compreende-se neste contexto que o Senhor Kṛṣṇa primeiro situou-Se no coração puro de Vasudeva e, depois, foi transferido para o coração de Devakī. Ele não foi posto no útero de Devakī mediante uma descarga de sêmen. A Suprema Personalidade de Deus, por sua potência inconcebível, pode aparecer de qualquer maneira. Ele não precisa aparecer da maneira habitual, mediante a injeção seminal dentro do útero de uma mulher.
Quando Vasudeva mantinha em seu coração a forma da Suprema Personalidade de Deus, ele parecia o Sol radiante, cujos raios brilhantes são sempre insuportáveis e ardentes para o homem comum. A forma do Senhor situada no coração puro e imaculado de Vasudeva não é diferente da forma original de Kṛṣṇa. O aparecimento da forma de Kṛṣṇa em qualquer lugar, e especificamente no coração, chama-se dhāma. Dhāma não se refere só à forma de Kṛṣṇa, mas ao Seu nome, às Suas qualidades e à Sua parafernália. Tudo se manifesta simultaneamente.
Assim, a forma eterna da Suprema Personalidade de Deus plena de potências foi transferida da mente de Vasudeva para a mente de Devakī, exatamente como os raios do Sol poente se transferem para a Lua cheia que nasce no Oriente.
Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, entrou no corpo de Devakī vindo do corpo de Vasudeva sem se sujeitar a nenhum dos condicionamentos da entidade viva comum. Quando Kṛṣṇa está presente, deve-se entender que todas as Suas expansões plenárias, tais como Nārāyaṇa, e encarnações como o Senhor Nṛsiṁha e Varāha, estão com Ele; elas não estão sujeitas às condições da existência material. Dessa maneira, Devakī tornou-se a residência da Suprema Personalidade de Deus, que é único e inigualável e é a causa de toda a criação. Devakī tornou-se a residência da Verdade Absoluta, mas, por estar na casa de Kaṁsa, ela parecia exatamente como o fogo abafado ou como a erudição mal aplicada. Quando o fogo está coberto pelas paredes de uma panela ou é mantido em uma vasilha, não se podem apreciar seus raios luminosos. Assim também, o conhecimento mal aplicado, que não beneficia as pessoas em geral, não é muito apreciado. Devakī foi mantida dentro dos muros da prisão do palácio de Kaṁsa, e ninguém podia ver sua beleza transcendental resultante de ter concebido a Suprema Personalidade de Deus.
Kaṁsa, porém, viu a beleza transcendental de sua irmã Devakī e concluiu imediatamente que a Suprema Personalidade de Deus Se abrigara no seu útero. Nunca antes ela parecera tão maravilhosamente bela. Ele pôde compreender claramente que havia algo maravilhoso dentro do ventre de Devakī. Dessa maneira, Kaṁsa ficou perturbado. Ele tinha certeza de que a Suprema Personalidade de Deus, que o mataria no futuro, agora havia chegado. Kaṁsa começou a pensar: “O que se deve fazer com Devakī? Com certeza ela tem Viṣṇu ou Kṛṣṇa em seu ventre, de modo que é certo que Kṛṣṇa veio para executar a missão dos semideuses. E mesmo que eu mate Devakī imediatamente, a missão dEle não pode ser frustrada”. Kaṁsa sabia muito bem que ninguém pode frustrar o propósito de Viṣṇu. Qualquer homem inteligente pode entender que as leis de Deus não podem ser violadas. Seu propósito será cumprido, a despeito de todos os impedimentos que os demônios ofereçam. Kaṁsa pensou: “Se eu matar Devakī agora, Viṣṇu fará cumprir com mais veemência Sua vontade suprema. Matar Devakī bem agora seria um ato muito abominável. Ninguém deseja matar a própria reputação, mesmo em uma situação delicada; se eu mato Devakī agora, minha reputação será arruinada. Devakī é uma mulher e está sob minha proteção; ela está grávida, e, se eu a matar, imediatamente se acabarão toda a minha reputação, os resultados de minhas atividades piedosas e a duração de minha vida”.
