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VERSO 21

api bata madhu-puryām ārya-putro ’dhunāste
smarati sa pitṛ-gehān saumya bandhūṁś ca gopān
kvacid api sa kathā naḥ kiṅkarīṇāṁ gṛṇīte
bhujam aguru-sugandhaṁ mūrdhny adhāsyat kadā nu

api — decerto; bata — lamentável; madhu-puryām — na cidade de Mathurā; ārya-putra — o filho de Nanda Mahārāja; adhunā — agora; āste — reside; smarati — lembra-Se; sa — Ele; pit-gehān — dos assun­tos familiares de Seu pai; saumya — ó grande alma (Uddhava); ban­dhūn — de Seus amigos; ca — e; gopān — os vaqueirinhos; kvacit — às vezes; api — ou; sa — Ele; kathā — histórias; na — sobre nós; kikarīām — sobre as criadas; gṛṇīte — conta; bhujam — mão; aguru-su­gandham — que tem o perfume do aguru; mūrdhni — sobre a cabeça; adhāsyat — manterá; kadā — quando; nu — talvez.

“Ó Uddhava! Na verdade, é lamentável que Kṛṣṇa resida em Mathurā. Acaso Ele Se lembra dos afazeres domésticos de Seu pai e de Seus amigos, os vaqueirinhos? Ó grande alma! Acaso Ele alguma vez falou de nós, Suas criadas? Quando Ele descansará Sua mão com aroma de aguru sobre nossas cabeças?”

SIGNIFICADO—A tradução e os significados das palavras deste verso são do Caitanya-caritāmta (Ādi 6.68) de Śrīla Prabhupāda.

Śrīla Viśvanātha Cakravartī escreve, de maneira muito poética e com profunda visão espiritual, sobre as emoções expressas neste e nos nove versos precedentes. Ele interpreta os sentimentos de Rādhārāṇī da seguinte maneira.

Śrīmatī Rādhārāṇī pensou: “Visto que Kṛṣṇa certa vez estava satisfeito em Vraja, mas partiu para a cidade de Mathurā, será que Ele não sentirá o desejo de deixar aquele lugar e ir para algum outro? Mathurā fica tão perto de Vṛndāvana que é até possível que Ele volte para cá.

 “Kṛṣṇa é o filho de um cavalheiro respeitável, Nanda Mahārāja, de modo que Ele deve estar em Mathurā por causa de Seu sentimento de obrigação para com Seu pai, que O autorizou a ir lá. Por outro lado, embora toda a vida de Nanda seja exclusivamente dedicada a Kṛṣṇa, Nanda é tão inocente que se deixou enganar pelos Yadus, que leva­ram Kṛṣṇa para Mathurā. Kṛṣṇa deve estar pensando: ‘Ai de Mim! Se nem mesmo Meu pai conseguiu levar-Me de volta para Vraja, o que posso fazer para voltar para lá?’ Então, Kṛṣṇa deve estar impaciente por voltar para cá, e por isso te enviou, um mensageiro.

“É só por ser Nanda muito inocente que ele permitiu que seu filho partisse. Se Nanda tivesse permitido, a mãe de Kṛṣṇa, a rainha de Vraja, teria subido na quadriga de Akrūra e, segurando seu filho pelo pescoço, teria ido com Ele para Mathurā, seguida por todas as gopīs. Mas nada disso foi possível.

“Desde a partida de Kṛṣṇa, Nanda ficou aturdido pela separação dEle, e sua tesouraria, armazéns, cozinhas, dormitórios, casas, opulência­ e assim por diante agora estão vazios. Por não estarem sendo varridos nem limpos, agora estão sujos de palha, poeira, folhas e teias de aranha. Será que Kṛṣṇa alguma vez Se recorda das casas de Seu pai? E será que Ele às vezes Se lembra de Subala e de Seus outros amigos, que agora estão sempre aturdidos em outras casas descuidadas?

“As mulheres de Mathurā que agora se associam com Kṛṣṇa não podem saber como servi-lO da maneira que mais Lhe agrada. Quando elas veem que Ele não está satisfeito e perguntam como podem fazê­-lO feliz, será que Ele lhes fala sobre nós, as gopīs?

