No edit permissions for Português

VERSO 13

jano vai loka etasminn
avidyā-kāma-karmabhiḥ
uccāvacāsu gatiṣu
na veda svāṁ gatiṁ bhraman

janaḥ — pessoas; vai — decerto; loke — no mundo; etasmin — este; avidyā — sem conhecimento; kāma — por causa de desejos; karmabhiḥ — por atividades; ucca — entre superiores; avacāsu — e inferio­res; gatiṣu — destinos; na veda — não reconhecem; svām — seu próprio; gatim — destino; bhraman — vagando.

[O Senhor Kṛṣṇa pensou:] Com certeza todos neste mundo estão vagando entre destinos superiores e inferiores, os quais alcançam mediante atividades executadas segundo seus desejos e sem pleno conhecimento. Desse modo, ninguém conhece seu verdadeiro destino.

SIGNIFICADO—Śrīla Jīva Gosvāmī apresentou uma elaborada explicação de como este verso se aplica aos eternamente liberados residentes de Śrī Vṛndāvana, a morada do Senhor. Um dos princípios filosóficos fundamen­tais do Śrīmad-Bhāgavatam é a distinção entre dois tipos de ilusão, Yogamāyā e Mahāmāyā, respectivamente os estados de existência espiritual e material. Embora Kṛṣṇa seja Deus, o Ser Supremo oni­potente e onisciente, Seus companheiros íntimos no mundo espiritual amam-nO tanto que O veem como seu amado filho, amigo, amante etc. Para que seu amor extático possa transcender os limites da mera reverência, eles se esquecem de que Kṛṣṇa é o Deus Supremo de todos os universos, de modo que seu amor puro e íntimo se expande ilimitadamen­te. Talvez alguém considere que suas atividades de tratar Kṛṣṇa como uma criança indefesa, um belo namorado ou um colega de brincadei­ras são uma manifestação de avidyā, ignorância da posição do Senhor Kṛṣṇa como Deus, mas os residentes de Vṛndāvana estão de fato ignorando a majestade secundária de Kṛṣṇa e focalizando intensa­mente Sua infinita beleza, que é a essência de Sua existência.

Com efeito, descrever o Senhor Kṛṣṇa como o controlador supremo e Deus é quase uma espécie de análise política, já que ela se refere a uma hierarquia de poder e controle. Semelhante análise dos níveis de poder e das hierarquias de governo é significativa em um contexto em que a entidade não se encontra cem por cento rendida, em amor, a uma entidade superior. Em outras palavras, o controle torna-se visível, ou é sentido conscientemente como controle, quando há re­sistência a tal controle. Para citar um exemplo simples, o cidadão piedoso e obediente às leis vê o policial como amigo e benquerente, ao passo que o criminoso o vê como um ameaçador símbolo de cas­tigo. Aqueles que estão entusiasmados com a política do governo não sentem que este os controla, mas sim que os ajuda.

O Senhor Kṛṣṇa, portanto, é visto como um “controlador”, e daí como o “Deus Supremo”, por aqueles que não estão plenamente encantados com Sua beleza e Seus passatempos. Aqueles que estão completa­mente apaixonados pelo Senhor Kṛṣṇa focalizam Suas características sublimes e atrativas e, devido à natureza de sua relação com Ele, não notam muito Seu poder controlador.

Uma prova simples de que os residentes de Vraja transcenderam estados inferiores de consciência de Deus, em vez de terem fracassa­do em alcançá-los, é o fato de que, através de todos os passatempos do Senhor, eles muitas vezes se “lembram” de que Kṛṣṇa é Deus. Em geral, eles se espantam com esta lembrança, por estarem cem por cento absortos em ver Kṛṣṇa como seu amigo, amante etc.

Convencionalmente, usa-se a palavra kāma para indicar um desejo material ou, então, um desejo espiritual tão intenso que, de algum modo, torna-se análogo aos intensos desejos materiais. Ainda assim, perma­nece a distinção fundamental: o desejo material é egoísta e busca a própria satisfação; o desejo espiritual é livre de egoísmo, sendo todo para o prazer do outro, o Senhor. Dessa maneira, os residentes de Vṛndāvana praticavam suas atividades diárias apenas para o prazer de seu amado Kṛṣṇa.

Deve-se lembrar que todo o propósito do advento de Kṛṣṇa a este mundo é atrair os seres vivos de volta ao lar, de volta ao Supremo. Para isso, duas coisas são necessárias: que Seus passatempos exi­bam a beleza da perfeição espiritual e que, de alguma forma, pareçam importantes e daí interessantes para as almas condicionadas deste mundo. O Bhāgavatam afirma muitas vezes que o Senhor Kṛṣṇa encena tal qual um jovem ator, e, sem dúvida, Ele ocupa Seus devotos eternos na representação dramática. Por isso, o Senhor Kṛṣṇa nesta passagem reflete conSigo mesmo que as pessoas neste mundo com certeza não conhecem seu destino último e, com um óbvio toque espirituoso, pensa assim também de Seus companheiros eternamente liberados, que estavam neste mundo fazendo o papel de membros comuns de uma vila de vaqueiros.

Além do duplo sentido obviamente presente neste verso quando se aplica aos liberados companheiros do Senhor, Kṛṣṇa aqui faz uma observação crítica, mordaz e bem direta sobre as pessoas comuns. Quando aplicada a almas condicionadas que estão de fato a vagar pelo universo inteiro, Sua afirmação de que elas agem devido à ignorância e luxúria não é mitigada por nenhum sentido espiritual mais profundo. As pessoas em geral simplesmente são ignorantes e não consideram com seriedade seu destino final. Como de costume, o Senhor Śrī Kṛṣṇa é capaz de dizer muitas verdades profundas e complexas em poucas palavras simples. Como somos afortunados por Deus não ser um árido campo de energia, uma refulgente bolha transcendental ou inexistir por completo – como várias pessoas pensam. De fato, Ele é a admirabilíssima Personalidade de Deus, pleno de quali­dades pessoais e absolutas, e com certeza Ele pode fazer melhor do que nós qualquer coisa que possamos fazer, como o evidencia Sua brilhante manei­ra de falar.

« Previous Next »