Kaṁsa continuou pensando: “Uma pessoa que é muito cruel é como se estivesse morta, mesmo durante sua vida. Ninguém gosta de uma pessoa cruel enquanto ela está viva, e, depois de sua morte, as pessoas a amaldiçoam. Por causa de sua autoidentificação com o corpo, tal pessoa deve ser degradada e lançada à mais escura região do inferno”. Assim, Kaṁsa meditava em todos os prós e contras de matar Devakī naquele momento.
Kaṁsa terminou decidindo não matar Devakī imediatamente, mas esperar pelo futuro inevitável. No entanto, sua mente foi tomada pela forte aversão à Personalidade de Deus. Ele esperou pacientemente pelo nascimento da criança na expectativa de tirar Sua vida, assim como havia feito anteriormente com os outros filhos de Devakī. Estando imerso no oceano de aversão à Personalidade de Deus, Kaṁsa começou a pensar em Kṛṣṇa e Viṣṇu enquanto estava sentado, enquanto dormia, enquanto andava, enquanto comia, enquanto trabalhava – ou seja, em todas as situações de sua vida. Sua mente absorveu-se de tal maneira em pensar na Suprema Personalidade de Deus que, indiretamente, ele só conseguia ver Kṛṣṇa ou Viṣṇu a seu redor. Infelizmente, embora sua mente estivesse tão absorta pensando em Viṣṇu, Kaṁsa não é reconhecido como devoto, porque pensava em Kṛṣṇa como inimigo. O estado de espírito de um grande devoto também é de estar sempre absorto em Kṛṣṇa, mas um devoto pensa nEle de forma favorável, e não de forma desfavorável. Pensar em Kṛṣṇa de modo favorável é consciência de Kṛṣṇa, mas pensar em Kṛṣṇa de modo desfavorável não é consciência de Kṛṣṇa.
Nessa ocasião, o senhor Brahmā e o senhor Śiva, acompanhados por grandes sábios, como Nārada, e seguidos por muitos outros semideuses, apareceram invisivelmente na casa de Kaṁsa. Eles começaram a orar à Suprema Personalidade de Deus com versos seletos, que são muito agradáveis para os devotos e que concedem a realização de seus desejos. As primeiras palavras que disseram aclamavam o Senhor como fiel à Sua promessa. Como se diz no Bhagavad-gītā, Kṛṣṇa vem a este mundo material só para proteger os piedosos e destruir os ímpios. Essa é Sua promessa. Os semideuses podiam compreender que o Senhor havia estabelecido Sua residência no ventre de Devakī para cumprir Sua promessa e estavam muito satisfeitos pelo fato de o Senhor vir a este mundo para executar a Sua missão.
Foi então que os semideuses chamaram o Senhor Supremo de satyam param, ou a Suprema Verdade Absoluta. Todas as pessoas estão procurando a verdade. Este é o modo de vida filosófico. Os semideuses dão a informação de que a Suprema Verdade Absoluta é Kṛṣṇa. Quem se torna plenamente consciente de Kṛṣṇa pode alcançar a Verdade Absoluta. Kṛṣṇa é a Verdade Absoluta porque, ao contrário da verdade relativa, Ele é Verdade em todas as três fases do tempo eterno. O tempo divide-se em passado, presente e futuro. Kṛṣṇa é a Verdade sempre, no passado, no presente e no futuro. No mundo material, tudo é controlado pelo tempo supremo durante o passado, o presente e o futuro. Antes da criação, porém, Kṛṣṇa existia, e, quando existe a criação, tudo repousa em Kṛṣṇa; quando esta criação terminar, Kṛṣṇa permanecerá. Portanto, Ele é a Verdade Absoluta em todas as circunstâncias. Se existe alguma verdade neste mundo material, ela emana da Verdade Suprema, Kṛṣṇa. Se existe alguma opulência neste mundo material, a causa da opulência é Kṛṣṇa. Se existe alguma reputação neste mundo material, a causa da reputação é Kṛṣṇa. Se existe alguma força neste mundo material, a causa dessa força é Kṛṣṇa. Se existe alguma sabedoria e alguma educação neste mundo material, a causa dessa sabedoria e dessa educação é Kṛṣṇa. Portanto, Kṛṣṇa é a fonte de todas as verdades relativas.
