VERSO 16
mukto ’pi tāvad bibhṛyāt sva-deham
ārabdham aśnann abhimāna-śūnyaḥ
yathānubhūtaṁ pratiyāta-nidraḥ
kiṁ tv anya-dehāya guṇān na vṛṅkte
muktaḥ — a pessoa liberada; api — até; tāvat — enquanto; bibhṛyāt — for obrigada a manter; sva-deham — seu próprio corpo; ārabdham — obtido como resultado de atividades passadas; aśnan — aceitando; abhimāna-śūnyaḥ — sem concepções errôneas; yathā — como; anubhūtam — o que foi percebido; pratiyāta-nidraḥ — alguém que acabou de acordar; kim tu — porém; anya-dehāya — em busca de outro corpo material; guṇān — as qualidades materiais; na — nunca; vṛṅkte — desfruta.
Até a pessoa liberada é obrigada a aceitar o corpo decorrente de seu karma passado. Sem concepções errôneas, contudo, ela percebe seu gozo e sofrimento decorrentes desse karma da mesma maneira que, ao despertar, uma pessoa percebe o sonho que teve enquanto dormia. Assim, ela permanece fixa, sem jamais agir de maneira a obter outro corpo material sob a influência dos três modos da natureza material.
SIGNIFICADO—A diferença entre a alma liberada e a alma condicionada é que a alma condicionada está sob a influência do conceito de vida corpórea, ao passo que a alma liberada sabe que não é o corpo, mas sim um espírito, diferente do corpo. Priyavrata poderia pensar que, visto que a alma condicionada é obrigada a agir de acordo com as leis da natureza, por que ele deveria, sendo tão avançado em compreensão espiritual, aceitar a mesma espécie de cativeiro e obstáculos ao avanço espiritual? Para sanar essa dúvida, o senhor Brahmā lhe informou que nem as pessoas liberadas se ressentem ao aceitar o corpo atual a partir dos resultados de suas vidas passadas. Enquanto dormem, as pessoas sonham muitas coisas irreais, mas, ao acordarem, deixam-nas de lado para prosseguir com sua vida real. Do mesmo modo, a pessoa liberada – tendo compreendido inteiramente que não é o corpo, mas sim uma alma espiritual – desconsidera as atividades passadas executadas em ignorância e realiza suas atividades presentes de tal maneira que elas não produzam reações. Descreve-se isso na Bhagavad-gītā (3.9), yajñārthāt karmaṇo ’nyatra loko ’yaṁ karma-bandhanaḥ: quem realiza atividades para a satisfação da Personalidade Suprema, o yajña-puruṣa, não sofre reações, ao passo que os karmīs, que agem por interesse próprio, são atados pelas reações de seu trabalho. A pessoa liberada, portanto, não pensa no que fez no passado, influenciada pela ignorância; ao contrário, ela age de maneira a não produzir outro corpo decorrente de atividades fruitivas. Como se menciona claramente na Bhagavad-gītā (14.26):
mām ca yo ’vyabhicāreṇa
bhakti-yogena sevate
sa guṇān samatītyaitān
brahma-bhūyāya kalpate
“Aquele que se ocupa em serviço devocional pleno e não falha em circunstância alguma, transcende de imediato os modos da natureza material e chega então ao nível de Brahman.” Independentemente do que tenhamos feito em nossas vidas passadas, caso nos ocupemos em serviço devocional imaculado ao Senhor nesta vida, estaremos sempre situados no estado brahma-bhūta (liberado), livres das reações, e não seremos obrigados a aceitar outro corpo material. Tyaktvā dehaṁ punar jamma naiti mam eti so ’rjuna (Bhagavad-gītā 4.9). Após abandonar o corpo, quem agiu dessa maneira não precisa aceitar outro corpo material, senão que, em vez disso, volta ao lar, volta ao Supremo.