Capítulo 67
A Libertação do Gorila Dvivida
Enquanto Śukadeva Gosvāmī continuava a falar acerca dos passatempos e das características transcendentais do Senhor Kṛṣṇa, o rei Parīkṣit, ao ouvi-lo, ficou mais entusiasmado e desejou ouvir mais e mais. Em seguida, Śukadeva Gosvāmī narrou a história de Dvivida, o gorila que foi morto pelo Senhor Balarāma.
Esse gorila era um grande amigo de Bhaumāsura, ou Narakāsura, que fora morto por Kṛṣṇa devido ao rapto que ele realizara das dezesseis mil princesas em todas as partes do mundo. Dvivida era o ministro do rei Sugrīva. Seu irmão, Mainda, também era um rei gorila muito poderoso. Quando o gorila Dvivida ouviu a história de que seu amigo Bhaumāsura havia sido morto pelo Senhor Kṛṣṇa, ele planejou causar danos em todo o país para vingar a morte de Bhaumāsura. Sua primeira investida seria atear fogo nas vilas, cidades, indústrias e minas, como também nos quarteirões residenciais dos mercadores, que se ocupavam em criar e proteger as vacas. Às vezes, ele desarraigava uma enorme montanha e a despedaçava completamente. Desse modo, ele provocou intensas desordens no país todo, especialmente na província de Kathwar. A cidade de Dvārakā situava-se nessa província de Kathwar, e, porque o Senhor Kṛṣṇa morava nessa cidade, Dvivida fez especificamente dela o seu principal alvo de perturbação.
Dvivida era tão poderoso quanto dez mil elefantes. De vez em quando, ele ia à praia e, com suas poderosas mãos, criava tanta agitação no mar que inundava as cidades e vilas vizinhas. Frequentemente, ele ia aos eremitérios de grandes pessoas santas e sábios, causando uma grande comoção ao esmagar seus belos jardins e pomares. Não apenas ele criava perturbações desse modo, mas, às vezes, jogava urina e fezes em suas arenas sagradas de sacrifício, poluindo a atmosfera inteira. Ele também raptava homens e mulheres, levando-os de suas residências às cavernas das montanhas. Depois de colocá-los dentro das cavernas, ele bloqueava as entradas com grandes blocos grossos de pedra, assim como o inseto bhṛṅgī, que prende e leva muitas moscas e outros insetos e os põe dentro dos buracos das árvores onde vive. Dessa forma, Dvivida regularmente desafiava a lei e a ordem de seu país. Não apenas isso, mas, às vezes, ele profanava os membros femininos de muitas famílias aristocráticas estuprando-as violentamente.
Enquanto causava tais grandes desordens por toda parte do país, ele, certa vez, ouviu sons musicais muito melodiosos provenientes da montanha Raivataka e, assim, decidiu entrar naquela região montanhosa. Lá, ele viu o Senhor Balarāma em meio a muitas belas mocinhas, desfrutando a companhia delas enquanto cantavam e dançavam. Ele ficou cativado pela beleza do corpo do Senhor Balarāma, cujas características eram todas muito formosas, decorado com uma guirlanda de flores de lótus. De igual modo, todas as mocinhas presentes, vestidas e enguirlandadas com flores, exibiam muita beleza. O Senhor Balarāma parecia completamente inebriado por sorver a bebida vāruṇī, e Seus olhos pareciam estar girando em um estado de embriaguez. O Senhor Balarāma parecia exatamente com o rei dos elefantes no meio de muitas fêmeas.
Esse gorila de nome Dvivida podia escalar árvores e saltar de um galho a outro. Às vezes, ele sacudia os galhos e provocava um tipo particular de som – kilakilā –, chegando a desviar a atenção do Senhor Balarāma daquela atmosfera agradável. Às vezes, Dvivida chegava diante das moças e exibia diferentes caretas. Por natureza, as mocinhas são hábeis em desfrutar tudo com risos e gracejos e, quando o gorila vinha até elas, as mesmas não o levavam a sério, mas simplesmente riam dele. Porém, o gorila era tão rude que, até mesmo na presença de Balarāma, ele começou a mostrar as partes íntimas do seu corpo às mulheres e, algumas vezes, ele avançava para mostrar seus dentes enquanto movia as sobrancelhas. Ele desrespeitou as mulheres, mesmo na presença de Balarāma. O nome do Senhor Balarāma não só sugere que Ele seja muito poderoso, mas também que Ele tem prazer em exibir uma força extraordinária. Portanto, Ele pegou uma pedra e a atirou em Dvivida. O gorila, entretanto, evitou astuciosamente ser golpeado pela pedra. Para insultar Balarāma, o gorila levou a panela de barro na qual o vāruṇī era mantido. Dvivida, estando assim inebriado com sua limitada força, começou a rasgar todas as valiosas roupas usadas por Balarāma e pelas mocinhas que O acompanhavam. Ele era tão presunçoso, que pensou que Balarāma não pudesse fazer nada para castigá-lo e continuou a ofender Balarāmajī e Suas companheiras.