Este mundo material compõe-se de cinco elementos principais – terra, água, fogo, ar e éter –, e todos esses elementos são emanações de Kṛṣṇa. Os cientistas materialistas aceitam estes cinco elementos primários como a causa da manifestação material, mas os elementos em seu estado grosseiro e sutil são produzidos por Kṛṣṇa. As entidades vivas que trabalham neste mundo material são também produtos de Sua potência marginal. No sétimo capítulo do Bhagavad-gītā, é dito claramente que toda a manifestação é uma combinação de duas espécies de energias de Kṛṣṇa: a energia superior e a energia inferior. As entidades vivas são a energia superior, e os elementos materiais inanimados são Sua energia inferior. Em sua fase latente, tudo permanece em Kṛṣṇa.
Os semideuses continuaram a oferecer suas orações respeitosas à suprema forma da Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, através do estudo analítico da manifestação material. O que é esta manifestação material? É exatamente como uma árvore que se ergue do chão. A árvore da manifestação material ergue-se do chão da natureza material. Compara-se esta manifestação material a uma árvore porque a árvore acaba sendo cortada no momento oportuno. O nome em sânscrito para árvore é vṛkṣa, que quer dizer “aquilo que acabará sendo cortado”. Portanto, não se pode aceitar esta árvore da manifestação material como a Verdade Última. A influência do tempo age sobre a manifestação material, mas o corpo de Kṛṣṇa é eterno. Ele existia antes da manifestação material, Ele está existindo enquanto dura a manifestação material e, quando ela se dissolver, Ele continuará a existir.
O Kaṭha Upaniṣad também cita este exemplo da árvore da manifestação material, que se ergue no solo da natureza material. Essa árvore tem duas espécies de frutos: sofrimento e felicidade. Aqueles que estão vivendo na árvore do corpo são como dois pássaros. Um pássaro é o aspecto localizado de Kṛṣṇa conhecido como Paramātmā, e o outro pássaro é a entidade viva, que está comendo os frutos desta manifestação material. Ora come o fruto da felicidade, ora o fruto do sofrimento. O outro pássaro, não obstante, não está interessado em comer o fruto do sofrimento ou da felicidade, porque está satisfeito consigo mesmo. O Kaṭha Upaniṣad diz que um pássaro na árvore do corpo come os frutos, enquanto o outro simplesmente testemunha. As raízes dessa árvore estendem-se em três direções. Isso quer dizer que a raiz da árvore é os três modos da natureza material: bondade, paixão e ignorância. Assim como as raízes da árvore expandem-se, a pessoa, pela associação com os modos da natureza material (bondade, paixão e ignorância), expande a duração de sua existência material. Os sabores dos frutos são de quatro espécies: religiosidade, desenvolvimento econômico, gozo dos sentidos e, por fim, libertação. De acordo com as diferentes associações com os três modos da natureza material, as entidades vivas experimentam diferentes espécies de religiosidade, diferentes espécies de desenvolvimento econômico, diferentes espécies de gozo dos sentidos e diferentes espécies de libertação. Praticamente todo trabalho material é executado em ignorância, mas, como há três qualidades, às vezes a qualidade da ignorância cobre-se com a bondade ou com a paixão. O sabor desses frutos materiais é recebido através dos cinco sentidos. Os cinco órgãos dos sentidos, através dos quais se adquire conhecimento, estão sujeitos a seis espécies de flagelos: lamentação, ilusão, doença, morte, fome e sede. Este corpo material, ou a manifestação material, está coberto por sete camadas: pele, músculo, carne, medula, osso, gordura e sêmen. Os galhos da árvore são oito: terra, água, fogo, ar, éter, mente, inteligência e ego. Há nove portões neste corpo: dois olhos, duas narinas, dois ouvidos, uma boca, um órgão genital e um reto. E há dez espécies de ares internos por dentro do corpo: prāṇa, apāna, udāna, vyāna, samāna etc. Os dois pássaros situados nessa árvore, como se explicou acima, são a entidade viva e a Suprema Personalidade de Deus localizada, Paramātmā.
A causa fundamental da manifestação material descrita aqui é a Suprema Personalidade de Deus. A Suprema Personalidade de Deus Se expande e Se encarrega das três qualidades do mundo material. Viṣṇu Se encarrega do modo da bondade, Brahmā se encarrega do modo da paixão e o senhor Śiva se encarrega do modo da ignorância. Brahmā, através do modo da paixão, cria esta manifestação, o Senhor Viṣṇu mantém esta manifestação através do modo da bondade, e o senhor Śiva aniquila mediante o modo da ignorância. Em última instância, toda a criação repousa no Senhor Supremo. Ele é a causa da criação, manutenção e dissolução. E quando toda a manifestação dissolve-se, em sua forma sutil como a energia do Senhor, ela repousa dentro do corpo do Senhor Supremo.
