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VERSO 31

īśvarāṇāṁ vacaḥ satyaṁ
tathaivācaritaṁ kvacit
teṣāṁ yat sva-vaco-yuktaṁ
buddhimāṁs tat samācaret

īśvarāṇām — dos servos do Senhor que são dotados de poder; vacaḥ — as palavras; satyam — verdadeiras; tathā eva — também; ācaritam — o que eles fazem; kvacit — às vezes; teṣām — deles; yat — o que; sva-vacaḥ — com as próprias palavras; yuktam — de acordo; buddhi-­mān — quem é inteligente; tat — isto; samācaret — deve executar.

As declarações dos servos do Senhor que são dotados de poder são sempre verdadeiras, e os atos que executam são exemplares quando compatíveis com aquelas declarações. Portanto, quem é inteligente deve levar a cabo as instruções deles.

SIGNIFICADO—Em geral, a palavra īśvara se define nos dicionários de sânscrito como “senhor, mestre, governante”, e também como “capaz, com poder para fazer”. Śrīla Prabhupāda costumava traduzir īśvara como “controlador”, que sintetiza brilhantemente os dois conceitos fundamentais de īśvara, isto é, um amo ou governante e uma pessoa capaz ou poderosa. Um amo talvez seja incompetente, mas um controlador é um amo ou senhor que de fato faz com que as coisas aconteçam. O parameśvara, o īśvara supremo, o controlador supremo, certamente é Deus, Kṛṣṇa, a causa de todas as causas.

Embora as pessoas em geral, sobretudo nos países ocidentais, não sejam cientes do fato, poderosas personalidades controlam nosso universo. O moderno conceito impessoal acerca do universo retrata um cosmos quase totalmente inerte no qual a Terra flutua sem senti­do. Assim, ficamos com o duvidoso “objetivo último” de preservar e reproduzir nosso código genético, que tem seu próprio “objetivo último” de acrescentar outro elo à despropositada cadeia de eventos mediante uma nova reprodução de si mesmo.

Em contraste com este mundo estéril e sem sentido inventado por materialistas ignorantes, o verdadeiro universo é repleto de vida – vida pessoal – e, de fato, pleno de Deus, que penetra e mantém tudo o que existe. A essência da realidade é a Suprema Personalidade de Deus e Sua relação pessoal com os inumeráveis seres vivos, dos quais somos amostras. Alguns dos seres vivos estão presos na armadilha da ilusão do materialismo, ou identificação com o corpo material, enquanto outros são liberados, conscientes de sua natureza espiritual eterna. Uma terceira classe compreende aqueles que, na autorrealiza­ção, estão progredindo do estado materialista de ignorância para o estado iluminado de consciência de Kṛṣṇa.

A realidade, em última análise, é pessoal e divina e, portanto, não é surpreendente que, como nos revela a literatura védica, este universo e outros universos sejam governados por grandes personalidades, assim como nossa cidade, estado e país são dirigidos por homens habilitados. Quando nós, democraticamente, outorgamos a determi­nado político o direito de governar, votamos nele porque ele exibiu algo que chamamos de “liderança” ou “capacidade”. Pensamos: “Ele fará bem o seu trabalho.” Em outras palavras, é só depois que o indivíduo adquire o poder de governar que votamos nele; nosso voto não faz dele um líder, mas sim reconhece nele um poder que vem de alguma outra fonte. Logo, como o Senhor Kṛṣṇa explica no final do décimo capítulo da Bhagavad-gītā, qualquer ser vivo que exiba um poder, capacidade ou autoridade extraordinários deve ter recebido poder do próprio Senhor ou da energia do Senhor.

Aqueles que são diretamente dotados de poder pelo Senhor são devotados a Ele, de modo que seu poder e influência difundem a bondade pelo mundo, ao passo que os que recebem poder da potência ilusória do Senhor estão em relação indireta com Kṛṣṇa, pois não refletem diretamente a vontade dEle. É claro que eles refletem Sua vontade indiretamente, pois é por arranjo de Kṛṣṇa que as leis da na­tureza agem sobre os seres vivos ignorantes, persuadindo-os gradual­mente, através de sua jornada de muitas vidas, a renderem-se ao Senhor Supremo. Logo, quando criam guerras, falsas esperanças e inúmeros planos passionais para seus seguidores materialistas, os políticos estão executando indiretamente o programa do Senhor, o qual con­siste em permitir que as almas condicionadas experimentem o fruto amargo do ateísmo.

Śrīla Bhaktisiddhānta Sarasvatī Ṭhākura traduziu a palavra īśvarāṇām como “aqueles que se tornaram poderosos através de conhecimento e austeridade”. À medida que compreende a natureza e a vontade de Deus e faz o sacrifício pessoal exigido para se alcançar a excelência na vida espiritual, o ser vivo recebe poder do Senhor Supremo para representar Sua vontade, a qual ele inteligentemente reconheceu e aceitou.

A Suprema Personalidade de Deus bondosamente desce à Terra para mostrar um vívido exemplo de comportamento religioso. Como declara o Senhor Kṛṣṇa na Bhagavad-gītā (3.24), “Se Eu não executasse os deveres regulamentares, o mundo inteiro seria desorienta­do e, de fato, destruído”. Dessa maneira, o Senhor mostrou, em Suas diferentes encarnações, como agir bem neste mundo. Um bom exem­plo é o Senhor Rāmacandra, que Se comportou de modo maravilhoso como filho do rei Daśaratha.

Porém, quando o próprio Senhor Kṛṣṇa faz Seu advento, Ele também demonstra o princípio religioso último, isto é, que o Senhor Supremo está acima de todos os outros seres vivos e que ninguém pode imitar Sua posição suprema. Este mais importante dentre todos os princípios religiosos que o Senhor é único, inigualável e insuperável – foi claramente demonstrado nos passatempos do Senhor Kṛṣṇa com as gopīs, os quais parecem imorais. Ninguém pode imitar essas atividades sem incorrer em terríveis consequências, como explica neste verso Śukadeva Gosvāmī. Quem pensa que o Senhor Kṛṣṇa é um ser vivo ordinário sujeito à luxúria, ou quem aceita Sua dança da rāsa como admirável e tenta imitá-la, decerto perecerá, como se descreve no verso trinta deste capítulo.

Por fim, deve-se fazer uma distinção entre o Senhor e Seus servos dotados de poder. Um servo dotado de poder pelo Senhor, como no caso de Brahmā, pode experimentar um resquício de reações às atividades anteriores, segundo a lei do karma. O Senhor, em contraste, é eternamente livre de qualquer envolvimento com as leis do karma. Ele está em uma plataforma singular.

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