VERSO 11
tatrāpi bhāratam eva varṣaṁ karma-kṣetram anyāny aṣṭa varṣāṇi svargiṇāṁ puṇya-śeṣopabhoga-sthānāni bhaumāni svarga-padāni vyapadiśanti.
tatra api — entre todas elas; bhāratam — conhecida como Bhārata-varṣa; eva — decerto; varṣam — a porção de terra; karma-kṣetram — o campo de atividades; anyāni — os outros; aṣṭa varṣāṇi — oito trechos de terra; svargiṇām — das entidades vivas elevadas aos planetas celestiais através de atividades piedosas extraordinárias; puṇya — do saldo das atividades piedosas; śeṣa — do restante; upabhoga-sthānāni — os lugares para o gozo material; bhaumāni svarga-padāni — como os lugares celestiais na Terra; vyapadiśanti — eles designam.
Entre os nove varṣas, a porção de terra conhecida como Bhārata-varṣa é tida como o campo das atividades fruitivas. Os estudiosos eruditos e as pessoas santas declaram que os outros oito varṣas se destinam a pessoas piedosas muitíssimo elevadas, as quais, após retornarem dos planetas celestiais, desfrutam nesses oito varṣas terrestres o restante do saldo de suas atividades piedosas.
SIGNIFICADO—Os lugares celestiais para desfrute são divididos em três grupos: os planetas celestiais siderais, os lugares celestiais na Terra e os lugares celestiais bila, que se encontram nas regiões inferiores. Entre essas três classes de lugares celestiais (bhauma-svarga-padāni), na Terra, os oito varṣas, que não incluem Bhārata-varṣa, caracterizam-se como sendo os lugares celestiais. Na Bhagavad-gītā (9.21), Kṛṣṇa diz que kṣīṇe puṇye martya-lokaṁ viśanti: ao esgotarem os méritos de suas atividades piedosas, as pessoas que vivem nos planetas celestiais regressam a esta Terra. Portanto, elas se elevam aos planetas celestiais e, posteriormente, recaem nos planetas terrestres. Esse processo é conhecido como brahmāṇḍa bhramaṇa, o qual consiste em vagar pelas regiões superiores e inferiores de todos os universos. Aqueles que são inteligentes – em outras palavras, aqueles que não perderam sua inteligência – não se envolvem neste processo de perambular para cima e para baixo. Eles adotam o serviço devocional ao Senhor de modo que possam afinal penetrar a cobertura deste universo e entrar no reino espiritual. Então, situam-se em um dos planetas conhecidos como Vaikuṇṭhaloka, ou, em um plano mais elevado, em Kṛṣṇaloka (Goloka Vṛndāvana). O devoto nunca se deixa envolver no processo em que ele é promovido aos planetas celestiais e, então, desce novamente. Por isso, Śrī Caitanya Mahāprabhu diz:
ei rūpe brahmāṇḍa bhramite kona bhāgyavān jīva
guru-kṛṣṇa-prasāde pāya bhakti-latā-bīja
Entre todas as entidades vivas que perambulam pelo universo, aquela que é muito afortunada entra em contato com o representante da Suprema Personalidade de Deus e obtém, dessa maneira, a oportunidade de prestar serviço devocional.
Aqueles que estão sinceramente buscando o favor de Kṛṣṇa entram em contato com o guru, o autêntico representante de Kṛṣṇa. Os māyāvādīs, que se entregam à especulação mental, e os karmīs, que desejam os resultados de suas ações, não podem tornar-se gurus. O guru tem que ser um representante direto de Kṛṣṇa, distribuindo, sem qualquer mudança, as instruções de Kṛṣṇa. Assim, apenas as pessoas mais afortunadas entram em contato com o guru. Como confirmam os textos védicos, tad-vijñānārthaṁ sa gurum evābhigacchet: para entendermos os assuntos ligados ao mundo espiritual, devemos procurar um guru. O Śrīmad-Bhāgavatam também confirma esse ponto. Tasmād guruṁ prapadyeta jijñāsuḥ śreya uttamam: aquele que está muito interessado em compreender as atividades do mundo espiritual deve buscar um guru, um representante autêntico de Kṛṣṇa. Portanto, a partir de todos os pontos de vista, a palavra guru se refere em especial ao representante genuíno de Kṛṣṇa e a ninguém mais. O Padma Purāṇa afirma que avaiṣṇavo gurur na syāt: quem não é vaiṣṇava, ou quem não é um representante de Kṛṣṇa, não pode tornar-se guru. Não sendo representante de Kṛṣṇa, nem mesmo o brāhmaṇa mais qualificado pode tornar-se guru. É de se esperar que o brāhmaṇa adquira seis classes de qualificações auspiciosas: tornar-se um estudioso muito erudito (paṭhana) e um preceptor muito qualificado (pāṭhana); tornar-se hábil em adorar o Senhor ou os semideuses (yajana) e ensinar os outros a realizarem essa adoração (yājana); qualificar-se como uma pessoa fidedigna e apta a receber doações dos outros (pratigraha) e tornar-se capaz de distribuir riquezas em caridade (dāna). Todavia, caso não seja representante de Kṛṣṇa, nem mesmo um brāhmaṇa que possui essas qualificações pode tornar-se guru (gurur na syāt). Vaiṣṇavaḥ śva-paco guruḥ: em contraste, mesmo que seja um śva-paca, um membro de uma família de comedores de cães, um vaiṣṇava, um representante autêntico de Viṣṇu, a Suprema Personalidade de Deus, pode tornar-se guru. Das três divisões dos planetas celestiais (svarga-loka), bhauma-svarga às vezes é aceito como o trecho de terra em Bhārata-varṣa conhecido como Kashmir. Nessa região, há com certeza muitas facilidades para o gozo dos sentidos materiais, mas essa não é a atividade do transcendentalista puro. Rūpa Gosvāmī descreve com as seguintes palavras a ocupação do transcendentalista puro:
anyābhilāṣitā-śūnyaṁ
jñāna-karmādy-anāvṛtam
ānukūlyena kṛṣṇānu-
śīlanaṁ bhaktir uttamā
“Devemos prestar transcendental serviço amoroso ao Supremo Senhor Kṛṣṇa em uma atitude favorável e sem desejo de obter lucro ou vantagens materiais através de atividades fruitivas ou especulação filosófica. Isso se chama serviço devocional puro.” Aqueles que, com o único intuito de satisfazer Kṛṣṇa, ocupam-se plenamente em prestar-Lhe serviço devocional não estão interessados nas três divisões dos lugares celestiais, a saber, divya-svarga, bhauma-svarga e bila-svarga.