“No momento presente”, rezaram os semideuses, “o Supremo Senhor Kṛṣṇa está aparecendo somente para manter esta manifestação”. De fato, a Causa Suprema é uma só, mas, sendo iludidas pelos três modos da natureza material, pessoas menos inteligentes veem como se o mundo material se manifestasse através de diferentes causas. Aqueles que são inteligentes podem ver que a causa é uma só: Kṛṣṇa. Como se diz na Brahma-saṁhitā: sarva-kāraṇa-kāraṇam. “Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, é a causa de todas as causas”. Brahmā é o agente encarregado da criação, Viṣṇu é a expansão de Kṛṣṇa para a manutenção e o senhor Śiva é a expansão de Kṛṣṇa para a dissolução.
“Nosso querido Senhor”, oraram os semideuses, “é muito difícil entender Sua forma e personalidade eterna. As pessoas em geral são incapazes de entender Sua verdadeira forma, em virtude do que Você vem pessoalmente para exibir Sua eterna forma original. De algum modo, as pessoas podem entender Suas diferentes encarnações, mas ficam confusas tentando entender a forma eterna de Kṛṣṇa com duas mãos, que anda entre os seres humanos exatamente como um deles. Essa Sua forma eterna é para os devotos um prazer transcendental sempre crescente. Todavia, para os não devotos, é muito perigosa”. Como se diz no Bhagavad-gītā, Kṛṣṇa é muito agradável para o sādhu (paritrāṇāya sādhunām). Essa forma, entretanto, é muito perigosa para os demônios, porque Kṛṣṇa também desce para matar os demônios. Ele é, portanto, agradável para os devotos e, ao mesmo tempo, perigoso para os demônios.
“Nosso querido Senhor de olhos de lótus, Você é a fonte da bondade pura. Há muitos grandes sábios que apenas por samādhi, ou pela meditação transcendental em Seus pés de lótus, transformaram com facilidade o grande oceano de ignorância criado pela natureza material em não mais que a água contida na pegada de um bezerro. Esses grandes sábios ficam absortos em pensar em Você”. A finalidade da meditação é focalizar a mente na Personalidade de Deus, começando por Seus pés de lótus. Pela simples meditação nos pés de lótus do Senhor, grandes sábios atravessam este vasto oceano da existência material sem dificuldade.
“Ó autoiluminado, as grandes pessoas santas, que atravessaram o oceano da ignorância com a ajuda do barco transcendental de Seus pés de lótus, não levaram embora o barco. Ele ainda está deste lado”. Se alguém pega um barco para atravessar um rio, o barco também vai com ele para o outro lado. E, assim, quando se alcança o destino, como pode o mesmo barco ser usado pelos que ainda ficaram do outro lado? Em resposta a essa dificuldade, os semideuses dizem em sua oração que o barco dos pés de lótus do Senhor não é levado embora. Os devotos que ainda estão deste lado são capazes de atravessar o oceano da natureza material porque os devotos puros não levam consigo o barco quando atravessam o rio. Quando alguém simplesmente se aproxima do barco, todo o oceano da ignorância material é reduzido à quantidade de água contida na pegada de um bezerro. Por isso, os devotos não precisam levar o barco para o outro lado; eles simplesmente atravessam o oceano imediatamente. Porque as grandes pessoas santas são compassivas com todas as almas condicionadas, o barco ainda está neste lado. Pode-se meditar em Seus pés a qualquer hora e, por assim fazer, pode-se atravessar o grande oceano da existência material.
