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VERSO 43

jyotir yathaivodaka-pārthiveṣv adaḥ
samīra-vegānugataṁ vibhāvyate
evaṁ sva-māyā-raciteṣv asau pumān
guṇeṣu rāgānugato vimuhyati

jyotiḥ — os luzeiros do céu, tais como o Sol, a Lua e as estrelas; yathā — como; eva — na verdade; udaka — na água; pārthiveṣu — ou em outros líquidos, como o óleo; adaḥ — diretamente; samīra-vega­anugatam — sendo forçados pelos movimentos do vento; vibhāvyate — aparecem em diferentes formas; evam — dessa maneira; sva-māyā-raciteṣu — na situação criada pelas próprias invenções mentais de alguém; asau — a entidade viva; pumān — pessoa; guṇeṣu — no mundo mate­rial, manifestada pelos modos da natureza; rāga-anugataḥ — de acordo com o seu apego; vimuhyati — confunde-se com a identificação.

Ao refletirem-se em líquidos, tais como óleo ou água, os luzeiros do céu, tais como a Lua, o Sol e as estrelas, parecem ter diferentes formas – às vezes redondas, às vezes longas, e assim por diante – devido aos movimentos do vento. De maneira semelhante, ao absorver-se em pensamentos materiais, a entidade viva, a alma, devido à ignorância, aceita várias manifestações como sua própria identida­de. Em outras palavras, é devido à agitação produzida pelos modos da natureza material que alguém se deixa confundir pelas invenções mentais.

SIGNIFICADO—Este verso apresenta um ótimo exemplo para se compreenderem as diferentes posições que a alma espiritual eterna assume no mundo material e mostra como a alma aceita diferentes corpos (dehāntara-prāptiḥ). A Lua é estacionária e única, mas, ao refletir-se na água ou no óleo, ela parece tomar diferentes formas devido aos movimentos do vento. De modo semelhante, a alma é uma serva eterna de Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, mas, quando é posta nos modos da natureza material, ela assume diferentes corpos, ora como semi­deus, ora como homem, cachorro, árvore e assim por diante. Pela influência de māyā, a potência ilusória da Suprema Personalidade de Deus, a entidade viva pensa que é essa pessoa, aquela pessoa, americano, indiano, gato, cachorro, árvore ou qualquer outra coisa. Isso se chama māyā. Quando alguém está livre dessa perplexidade e entende que a alma não pertence a nenhuma das formas deste mundo material, situa-se na plataforma espiritual (brahma-bhūta).

Essa compreensão às vezes é explicada como nirākāra, ou ausência de forma. Essa amorfia, entretanto, não significa que a alma não tenha forma. A alma tem forma, mas a forma externa que adquiriu devido à agitação e contaminação material é falsa. Igualmente, Deus também é descrito como nirākāra, o que significa que Deus não tem forma material, senão que é sac-cid-ānanda-vigraha. A entidade viva é parte integrante da sac-cid-ānanda-vigraha suprema, mas suas formas materiais são temporárias, ou ilusórias. Tanto a entidade viva quanto o Senhor Supremo têm formas espirituais originais (sac-cid­-ānanda-vigraha), mas o Senhor, o Supremo, não muda de forma. O Senhor aparece como Ele é, ao passo que a entidade viva aparece porque a natureza material a obriga a aceitar diferentes formas. Ao receber essas diferentes formas, a entidade viva identifica-se com elas, e não com sua forma espiritual original. Logo que retorna à sua forma e compreensão espirituais originais, a entidade viva ime­diatamente rende-se à forma suprema, a Personalidade de Deus. Isso é explicado na Bhagavad-gītā (7.19): bahūnāṁ janmanām ante jñānavān māṁ prapadyate. Quando a entidade viva, depois de muitos e muitos nascimentos em diferentes formas, retorna à sua forma origi­nal, a consciência de Kṛṣṇa, ela se rende de imediato aos pés de lótus da forma suprema, Kṛṣṇa. Isso é a liberação. Como o Senhor diz na Bhagavad-gītā (18.54):

brahma-bhūtaḥ prasannātmā
na śocati na kāṅkṣati
samaḥ sarveṣu bhūteṣu
mad-bhaktiṁ labhate parām

