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VERSO 26

tasmād vairānubandhena
nirvaireṇa bhayena vā
snehāt kāmena vā yuñjyāt
kathañcin nekṣate pṛthak

tasmāt — portanto; vaira-anubandhena — pela constante inimizade; nirvaireṇa — pela devoção; bhayena — pelo medo;  — ou; snehāt — da afeição; kāmena — pelos desejos luxuriosos; — ou; yuñjyāt — uma pessoa deve concentrar; kathañcit — de alguma forma; na — não; īkṣate — vê; pṛthak — alguma outra coisa.

Portanto, em estado de inimizade ou de serviço devocional, de medo, de afeição ou de desejo luxurioso – em todas essas atitudes ou em qualquer uma dessas circunstâncias –, se, de alguma forma, a alma condicionada concentra sua mente no Senhor, o resultado é o mesmo, pois o Senhor, devido à Sua posição bem-aventurada, jamais é afetado por inimizade ou amizade.

SIGNIFICADO—A partir deste verso, ninguém deve concluir que, porque Kṛṣṇa não é afetado por orações favoráveis ou blasfêmias desfavoráveis, deve-se agora blasfemar o Senhor Supremo. Não é esse o princípio regulador. Bhakti-yoga significa ānukūlyena kṛṣṇānuśīlanam: é com uma atitude muito favorável que a pessoa deve servir a Kṛṣṇa. Esse é o verdadeiro preceito. Aqui, afirma-se que, embora um inimigo dirija a Kṛṣṇa pensamentos hostis, o Senhor não é afetado por esse serviço antidevocional. Assim, Ele oferece Suas bênçãos inclusive a Śiśupāla e às almas condicionadas que também nutrem por Ele inimizade. Isso não significa, entretanto, que alguém deva tornar-se inimigo do Senhor; deve-se dar ênfase à execução amorosa de serviço devocional em vez de blasfemar deliberadamente o Senhor. Declara-se:

nindāṁ bhagavataḥ śṛṇvaṁs
tat-parasya janasya vā
tato nāpaiti yaḥ so ’pi
yāty adhaḥ sukṛtāc cyutaḥ

Se alguém ouve uma blasfêmia contra a Suprema Personalidade de Deus ou Seus devotos, deve imediatamente tomar uma atitude cabível ou ir-se embora. Caso contrário, será posto perpetuamente em uma vida infernal. Existem muitos desses preceitos. Portanto, como princípio regulador, ninguém deve ser desfavorável ao Senhor, senão que deve sempre se mostrar favorável a Ele.

Śiśupāla obter unidade com o Senhor Supremo foi algo diferente porque Jaya e Vijaya, desde o começo de sua existência material, foram designados a tratar o Senhor Supremo como inimigo por três vidas e, depois, voltariam ao lar, voltariam ao Supremo. No íntimo, Jaya e Vijaya sabiam que Kṛṣṇa é a Suprema Personalidade de Deus, mas, propositalmente, tornaram-se inimigos dEle para poderem libertar-se da vida material. Desde o começo de sua vida, eles pensavam no Senhor Kṛṣṇa como inimigo e, muito embora blasfemassem o Senhor Kṛṣṇa, cantavam constantemente o santo nome de Kṛṣṇa ao darem vazão a seus pensamentos hostis. Assim, eles se purificaram porque cantaram o santo nome de Kṛṣṇa. Deve-se compreender que mesmo um blasfemo pode livrar-se das atividades pecaminosas cantando o santo nome do Senhor. Certamente, portanto, a liberdade está garantida para um devoto que sempre vê com bons olhos a prestação de serviço ao Senhor. Isso ficará claro no verso seguinte. Ao absorver toda a sua atenção em Kṛṣṇa, todos podem purificar-se e, dessa maneira, livrarem-se da vida material.

Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura explica muito bem a palavra bhayena, que quer dizer “com medo”. Quando as gopīs foram ter com Kṛṣṇa na calada da noite, elas certamente temiam ser castigadas por seus parentes – seus esposos, irmãos e pais –, mas, ainda assim, não se importando com seus parentes, elas foram ter com Kṛṣṇa. Por certo que havia medo, mas esse medo não pôde impedir seu serviço devocional a Kṛṣṇa.