Meditação quer dizer concentração nos pés de lótus do Senhor. Pés de lótus indicam a Suprema Personalidade de Deus. Contudo, aqueles que são impersonalistas não reconhecem os pés de lótus do Senhor, motivo pelo qual seu objeto de meditação é algo impessoal. Os semideuses expressam seu veredito maduro de que pessoas que estão interessadas em meditar em algo vazio ou impessoal não podem atravessar o oceano da ignorância. Tais pessoas estão apenas imaginando que se tornaram libertas. “Ó Senhor de olhos de lótus! A inteligência dessas pessoas está contaminada porque elas não conseguem meditar em Seus pés de lótus. Como resultado dessa atividade negligente, os impersonalistas caem de novo na vida condicionada material, embora se elevem temporariamente até o ponto da realização impessoal”. Os impersonalistas submetem-se a severas austeridades e penitências para se fundirem na refulgência Brahman, ou existência impessoal Brahman. Suas mentes, todavia, não estão livres da contaminação material; eles simplesmente tentam negar as maneiras materiais de pensar. Isso não quer dizer que se tornaram libertos. Assim eles caem.
No Bhagavad-gītā, afirma-se que o impersonalista tem de sofrer grande tribulação para realizar a meta última. No início do Śrīmad-Bhāgavatam, também se diz que, sem serviço devocional à Suprema Personalidade de Deus, não se pode alcançar a libertação do cativeiro das atividades fruitivas. A afirmação do Senhor Kṛṣṇa está lá no Bhagavad-gītā e, no Śrīmad-Bhāgavatam, está a afirmação do grande sábio Nārada, e aqui também os semideuses a confirmam. “Entende-se que as pessoas que não adotam o serviço devocional não alcançam o propósito final do conhecimento e não são favorecidas por Sua graça”. Os impersonalistas apenas pensam que estão libertos, mas, de fato, não sentem nada pela Suprema Personalidade de Deus. Esses impersonalistas acham que, quando Kṛṣṇa vem ao mundo material, Ele aceita um corpo material. Por isso, eles não dão atenção ao corpo transcendental de Kṛṣṇa. Isso também se confirma no Bhagavad-gītā: avajānanti māṁ mūḍhāḥ. Apesar de vencerem a luxúria material e de elevarem-se até o ponto da libertação, os impersonalistas caem. Se eles apenas se ocupam em saber as coisas por saber e não adotam o serviço devocional ao Senhor, eles não podem alcançar o resultado desejado. O que eles conseguem são as dificuldades que encontram, e nada mais.
Alega-se claramente no Bhagavad-gītā que compreender a identificação com o Brahman não é tudo. A identificação com o Brahman pode ajudar a pessoa a tornar-se alegre sem apego ou desapego material e a alcançar a plataforma da equanimidade, mas, depois dessa fase, é preciso adotar o serviço devocional. Quando alguém adota o serviço devocional depois de ter sido elevado à plataforma da realização Brahman, ele é admitido no reino espiritual para residência permanente em associação com a Suprema Personalidade de Deus. Esse é o resultado do serviço devocional. Aqueles que são devotos da Suprema Personalidade de Deus, diferentemente dos impersonalistas, jamais caem. Mesmo que caiam, esses devotos permanecem apegados afetuosamente a seu Senhor. Eles podem encontrar todas as espécies de obstáculos no caminho do serviço devocional, mas, sem nenhum medo, conseguem superar tais obstáculos. Por causa de sua rendição, eles têm certeza de que Kṛṣṇa sempre os protegerá, como promete no Bhagavad-gītā: “Meus devotos jamais são vencidos”.
“Nosso querido Senhor”, continuaram os semideuses, “Você aparece em Sua forma original imaculada, a eterna forma da bondade, para o bem-estar de todos os seres vivos dentro deste mundo material. Aproveitando-se de Seu aparecimento, todos agora podem facilmente entender a natureza e a forma da Suprema Personalidade de Deus. Todas as pessoas que pertencem às quatro divisões da ordem social (brahmācarīs, gṛhasthas, vānaprasthas e sannyāsīs) podem tirar proveito de Seu aparecimento”.
“Querido Senhor, esposo da deusa da fortuna, os devotos que se ocupam em Seu serviço não caem da elevada posição que estão, ao contrário dos impersonalistas. Estando protegidos por Você, os devotos são capazes de passar por cima dos muitos generais de māyā, que sempre põem obstáculos no caminho da libertação. Querido Senhor, Você aparece em Sua forma transcendental para o benefício das entidades vivas, para que elas possam, assim, vê-lO face a face e oferecer seus sacrifícios de adoração através da execução ritualística dos Vedas, da meditação mística e do serviço devocional como se recomenda nas escrituras. Querido Senhor, se Você não tivesse aparecido em Sua eterna forma transcendental, cheia de bem-aventurança e conhecimento – forma esta que pode erradicar todos os tipos de ignorância especulativa sobre Sua posição –, estariam todos agora especulando sobre Você segundo os respectivos modos da natureza material em que se encontram”.