“Aquele que está situado nessa posição transcendental compreende de imediato o Brahman Supremo e torna-se completamente feliz. Ele nunca se lamenta nem deseja ter algo, e é equânime para com todas as entidades vivas. Nesse estado, ele passa a Me prestar serviço devocional puro.” Render­-se à forma suprema é resultado de bhakti. Essa bhakti, que consiste em alguém compreender sua própria posição, é a liberação completa. Enquanto alguém compreende apenas o aspecto impessoal da Verda­de Absoluta, não está em conhecimento puro, senão que ainda deve se empenhar para obter o conhecimento puro. Kleśo ’dhikataras teṣām avyaktāsakta-cetasām (Bhagavad-gītā 12.5). Embora alguém possa ser espiritualmente avançado, se estiver apegado ao aspecto impessoal da Verdade Absoluta, ainda terá de trabalhar muito arduamente, como indicam as palavras kleśo ’dhikataraḥ, que significam “sofrimento intenso”. O devoto, entretanto, facilmente alcança sua posição original, sua forma espiri­tual, e entende a Suprema Personalidade de Deus em Sua forma original.

O próprio Kṛṣṇa explica as formas das entidades vivas no segundo capítulo da Bhagavad-gītā, onde Ele claramente diz a Arjuna que Ele, Arjuna e todas as outras entidades vivas, que anteriormente estavam em suas formas originais, são identidades individuais separadas. Eles foram indivíduos no passado, agora estão gozando de individua­lidade e, no futuro, continuarão a manter suas formas individuais. A única diferença é que a entidade viva condicionada aparece em várias formas materiais, ao passo que Kṛṣṇa aparece em Sua forma espiritual original. Infelizmente, aqueles que não são avançados em conhecimento espiritual pensam que Kṛṣṇa é como eles e que Sua forma é como suas formas materiais. Avajānanti māṁ mūḍhā mānuṣīṁ tanum āśritam. (Bhagavad-gītā 9.11) Kṛṣṇa jamais Se envaidece por causa de conhecimento material e, portanto, chama-Se acyuta, mas as enti­dades vivas caem e são agitadas pela natureza material. Essa é a dife­rença entre o Senhor Supremo e as entidades vivas.

Com relação a isso, deve-se observar que Vasudeva, que estava situado em uma posição transcendental, aconselhou Kaṁsa a não con­tinuar cometendo atividades pecaminosas. Kaṁsa, um representante dos demônios, estava sempre disposto a matar Kṛṣṇa, ou Deus, e Vasudeva representa uma pessoa transcendentalmente situada de quem Kṛṣṇa nasce (Vāsudeva é o filho de Vasudeva). Vasudeva queria que seu cunhado se eximisse de praticar o ato pecaminoso que con­sistia em matar sua irmã, uma vez que o resultado de ele ser agitado pela natureza material seria que Kaṁsa teria de aceitar um corpo no qual sofreria repetidas vezes. Em outra passagem do Śrīmad­-Bhāgavatam (5.5.4), Ṛṣabhadeva também diz:

na sādhu manye yata ātmano ’yam
asann api kleśada āsa dehaḥ

Enquanto estiver enredada nas atividades fruitivas em troca de apa­rente felicidade e infelicidade, a entidade viva receberá uma deter­minada espécie de corpo no qual se submeterá às três classes de sofrimento decorrentes da natureza material (tri-tāpa-yantraṇā). Toda pessoa inteligente, portanto, deve livrar-se da influência dos três modos da natureza material e reviver seu corpo espiritual original, ocupando-se no serviço à Pessoa Suprema, Kṛṣṇa. Enquanto alguém estiver materialmente apegado, terá de aceitar o processo de nascimento, morte, velhice e doença. Portanto, aconselha-se que, em vez de enredarem-se nas atividades fruitivas aparentemente boas ou más, as pessoas inteligentes devem ocupar sua vida em avançar em cons­ciência de Kṛṣṇa para que, em vez de aceitarem outro corpo mate­rial (tyaktvā dehaṁ punar janma naiti), retornem ao lar, retornem ao Supremo.

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