VERSO 2
tathaiva rājann uru-gārhamedha-
vitāna-vidyoru-vijṛmbhiteṣu
na veda-vādeṣu hi tattva-vādaḥ
prāyeṇa śuddho nu cakāsti sādhuḥ
tathā — portanto; eva — na verdade; rājan — ó rei; uru-gārha-medha — rituais relacionados com a vida familiar; vitāna-vidyā — no conhecimento que se expande; uru — muito grandemente; vijṛmbhiteṣu — entre aqueles interessados; na — não; veda-vādeṣu — que falam a conotação dos Vedas, hi — na verdade; tattva-vādaḥ — a ciência espiritual; prāyeṇa — quase sempre; śuddhaḥ — livre de todas as atividades contaminadas; nu — na verdade; cakāsti — parece; sādhuḥ — uma pessoa avançada em serviço devocional.
Meu querido rei, as conversas sobre a relação entre mestre e servo, rei e súdito e assim por diante, são simples conversas sobre atividades materiais. As pessoas interessadas nas atividades materiais apresentadas nos Vedas estão determinadas a executar sacrifícios materiais e a depositar sua fé em suas atividades materiais. Para semelhantes pessoas, definitivamente, o avanço espiritual continua oculto.
SIGNIFICADO—Neste verso, duas palavras são significativas – veda-vāda e tattva-vāda. De acordo com a Bhagavad-gītā, aqueles que estão simplesmente apegados aos Vedas e que não entendem a finalidade dos Vedas ou do Vedānta-sūtra chamam-se veda-vāda-ratāḥ.
yām imāṁ puṣpitāṁ vācaṁ
pravadanty avipaścitaḥ
veda-vāda-ratāḥ pārtha
nānyad astīti vādinaḥ
kāmātmānaḥ svarga-parā
janma-karma-phala-pradām
kriyā-viśeṣa-bahulāṁ
bhogaiśvarya-gatiṁ prati
“Os homens de pouco conhecimento estão muitíssimo apegados às palavras floridas dos Vedas, que recomendam várias atividades fruitivas àqueles que desejam elevar-se aos planetas celestiais, com o consequente bom nascimento, poder e assim por diante. Por estarem ávidos por satisfazer os sentidos e ter uma vida opulenta, eles dizem que isso é tudo o que importa.” (Bhagavad-gītā 2.42-43)
Em geral, os seguidores veda-vāda dos Vedas são propensos a karma-kāṇḍa, ou realização de sacrifícios de acordo com os preceitos védicos. Através desse processo, são promovidos aos sistemas planetários superiores. Costumam praticar o sistema de Cāturmāsya. Akṣayyaṁ ha vai cāturmāsya-yājinaḥ sukṛtaṁ bhavati: quem pratica cāturmāsya-yajña se torna piedoso. Tornando-se piedoso, ele pode ser promovido aos sistemas planetários superiores (ūrdhvaṁ gacchanti sattva-sthāḥ). A fim de se elevarem a um padrão de vida superior, alguns seguidores dos Vedas apegam-se a karma-kāṇḍa, as atividades fruitivas dos Vedas. Outros argumentam que não é esse o propósito dos Vedas. Tad yathaiveha karma jitaḥ lokaḥ kṣīyate evam evam utra puṇya jitaḥ lokaḥ kṣīyate. Neste mundo, às vezes alcançamos uma alta posição nascendo em família aristocrática, sendo bem instruídos, belos ou muito ricos. Esses são prêmios por atividades piedosas executadas em uma vida passada. No entanto, tudo isso acabará quando o acervo de atividade piedosa se esgotar. Se nos apegarmos às atividades piedosas, poderemos obter essas várias facilidades mundanas na próxima vida e nascer em planetas celestiais. A seu tempo, porém, tudo isso acabará. Kṣīṇe puṇye martya-lokaṁ viśanti (Bhagavad-gītā 9.21): quando o acervo de atividades piedosas se esgota, a pessoa volta a este martya-loka. De acordo com os preceitos védicos, a realização de atividades piedosas não é a verdadeira finalidade dos Vedas. Expõe-se o objetivo dos Vedas na Bhagavad-gītā. Vedaiś ca sarvair aham eva vedyaḥ: o objetivo dos Vedas é compreendermos Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus. Aqueles que são veda-vādīs não alcançaram o verdadeiro avanço em conhecimento, e aqueles que são seguidores de jñāna-kāṇḍa (compreensão do Brahman) também não são perfeitos. Contudo, quando alguém chega à plataforma de upāsanā e concorda em adorar a Suprema Personalidade de Deus, ele se torna perfeito (ārādhanānāṁ sarveṣām viṣṇor ārādhanaṁ param). Por certo que os Vedas mencionam a adoração a diversos semideuses e a realização de sacrifícios, mas essa adoração é inferior, pois os adoradores não sabem que a meta última é Viṣṇu (na te viduḥ svārtha-gatiṁ hi viṣṇum). Quem chega à plataforma de viṣṇor ārādhanam, ou bhakti-yoga, alcançou a perfeição da vida. De outro modo, como especifica a Bhagavad-gītā, a pessoa não é um tattva-vādī, mas, sim, um veda-vādī, alguém que obedece cegamente aos preceitos védicos. O veda-vādī só pode purificar-se da contaminação material ao se tornar um tattva-vādī, isto é, aquele que conhece tattva, a Verdade Absoluta. Também experimenta-se tattva em três aspectos – brahmeti paramātmeti bhagavān iti śabdyate. Mesmo após chegar à plataforma em que compreende tattva, a pessoa deve adorar Bhagavān, Viṣṇu e Suas expansões, ou então ela ainda não será perfeita. Bahūnāṁ janmanām ante jñānavān māṁ prapadyate: após muitos nascimentos, quem está em verdadeiro conhecimento se rende a Kṛṣṇa. A conclusão é que os homens ininteligentes, com um pobre fundo de conhecimento, não podem entender Bhagavān, Brahman ou Paramātmā, mas, após estudar os Vedas e passar a conhecer a Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus, a pessoa eventualmente se estabelece na plataforma de conhecimento perfeito.