VERSOS 1-5
śrī-śuka uvāca
atha sarva-guṇopetaḥ
kālaḥ parama-śobhanaḥ
yarhy evājana-janmarkṣaṁ
śāntarkṣa-graha-tārakam
diśaḥ prasedur gaganaṁ
nirmaloḍu-gaṇodayam
mahī maṅgala-bhūyiṣṭha-
pura-grāma-vrajākarā
nadyaḥ prasanna-salilā
hradā jalaruha-śriyaḥ
dvijāli-kula-sannāda-
stavakā vana-rājayaḥ
vavau vāyuḥ sukha-sparśaḥ
puṇya-gandhavahaḥ śuciḥ
agnayaś ca dvijātīnāṁ
śāntās tatra samindhata
manāṁsy āsan prasannāni
sādhūnām asura-druhām
jāyamāne ’jane tasmin
nedur dundubhayaḥ samam
śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; atha — por ocasião do aparecimento do Senhor; sarva — em toda parte; guṇa-upetaḥ — dotado com atributos ou facilidades materiais; kālaḥ — um tempo favorável; parama-śobhanaḥ — muito auspiciosa e bem favorável, sob todos os pontos de vista; yarhi — quando; eva — decerto; ajana janma-ṛkṣam — a constelação conhecida como Rohiṇī; śānta-ṛkṣa — nenhuma das constelações era rebelde (todas estavam plácidas); graha-tārakam — e os planetas e as estrelas como Aśvinī; diśaḥ — todas as direções; praseduḥ — pareciam muito auspiciosas e pacíficas; gaganam — todo o espaço exterior, ou o céu; nirmala-uḍu-gaṇa-udayam — no qual todas as estrelas auspiciosas eram visíveis (na camada superior do universo); mahī — a Terra; maṅgala-bhūyiṣṭha-pura-grāma-vraja-ākarāḥ — cujas cidades, municípios, campos de pastagem e minas tornaram-se auspiciosos e muito limpos e asseados; nadyaḥ — os rios; prasanna-salilāḥ — as águas tornaram-se cristalinas; hradāḥ — os lagos ou grandes reservatórios de água; jalaruha-śriyaḥ — pareciam muito belos devido ao fato de que floresciam lótus em toda a volta; dvija-ali-kula-sannāda-stavakāḥ — os pássaros, especialmente os cucos, e enxames de abelhas começaram a cantar com doces vozes, como se orassem à Suprema Personalidade de Deus; vana-rājayaḥ — árvores e plantas verdes também eram muito agradáveis de se ver; vavau — soprava; vāyuḥ — a brisa; sukha-sparśaḥ — muito agradável ao tato; puṇya-gandha-vahaḥ — que estava cheia de fragrâncias; śuciḥ — sem poluição de poeira; agnayaḥ ca — e os fogos (nos locais de sacrifício); dvijātīnām — dos brāhmaṇas; śāntāḥ — imperturbáveis, estáveis, calmos e quietos; tatra — ali; samindhata — ardiam; manāṁsi — as mentes dos brāhmaṇas (que, por causa de Kaṁsa, sempre estavam com medo); āsan — tornarem-se; prasannāni — assaz satisfeitas e livres de perturbações; sādhūnām — dos brāhmaṇas, que eram todos devotos vaiṣṇavas; asura-druhām — que haviam sido oprimidos por Kaṁsa e outros demônios que perturbavam o desempenho de rituais religiosos; jāyamāne — devido ao aparecimento ou nascimento; ajane — do Senhor Viṣṇu, que sempre é não-nascido; tasmin — naquela situação; neduḥ — ressoaram; dundubhayaḥ — timbales; samam — simultaneamente (nos planetas superiores).
Em seguida, no momento auspicioso do aparecimento do Senhor, o universo inteiro transbordou de todas as qualidades em que existia bondade, beleza e paz. A constelação Rohiṇī apareceu, e também estrelas como a Aśvinī. O Sol, a Lua e as outras estrelas e planetas estavam muito plácidos. Todas as direções pareciam extremamente agradáveis, e belas estrelas cintilavam no céu diáfano. Decorada com cidades, vilas, minas e campos de pastagem, a Terra parecia muito auspiciosa. As águas dos rios eram cristalinas, e os lagos e vários reservatórios, cheios de lírios e lótus, estavam extraordinariamente belos. Nas árvores e plantas verdes, repletas de flores e folhas, agradáveis aos olhos, pássaros como cucos e enxames de abelhas começaram a cantar com doces vozes para agradar aos semideuses. Soprava uma brisa pura, que satisfazia o tato e transportava o aroma das flores, e, quando os brāhmaṇas ocupados em cerimônias ritualísticas acenderam o fogo de sacrifício de acordo com os princípios védicos, as chamas se revelaram estáveis, não sendo perturbadas pela brisa. Assim, quando o não-nascido Senhor Viṣṇu, a Suprema Personalidade de Deus, estava prestes a aparecer, os santos e brāhmaṇas, que sempre eram incomodados por demônios como Kaṁsa e seus homens, sentiram paz no âmago de seus corações, e, simultaneamente, os timbales vibraram no sistema planetário superior.