O aparecimento de Kṛṣṇa é a resposta a toda iconografia imaginativa da Suprema Personalidade de Deus. Todos imaginam a forma da Suprema Personalidade de Deus segundo o modo da natureza material em que se encontram. Na Brahma-saṁhitā, afirma-se que o Senhor é a pessoa mais velha. Por tal afirmação, um grupo de religiosos imagina que Deus deve ser muito velho e, portanto, representa o Senhor na forma de um homem muito velho. Contudo, a mesma Brahma-saṁhitā contradiz isso: embora Ele seja o mais velho de todos os seres, Ele tem Sua forma eterna como um jovem adolescente. As palavras exatas usadas a esse respeito no Śrīmad-Bhāgavatam são vijñānam ajñāna-bhidāpamārjanam. Vijñānam quer dizer conhecimento transcendental acerca de Deus, a Pessoa Suprema. Vijñānam é também conhecimento experimentado. O conhecimento transcendental deve ser aceito através do processo descendente de sucessão discipular, da maneira como Brahmā o apresenta na Brahma-saṁhitā. A Brahma-saṁhitā é vijñānam, conforme entendido pela experiência transcendental de Brahmā, que apresenta a forma e os passatempos de Kṛṣṇa na morada transcendental. Esse conhecimento é ajñāna-bhidāpamārjanam, o que quer dizer que ele é capaz de esmagar todas as espécies de especulações. Na ignorância, as pessoas estão imaginando a forma do Senhor; algumas vezes, Ele não tem forma e, outras vezes, Ele tem forma, segundo as diferentes imaginações dessas pessoas. Porém, a descrição de Kṛṣṇa na Brahma-saṁhitā é vijñānam – conhecimento científico, e foi experimentada pelo senhor Brahmā e aceita pelo Senhor Caitanya. Não há dúvidas, portanto. A forma de Śrī Kṛṣṇa, a flauta de Śrī Kṛṣṇa, a cor de Kṛṣṇa – tudo é realidade. Aqui se diz que esse vijñānam está sempre derrotando todas as espécies de conhecimentos especulativos. “Portanto, sem o Seu aparecimento como Kṛṣṇa, como Você é, não seria possível compreender nem ajñānabhidā (a ignorância do conhecimento especulativo) nem vijñānam. Ajñāna-bhidāpamarjānam – por Seu aparecimento, o conhecimento especulativo da ignorância será vencido, estabelecendo-se, então, o verdadeiro conhecimento experimentado de autoridades como o senhor Brahmā. Homens influenciados pelos três modos da natureza material imaginam seu próprio Deus de acordo com os modos da natureza material. Assim, Deus é apresentado de várias maneiras, mas Seu aparecimento estabelecerá qual é a verdadeira forma de Deus”.
O maior erro que os impersonalistas cometem é pensar que, quando a encarnação de Deus vem, Ele aceita a forma da matéria no modo da bondade. De fato, a forma de Kṛṣṇa ou Nārāyaṇa é transcendental a qualquer ideia material. Até mesmo o grande impersonalista Śaṅkarācārya admitiu que nārāyaṇaḥ paro ’vyaktāt: a criação material é causada pelo avyakta, manifestação (impessoal) da matéria ou reserva total não fenomenal da matéria; Kṛṣṇa é transcendental a essa concepção material. Isso é o que o Śrīmad-Bhāgavatam exprime como śuddha-sattva, ou bondade transcendental. Kṛṣṇa não pertence ao modo material da bondade, estando além da posição da bondade material. Ele pertence ao status transcendental eterno de bem-aventurança e conhecimento.