“Kṛṣṇa deve dizer-lhes: ‘Vós, mulheres da cidade, não podeis agradar-Me tanto quanto as gopīs de Vraja. Elas são muito habilido­sas em fazer guirlandas de flores, perfumar seus corpos com bálsa­mos, tocar vários ritmos e melodias em instrumentos de corda, bailar e cantar na dança da rāsa, exibir sua beleza, encanto e talento e brincar habilmente de perguntas e respostas. Elas são peritas sobretudo nos passatempos de encontrar o amante e mostrar ira enciumada e outros sinais de amor e afeição puros.’ Sem dúvida, Kṛṣṇa deve saber disso. Portanto, é provável que Ele diga às mulheres de Mathurā: ‘Minhas queridas senhoras do clã Yadu, por favor, voltai para vossas famílias. Não quero mais vossa companhia. De fato, estou voltando para Vraja amanhã bem cedo.’

“Quando é que Kṛṣṇa falará dessa maneira e voltará para cá a fim de repousar Sua mão, perfumada com aroma de aguru, sobre nossas cabeças? Então, Ele nos consolará dizendo: ‘Ó amadas de Meu cora­ção, prometo-vos que nunca mais voltarei a abandonar-vos para ir a outro lugar. Em realidade, não consegui encontrar ninguém em todos os três mundos com um vestígio sequer de vossas boas qualidades.’”

Assim, Śrīla Viśvanātha Cakravartī interpreta os sentimentos de Śrīmatī Rādhārāṇī. O ācārya explica também que o presente verso exibe o discurso chamado sujalpa, conforme o descreve Rūpa Gosvāmī:

yatrārjavāt sa-gāmbhīryaṁ
sa-dainyaṁ saha-cāpalam
sotkaṇṭhaṁ ca hariḥ pṛṣṭaḥ
sa sujalpo nigadyate

“Quando, movida por sinceridade honesta, uma amante interroga Śrī Hari com gravidade, humildade, instabilidade e ansiedade, tal discurso chama-se sujalpa.” (Ujjvala-nīlamai 14.200)

Concluindo esta seção do capítulo quarenta e sete, Śrīla Viśva­nātha Cakravartī explica que há dez divisões da loucura divina (divyonmāda), que se exprimem pelas dez divisões de citra-jalpa, ou discurso variado. Tal loucura divina se exibe no passatempo especial da perplexidade, a qual é ela mesma parte da bem-aventurança sublime, mahā-bhāva, de Śrīmatī Rādhārāṇī. O ācārya cita os seguintes versos do Ujjvala-nīlamai (14.174, 178-180), de Rūpa Gosvāmī, para explicar esses êxtases:

prāyo vṛndāvaneśvaryāṁ
mohano ’yam udañcati
etasya mohanākhyasya
gatiṁ kām apy upeyuṣaḥ

bhramābhā kāpi vaicitrī
divyonmāda itīryate
udghūrṇā citra-jalpādyās
tad-bhedā bahavo matāḥ

preṣṭhasya suhṛd-āloke
gūḍha-roṣābhijṛmbhitaḥ
bhūri-bhāva-mayo jalpo
yas tīvrotkaṇṭhitāntimaḥ

citra-jalpo daśāṅgo ’yaṁ
prajalpaḥ parijalpitaḥ
vijalpo ’jjalpa-sañjalpaḥ
avajalpo ’bhijalpitam

ājalpaḥ pratijalpaś ca
sujalpaś ceti kīrtitaḥ

“Praticamente, é apenas na princesa de Vṛndāvana [Śrīmatī Rādhārāṇī] que surge o êxtase da perplexidade. Ela alcançou uma fase especial dessa perplexidade, um estado admirável semelhante ao delírio. Conhecido como divyonmāda, ele tem muitos aspectos, que vêm e vão instavelmente, e uma dessas manifestações é citra-jalpa. Esta conversa, induzida pelo fato de Ela ter visto o amigo de Seu amado, está repleta de ira encoberta e abrange muitos êxtases diferentes. E culmina em Sua ansiedade intensa e angustiada.

“Este citra-jalpa tem dez divisões, conhecidas como prajalpa, parijalpa, vijalpa, ujjalpa, sañjalpa, avajalpa, abhijalpa, ājalpa, pratijalpa e sujalpa.”

Para finalizar, algumas autoridades afirmam que o próprio Kṛṣṇa, ávido por beber a doçura da fala de Sua amada, assumiu a forma da abelha mensageira.

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