SIGNIFICADO—Como se afirma na Bhagavad-gītā, o Senhor diz que Seu aparecimento, nascimento e atividades são todos transcendentais e que alguém que os compreende de fato logo se torna apto a transferir-se para o mundo espiritual. O aparecimento ou nascimento do Senhor não é como o de um homem comum, pois esse é forçado a aceitar um corpo material de acordo com seus feitos passados. O aparecimento do Senhor é explicado no capítulo anterior: Ele aparece de acordo com Seu bel-prazer.
Ao chegar a hora do aparecimento do Senhor, as constelações tornaram-se muito auspiciosas. A influência astrológica da constelação conhecida como Rohiṇī também predominava porque essa constelação é considerada muito auspiciosa. Rohiṇī está sob a supervisão direta de Brahmā, que nasce de Viṣṇu, e aparece no nascimento do Senhor Viṣṇu, que, aliás, não tem nascimento. De acordo com a conclusão astrológica, além da apropriada situação das estrelas, existem momentos auspiciosos e inauspiciosos decorrentes de diferentes situações de vários sistemas planetários. Na ocasião do nascimento de Kṛṣṇa, os sistemas planetários naturalmente organizaram-se de tal modo que tudo se tornasse auspicioso.
Naquele momento, em todas as direções – leste, oeste, sul, norte, afinal, em toda parte –, havia uma atmosfera de paz e prosperidade. Estrelas auspiciosas eram visíveis no céu, e, na superfície da Terra, em todas as cidades e vilas ou campos de pastagem, bem como na mente de todos, havia indícios de boa fortuna. Os rios fluíam cheios de água, e os lagos estavam belamente decorados com flores de lótus. As florestas estavam repletas de belos pássaros e pavões. Todos os pássaros que viviam dentro das florestas começaram a cantar com doces vozes, e os pavões começaram a dançar com suas consortes. O vento soprava muito agradavelmente, carregando o aroma de diferentes flores, e, ao tocar no corpo, causava uma sensação muito agradável. No lar, os brāhmaṇas, acostumados a oferecer sacrifícios no fogo, sentiam seus lares muito propícios à realização de oferendas. Devido às perturbações criadas pelos reis demoníacos, o fogo de sacrifício quase se extinguira nas casas dos brāhmaṇas, mas agora eles podiam dispor da oportunidade de acender o fogo pacificamente. Proibidos de oferecer sacrifícios, os brāhmaṇas tinham a mente e a inteligência muito perturbadas e agiam com ansiedade. Contudo, no exato instante do aparecimento de Kṛṣṇa, suas mentes se impregnaram de um júbilo espontâneo porque eles podiam ouvir no céu altas vibrações de sons transcendentais que anunciavam o aparecimento da Suprema Personalidade de Deus.
Na ocasião do nascimento do Senhor Kṛṣṇa, ocorreram mudanças sazonais em todo o universo. Kṛṣṇa nasceu durante o mês de setembro, mas parecia que era a primavera. A atmosfera, no entanto, estava bem fria, embora não fosse gélida, e parecia que os rios e reservatórios estavam em śarat, o outono. Os lótus e os lírios desabrocham durante o dia, mas, embora Kṛṣṇa tivesse aparecido exatamente à meia-noite, os lírios e os lótus floresciam e, em virtude disso, o vento que soprava naquele momento estava repleto de aromas. Devido às perturbações causadas por Kaṁsa, as cerimônias ritualísticas védicas haviam quase cessado. Os brāhmaṇas e as pessoas santas não podiam executar pacificamente os rituais védicos. Agora, no entanto, os brāhmaṇas estavam muito satisfeitos porque podiam realizar com tranquilidade suas cerimônias ritualísticas diárias. A ocupação dos asuras é perturbar os suras, os devotos e brāhmaṇas, mas, no momento do aparecimento de Kṛṣṇa, esses devotos e brāhmaṇas não foram incomodados.