“Querido Senhor, quando aparece em Suas diferentes encarnações, Você toma diferentes nomes e formas segundo diferentes situações. Kṛṣṇa é Seu nome porque Você é todo-atrativo; Você também recebe o nome de Śyāmasundara por causa de Sua beleza transcendental. Śyāma quer dizer enegrecido, mas dizem que Você é mais belo do que milhares de cupidos (kandarpa-koṭi-kamanīya). Embora Você apareça com uma cor que se compara à nuvem negra, por Você ser o Absoluto transcendental, Sua beleza é muitas e muitas vezes mais atraente do que o delicado corpo de Cupido. Às vezes, Você é chamado de Giridhāri porque ergueu a colina chamada Govardhana. Às vezes, Você é chamado Nandanandana ou Vāsudeva ou Devakīnandana, porque aparece como o filho de Mahārāja Nanda, ou de Devakī ou de Vasudeva. Os impersonalistas acham que Seus muitos nomes e formas aplicam-se a um tipo específico de trabalho e qualidade, isso porque eles O aceitam do ponto de vista de um observador material”.
“Nosso querido Senhor, não é por meio da especulação mental que se compreendem Suas atividades, natureza e forma. A pessoa deve ocupar-se no serviço devocional; então, ela pode entender Sua natureza absoluta, Sua forma, Seu nome e Suas qualidades transcendentais. De fato, somente uma pessoa que tenha um pouco de gosto pelo serviço aos Seus pés de lótus pode compreender Sua natureza transcendental, ou Suas formas e qualidades. Outros podem continuar especulando por milhões de anos, mas não lhes será possível entender nem mesmo uma única parte de Sua verdadeira posição”. Em outras palavras, a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, não pode ser compreendido pelos não devotos porque existe uma cortina de Yogamāyā, que encobre as características verdadeiras de Kṛṣṇa. Como confirmado no Bhagavad-gītā, nāhaṁ prakāśaḥ sarvasya: “Eu não Me revelo a toda e qualquer pessoa”. Quando Kṛṣṇa veio, Ele estava realmente presente no campo de batalha de Kurukṣetra e todos O viram. Porém, nem todos puderam compreender que Ele era a Suprema Personalidade de Deus. Mesmo assim, todos os que morreram em Sua presença alcançaram a completa libertação do cativeiro material e foram transferidos para o mundo espiritual.
“Ó Senhor, os impersonalistas e os não devotos não podem compreender que Seu nome é idêntico à Sua forma”. Visto que o Senhor é absoluto, não existe diferença entre Seu nome e Sua verdadeira forma. No mundo material, existe diferença entre forma e nome. A fruta “manga” é diferente do nome “manga”. Não se pode saborear a manga apenas cantando “manga, manga, manga”. Mas o devoto que sabe que não há diferença entre o nome e a forma do Senhor canta Hare Kṛṣṇa, Hare Kṛṣṇa, Kṛṣṇa Kṛṣṇa, Hare Hare/ Hare Rāma, Hare Rāma, Rāma Rāma, Hare Hare e compreende que está sempre em companhia de Kṛṣṇa.
Para as pessoas que não são muito avançadas no conhecimento absoluto do Supremo, o Senhor Kṛṣṇa exibe Seus passatempos transcendentais. Elas podem simplesmente pensar nos passatempos do Senhor e obter benefício total. Já que não há diferença entre o nome e a forma transcendentais do Senhor, não há diferença entre os passatempos transcendentais e a forma do Senhor. Para aqueles que são menos inteligentes, o grande sábio Vyāsadeva escreveu o Mahābhārata. No Mahābhārata, Kṛṣṇa está presente em Suas diferentes atividades. O Mahābhārata é história, e, se simplesmente estudarem, ouvirem e decorarem as atividades transcendentais de Kṛṣṇa, os menos inteligentes poderão também elevar-se ao nível dos devotos puros.
Nunca devemos considerar que os devotos puros, que estão sempre absortos pensando nos transcendentais pés de lótus de Kṛṣṇa e que estão sempre ocupados no serviço devocional em plena consciência de Kṛṣṇa, estejam no mundo material. Śrī Rūpa Gosvāmī explicou que aqueles que estão sempre ocupados em consciência de Kṛṣṇa, com seu corpo, mente e atividades, devem ser considerados libertos mesmo neste corpo. Isso também se confirma no Bhagavad-gītā: aqueles que se ocupam no serviço devocional ao Senhor já transcenderam a posição material.
Kṛṣṇa aparece para dar uma chance tanto aos devotos como aos não devotos de compreenderem a meta última da vida. Os devotos têm a oportunidade direta de O ver e adorar. Aqueles que não estão nessa plataforma têm a oportunidade de tomar conhecimento de Suas atividades e, assim, se elevarem à mesma posição.