Ninguém deve pensar erroneamente que o Senhor Kṛṣṇa deva ser adorado em uma atitude inamistosa como a de Śiśupāla. O preceito é ānukūlyasya grahaṇaṁ prātikūlyasya varjanam: na prestação do serviço devocional, devem-se abandonar as atividades desfavoráveis e buscar apenas condições favoráveis. De um modo geral, quem blasfema a Suprema Personalidade de Deus é punido. Como o Senhor diz na Bhagavad-gītā (16.19):

tān ahaṁ dviṣataḥ krūrān
saṁsāreṣu narādhamān
kṣipāmy ajasram aśubhān
āsurīṣv eva yoniṣu

Existem muitos desses preceitos. Ninguém deve tentar adorar Kṛṣṇa desfavoravelmente; caso contrário, a pessoa será punida, pelo menos por uma vida, para se purificar. Assim como ninguém deve tentar ser morto abraçando um inimigo, um tigre ou uma serpente, também não se deve blasfemar a Suprema Personalidade de Deus e se tornar Seu inimigo e, com isso, ser posto em uma vida infernal.

O propósito deste verso é enfatizar que, se mesmo o inimigo do Senhor pode ser liberto, o que dizer, então, de Seu amigo? Śrīla Madhvācārya também diz de muitas maneiras que ninguém deve blasfemar o Senhor Viṣṇu através de sua mente, palavras ou ações, pois um blasfemador terá uma vida infernal junto com seus antepassados.

karmaṇā manasā vācā
yo dviṣyād viṣṇum avyayam
majjanti pitaras tasya
narake śāśvatīḥ samāḥ

Na Bhagavad-gītā (16.19-20), o Senhor diz:

tān ahaṁ dviṣataḥ krūrān
saṁsāreṣu narādhamān
kṣipāmy ajasram aśubhān
āsurīṣv eva yoniṣu

āsurīṁ yonim āpannā
mūḍhā janmani janmani
mām aprāpyaiva kaunteya
tato yānty adhamāṁ gatim

“Aqueles que, invejosos e malévolos, são os mais baixos entre os homens, Eu os atiro no oceano da existência material, em várias espécies de vida demoníaca. Submetendo-se a repetidos nascimentos entre as espécies de vida demoníaca, ó filho de Kuntī, tais pessoas jamais conseguem aproximar-se de Mim. Aos poucos, elas se afundam na mais abominável condição de existência.” Aquele que blasfema o Senhor é posto em família de asuras, na qual há toda chance de se esquecer do serviço ao Senhor. O Senhor Kṛṣṇa declara ainda na Bhagavad-gītā (9.11-12):

avajānanti māṁ mūḍhā
mānuṣīṁ tanum āśritam
paraṁ bhāvam ajānanto
mama bhūta-maheśvaram

Os mūḍhas, patifes, blasfemam o Senhor Supremo porque Ele aparece tal qual um ser humano. Eles não conhecem a ilimitada opulência da Suprema Personalidade de Deus.

moghāśā mogha-karmāṇo
mogha-jñānā vicetasaḥ
rākṣasīm āsurīṁ caiva
prakṛtiṁ mohinīṁ śritāḥ

Tudo feito por aqueles que tomaram a atitude de inimigos se malogrará (moghāśāḥ). Se esses inimigos tentarem libertar-se ou imergir na existência do Brahman, se, como karmīs, desejarem elevar-se aos sistemas planetários superiores, ou mesmo se desejarem retornar ao lar, retornar ao Supremo, com certeza fracassarão.

Quanto a Hiraṇyakaśipu, embora fosse declarado inimigo da Suprema Personalidade de Deus, ele estava sempre pensando em seu filho, que era um grande devoto. Portanto, pela graça de seu filho Prahlāda Mahārāja, Hiraṇyakaśipu também foi liberto pela Suprema Personalidade de Deus.

hiraṇyakaśipuś cāpi
bhagavan-nindayā tamaḥ
vivakṣur atyagāt sūnoḥ
prahlādasyānubhāvataḥ

A conclusão é que ninguém deve abandonar o serviço devocional puro. Para seu próprio benefício, a pessoa não deve imitar Hiraṇyakaśipu ou Śiśupāla, pois esse modo de proceder não lhe trará sucesso.

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