VERSO 36
mora sparśe nā karile ghṛṇā, veda-bhaya
mora darśana tomā vede niṣedhaya
mora — de mim; sparśe — pelo toque; nā — não; karile — fizeste; ghṛṇā — desdém; veda-bhaya — temeroso dos preceitos dos Vedas; mora — de mim; darśana — vendo; tomā — Tu; vede — os preceitos védicos; niṣedhaya — proíbem.
“Tu não temes os preceitos védicos que afirmam que não deves associar-Te com śūdras. Não foste desdenhoso de meu toque, embora os Vedas Te proíbam de Te associares com os śūdras.”
SIGNIFICADO—Na Bhagavad-gītā (9.32), o Senhor diz:
māṁ hi pārtha vyapāśritya
ye ’pi syuḥ pāpa-yonayaḥ
striyo vaiśyās tathā śūdrās
te ’pi yānti parāṁ gatim
“Ó filho de Pṛthā, aqueles que se refugiam em Mim, mesmo que sejam de nascimento inferior – mulheres, vaiśyas [comerciantes], bem como śūdras [trabalhadores] –, podem aproximar-se do destino supremo.”
A palavra pāpa-yonayaḥ significa “nascidos de mulheres de casta inferior”. Os vaiśyas são comerciantes, e os śūdras, ou operários, são servos. Segundo as classificações védicas, eles pertencem a uma ordem social inferior. Vida inferior significa vida sem consciência de Kṛṣṇa. Posições altas e baixas na sociedade eram determinadas considerando-se a consciência de Kṛṣṇa de cada pessoa. Considera-se que um brāhmaṇa está na mais alta plataforma porque ele conhece o Brahman, a Verdade Absoluta. A segunda casta, a dos kṣatriyas, também conhece o Brahman, mas não tão bem quanto os brāhmaṇas. Os vaiśyas e śūdras não compreendem claramente a consciência de Deus, porém, se adotam a consciência de Kṛṣṇa pela misericórdia de Kṛṣṇa e do mestre espiritual, não permanecem nas castas inferiores (pāpa-yonayaḥ). Afirma-se claramente: te ’pi yānti parāṁ gatim.
A menos que alguém tenha alcançado o padrão máximo de vida, não poderá voltar ao lar, voltar ao Supremo. Pode ser que alguém seja um śūdra, um vaiśya ou uma mulher, mas, ao situar-se no serviço ao Senhor em consciência de Kṛṣṇa, não se deve considerá-lo strī, śūdra, vaiśya ou alguém inferior a um śūdra. Embora uma pessoa talvez tenha nascido em família inferior, se ela está ocupada no serviço ao Senhor, ela jamais deve ser considerada como pertencente a uma família baixa. O Padma Purāṇa proíbe: vīkṣate jāti-sāmānyāt sa yāti narakaṁ-dhruvam. Uma pessoa que considera um devoto do Senhor em termos de nascimento procede rapidamente para o inferno. Embora supostamente Śrī Rāmānanda Rāya tenha nascido em família de śūdras, não se deve considerá-lo um śūdra, pois ele era um devoto grandioso e avançado. Deveras, ele estava na plataforma transcendental. Portanto, Śrī Caitanya Mahāprabhu o abraçou. Por humildade espiritual, Śrī Rāmānanda Rāya apresentou-se como um śūdra (rāja-sevī viṣayī śūdrādhama). Mesmo que alguém esteja ocupado no serviço governamental ou em qualquer outra atividade lucrativa – em suma, em vida materialista –, tudo o que ele precisa fazer é adotar a consciência de Kṛṣṇa. A consciência de Kṛṣṇa é um processo muito simples. O único requisito é cantar os santos nomes do Senhor e seguir estritamente os princípios que proíbem atividades pecaminosas. Dessa maneira, a pessoa já não pode ser considerada intocável, vaiśya ou śūdra. Quem é avançado em vida espiritual não deve associar-se com não-devotos – a saber, homens ocupados a serviço do governo ou em atividades materialistas em troca de gozo dos sentidos ou a serviço dos outros. Tais homens são considerados viṣayīs, materialistas. O Śrī Caitanya-candrodaya-nāṭaka (8.23) diz:
niṣkiñcanasya bhagavad-bhajanonmukhasya
pāraṁ paraṁ jigamiṣor bhava-sāgarasya
sandarśanaṁ viṣayiṇām atha yoṣitāṁ ca
hā hanta hanta viṣa-bhakṣaṇato ’py asādhu
“Uma pessoa muito seriamente ocupada em cultivar o serviço devocional com vistas a atravessar o oceano de ignorância e que tenha abandonado por completo todas as atividades materiais nunca deve ver um śūdra, um vaiśya ou uma mulher.”