“Nosso querido Senhor, ó Controlador Supremo, quando Você aparecer na Terra, todos os demônios, como Kaṁsa e Jarāsandha, serão derrotados, e o mundo será agraciado com toda a boa fortuna. Quando Você caminhar pelo globo, Seus pés de lótus deixarão no chão as marcas das solas de Seus pés, como a bandeira, o tridente e o raio. Assim Você favorecerá tanto a Terra como nossas pessoas, que, dos planetas celestiais, veremos aquelas marcas”.
“Ó querido Senhor”, continuaram os semideuses, “Você é não nascido, motivo pelo qual não vemos outra razão para Seu aparecimento a não ser executar Seus agradáveis passatempos”. Embora se declare no Bhagavad-gītā a razão do aparecimento do Senhor (Ele desce apenas para proteger o devoto e derrotar o não devoto), de fato, Ele desce para encontrar-Se com Seus aprazíveis devotos, e não para derrotar os não devotos. Os não devotos podem ser derrotados simplesmente por um esbarrão da natureza material. “As ações e reações da energia externa da natureza material (criação, manutenção e aniquilação) estão sendo executadas de forma automática. Contudo, pelo simples fato de se abrigarem em Seu santo nome – porque Seu santo nome e Sua personalidade não são diferentes –, os devotos recebem proteção satisfatória”. A proteção dos devotos e a aniquilação dos não devotos não são realmente a missão da Suprema Personalidade de Deus. Quando Ele desce, Ele o faz unicamente para Seu prazer transcendental. Não pode haver qualquer outra razão para Seu aparecimento.
“Nosso querido Senhor, Você aparece agora como o melhor da dinastia Yadu, em razão do que oferecemos nossas respeitosas e humildes reverências a Seus pés de lótus. Antes deste aparecimento, Você também apareceu como a encarnação do peixe, a encarnação do cavalo, a encarnação da tartaruga, a encarnação do javali, a encarnação do cisne, como o rei Rāmacandra, como Paraśurāma e muitas outras encarnações. Você apareceu apenas para proteger os devotos, e Lhe suplicamos que, neste atual aparecimento como a própria Suprema Personalidade de Deus, dê-nos semelhante proteção em todos os três mundos e afaste todos os obstáculos ao cumprimento pacífico de nossas vidas”.
“Querida mãe Devakī, em seu ventre está a Suprema Personalidade de Deus, que aparece com todas as Suas expansões plenárias. Ele é a original Personalidade de Deus, que aparece para o nosso bem-estar. Por isso, você não deve ter medo de seu irmão, o rei de Bhoja. Seu filho, o Senhor Kṛṣṇa, que é a Personalidade de Deus original, aparecerá para a proteção da piedosa dinastia Yadu. O Senhor não virá sozinho, mas acompanhado de Sua porção plenária imediata, Balarāma”.
Devakī estava com muito medo de Seu irmão Kaṁsa, por este já ter matado tantos de seus filhos. Por essa razão, ela sentia muita ansiedade em relação a Kṛṣṇa. Conta-se no Viṣṇu Purāṇa que, para acalmar Devakī, todos os semideuses, acompanhados de suas esposas, sempre iam visitá-la para que ela se animasse e não tivesse medo de que seu filho fosse morto por Kaṁsa. Kṛṣṇa, que estava dentro de seu ventre, deveria aparecer não só para diminuir o fardo do mundo, mas especificamente para proteger os interesses da dinastia Yadu e, com certeza, para proteger pessoalmente Devakī e Vasudeva. Entende-se que Kṛṣṇa fora transferido da mente de Vasudeva para a mente de Devakī e, de lá, para seu útero. Foi dessa maneira que todos os semideuses adoraram Devakī, a mãe de Kṛṣṇa.
Depois de venerarem assim a forma transcendental do Senhor, todos os semideuses, com o senhor Brahmā e o senhor Śiva à frente, partiram para suas moradas celestiais.
Neste ponto, encerram-se os significados Bhaktivedanta do capítulo dois de Kṛṣṇa, intitulado “Orações dos Semideuses ao Senhor Kṛṣṇa Situado no Ventre”.