VERSO 11
rakṣo-’dhamena vṛkavad vipine ’samakṣaṁ
vaideha-rāja-duhitary apayāpitāyām
bhrātrā vane kṛpaṇavat priyayā viyuktaḥ
strī-saṅgināṁ gatim iti prathayaṁś cacāra
rakṣaḥ-adhamena — pelo mais atroz entre os Rākṣasas, Rāvaṇa; vṛka-vat — como um tigre; vipine — na floresta; asamakṣam — desprotegida; vaideha-rāja-duhitari — por essa condição de mãe Sītā, a filha do rei de Videha; apayāpitāyām — tendo sido raptada; bhrātrā — com Seu irmão; vane — na floresta; kṛpaṇa-vat — como se fosse uma pessoa muito aflita; priyayā — de Sua querida esposa; viyuktaḥ — separado; strī-saṅginām — das pessoas atraídas ou interessadas por mulheres; gatim — destino; iti — assim; prathayan — dando o exemplo; cacāra — vagou.
Quando Rāmacandra entrou na floresta e Lakṣmaṇa também se ausentou, o pior dos Rākṣasas, Rāvaṇa, raptou Sītādevī, a filha do rei de Videha, assim como um tigre captura ovelhas desprotegidas aproveitando-se da ausência do pastor. Em seguida, como se estivesse muito aflito devido à separação de Sua esposa, o Senhor Rāmacandra caminhou pela floresta com Seu irmão Lakṣmaṇa. Com isto, Ele mostrou com Seu exemplo pessoal a condição de uma pessoa apegada a mulheres.
SIGNIFICADO—Neste verso, as palavras strī-saṅgināṁ gatim iti indicam que o próprio Senhor retratou as condições de uma pessoa apegada a mulheres. De acordo com as instruções morais, gṛhe nārīṁ vivarjayet: ao sair de viagem, a pessoa não deve levar sua esposa. Outrora, os homens costumavam viajar sem veículos, mas, mesmo assim, na medida do possível, quando alguém deixa o lar, não deve levar sua esposa consigo, especialmente se estiver em condições semelhantes àquelas em que o Senhor Rāmacandra Se encontrava quando foi banido por ordem de Seu pai. Seja na floresta, seja no lar, se alguém é apegado a mulheres, esse apego sempre traz problemas, como a Suprema Personalidade de Deus mostrou através de Seu exemplo pessoal.
Evidentemente, este é o aspecto material de strī-saṅgī, mas a situação do Senhor Rāmacandra é espiritual, pois Ele não pertence ao mundo material. Nārāyaṇaḥ paro ’vyaktāt: Nārāyaṇa está além da criação material. Porque é o criador do mundo material, Ele não está sujeito às condições do mundo material. A separação entre o Senhor Rāmacandra e Sītā é compreendida espiritualmente como vipralambha, uma atividade da potência hlādinī da Suprema Personalidade de Deus que está incluída em śṛṅgāra-rasa, a doçura do amor conjugal no mundo espiritual. No mundo espiritual, a Suprema Personalidade de Deus experimenta todos os relacionamentos amorosos, manifestando os sintomas chamados sāttvika, sañcārī, vilāpa, mūrcchā e unmāda. Logo, quando o Senhor Rāmacandra viu-Se separado de Sītā, todos esses sintomas espirituais manifestaram-se. O Senhor não é impessoal nem impotente. Ao contrário, Ele é sac-cid-ānanda-vigraha, a eterna forma de conhecimento e bem-aventurança. Portanto, Ele apresenta todos os sintomas de bem-aventurança transcendental. Sentir saudades da pessoa amada também é um item da bem-aventurança espiritual. Como explica Śrīla Svarūpa Dāmodara Gosvāmī, rādhā-kṛṣṇa-praṇaya-vikṛtir hlādinī-śaktiḥ: os relacionamentos amorosos entre Rādhā e Kṛṣṇa são manifestos como potência de prazer do Senhor. O Senhor é a fonte que origina todo o prazer, o reservatório de todo o prazer. O Senhor Rāmacandra, portanto, manifestou a verdade espiritual e material. Materialmente, aqueles que são apegados a mulheres sofrem, mas, espiritualmente, quando há sentimentos de saudade entre o Senhor e Sua potência de prazer, a bem-aventurança espiritual do Senhor aumenta. Essa explicação é reforçada na Bhagavad-gītā (9.11):
avajānanti māṁ mūḍhā
mānuṣīṁ tanum āśritam
paraṁ bhāvam ajānanto
mama bhūta-maheśvaram
Alguém que não conhece a potência espiritual da Suprema Personalidade de Deus pensa que o Senhor é um ser humano comum. Porém, a mente, a inteligência e os sentidos do Senhor jamais podem ser afetados por condições materiais. Esse fato continua sendo explicado no Skanda Purāṇa, conforme citação de Madhvācārya:
nitya-pūrṇa-sukha-jñāna-
svarūpo ’sau yato vibhuḥ
ato ’sya rāma ity ākhyā
tasya duḥkhaṁ kuto ’ṇv api
tathāpi loka-śikṣārtham
aduḥkho duḥkha-vartivat
antarhitāṁ loka-dṛṣṭyā
sītām āsīt smarann iva
jñāpanārthaṁ punar nitya-
sambandhaḥ svātmanaḥ śriyāḥ
ayodhyāyā vinirgacchan
sarva-lokasya ceśvaraḥ
pratyakṣaṁ tu śriyā sārdhaṁ
jagāmānādir avyayaḥ
nakṣatra-māsa-gaṇitaṁ
trayodaśa-sahasrakam
brahmaloka-samaṁ cakre
samastaṁ kṣiti-maṇḍalam
rāmo rāmo rāma iti
sarveṣām abhavat tadā
sarvoramamayo loko
yadā rāmas tv apālayat
Realmente, era impossível Rāvaṇa levar Sītā. A forma de Sītā levada por Rāvaṇa era uma representação ilusória de mãe Sītā – māyā-sītā. Quando Sītā foi submetida ao teste do fogo, essa māyā-sītā foi incinerada, e a verdadeira Sītā saiu intacta do fogo.
Outra compreensão a ser extraída a partir deste exemplo é que toda mulher, por mais poderosa que ela acaso seja no mundo material, deve receber proteção, pois, logo que ela fica desprotegida, é explorada por Rākṣasas como Rāvaṇa. Aqui, as palavras vaideha-rāja-duhitari indicam que, antes de casar-se com o Senhor Rāmacandra, mãe Sītā era protegida pelo seu pai, Vaideha-rāja. Ao casar-se, ela ficou sob a proteção de seu esposo. Portanto, conclui-se que a mulher sempre deve ser protegida. De acordo com as regras védicas, não há fundamento em uma mulher querer ser independente (asamakṣam), pois a mulher não pode proteger-se por conta própria.