Ao ver as perturbações criadas pelo gorila e ouvir que ele já tinha executado muitas atividades danosas por toda parte do país, o Senhor Balarāma ficou muito irado e decidiu ceifar-lhe a vida. Imediatamente, Ele empunhou Sua maça. O gorila pôde entender que Balarāma agora o atacaria. Para enfrentar Balarāma, ele arrancou de imediato uma enorme árvore de carvalho e, com grande força, aproximou-se e golpeou a cabeça do Senhor Balarāma. Porém, o Senhor Balarāma tomou sem demora a grande árvore e permaneceu imperturbado, exatamente como uma grande montanha. Para retaliar, Ele pegou Sua maça, chamada Sunanda, e golpeou o gorila com ela, ferindo gravemente sua cabeça. Uma correnteza de sangue fluía da cabeça do gorila com grande intensidade, mas o fluxo de sangue só aumentou a beleza dele, como um fluxo de manganês líquido jorrando de uma grande montanha. Os golpes da maça de Balarāma não o perturbaram nem mesmo ligeiramente. Ao contrário, ele imediatamente arrancou outra grande árvore de carvalho e, depois de cortar todas as folhas, golpeou mais uma vez a cabeça de Balarāma com ela. No entanto, Balarāma, com a ajuda de Sua maça, despedaçou a árvore. Como o gorila estava muito enfurecido, ele apanhou outra árvore nas mãos e golpeou o corpo do Senhor Balarāma. Novamente, o Senhor Balarāma rasgou a árvore em pedaços e a luta continuou. Cada vez que o gorila tirava uma árvore grande para golpear Balarāma, o Senhor Balarāma triturava a árvore em pedaços com os golpes de Sua maça, e o gorila Dvivida pegava outra árvore de outra direção e, novamente, atacava Balarāma da mesma forma. Como resultado dessa luta contínua, a floresta ficou sem árvores.
Quando não havia mais árvores disponíveis, Dvivida buscou auxílio das colinas e lançou enormes blocos de pedra, como uma tempestade, no corpo de Balarāma. O Senhor Balarāma, em uma forte disposição esportiva, começou a esmagar esses gigantescos pedaços de pedra, reduzindo-os a meros seixos. O gorila, ficando desprovido de todas as árvores e blocos de pedra, agora se postou em frente de Balarāma e agitou seus fortes punhos. Então, com grande força, ele começou a bater no peito do Senhor Balarāma com seus punhos. Dessa vez, o Senhor Balarāma ficou iradíssimo. Como o gorila estava golpeando-O com suas mãos, o Senhor Balarāma não o golpearia de volta com Suas armas, ou seja, a maça ou o arado. Usando apenas Seus punhos, Ele golpeou a clavícula do gorila. Esse ataque provou ser fatal para Dvivida, que imediatamente vomitou sangue e caiu inconsciente no solo. Quando o gorila caiu, todas as colinas e florestas pareceram tremer.
Depois desse incidente horrendo, todos os siddhas, grandes sábios e pessoas santas do sistema planetário superior derramaram flores na pessoa do Senhor Balarāma e vibraram sons em glorificação à Sua supremacia. Todos eles cantaram: “Todas as glórias ao Senhor Balarāma! Ofereçamos nossas respeitosas reverências aos Seus pés de lótus. Matando esse grande demônio, Dvivida, Você iniciou uma era auspiciosa para o mundo”. Todos esses sons jubilosos de vitória foram ouvidos no espaço exterior. Depois de matar o grande demônio Dvivida e ser reverenciado por meio de chuvas de flores e sons gloriosos de vitória, Balarāma voltou à Sua capital, Dvārakā.
Neste ponto, encerram-se os significados Bhaktivedanta do capítulo sessenta e sete de Kṛṣṇa, intitulado “A Libertação do Gorila Dvivida”.