VERSOS 19-20
ātmā nityo ’vyayaḥ śuddha
ekaḥ kṣetra-jña āśrayaḥ
avikriyaḥ sva-dṛg hetur
vyāpako ’saṅgy anāvṛtaḥ
etair dvādaśabhir vidvān
ātmano lakṣaṇaiḥ paraiḥ
ahaṁ mamety asad-bhāvaṁ
dehādau mohajaṁ tyajet
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ātmā — a alma espiritual, que é parte da Suprema Personalidade de Deus; nityaḥ — sem nascimento ou morte; avyayaḥ — sem possibilidade de deterioração; śuddhaḥ — sem a contaminação material de apego e desapego; ekaḥ — individual; kṣetra-jñaḥ — que conhece e, portanto, é diferente do corpo material; āśrayaḥ — a base original; avikriyaḥ — ao contrário do que acontece com o corpo, não se submetendo a mudanças; sva-dṛk — autoiluminada; hetuḥ — a causa de todas as causas; vyāpakaḥ — espalhando-se por todo o corpo sob a forma de consciência; asaṅgī — não dependente do corpo (livre de transmigrar de um corpo a outro); anāvṛtaḥ — livre da contaminação material; etaiḥ — com todas essas; dvādaśabhiḥ — doze; vidvān — a pessoa que não é tola, mas plenamente ciente das coisas como elas são; ātmanaḥ — da alma espiritual; lakṣaṇaiḥ — características; paraiḥ — transcendentais; aham — eu (“eu sou este corpo”); mama — eu (“tudo o que tem relação com este corpo é meu”); iti — assim; asat-bhāvam — um falso conceito de vida; deha-ādau — identificando-se com o corpo material e, em seguida, com a esposa, filhos, família, comunidade, nação e assim por diante; moha-jam — produzido do conhecimento ilusório; tyajet — deve abandonar.
“Ātmā” se refere ao Senhor Supremo ou às entidades vivas. Ambos são espirituais, livres do nascimento e da morte, livres da deterioração e da contaminação material. Eles são individuais, são os conhecedores do corpo externo e são a base ou o refúgio de tudo. Estão livres da mudança material, são autoiluminados, são a causa de todas as causas e são onipenetrantes. Nada têm a ver com o corpo material e, portanto, jamais estão ocultos. Com essas qualidades transcendentais, quem é realmente erudito deve abandonar o conceito de vida ilusória, no qual alguém pensa: “Eu sou este corpo material, e tudo o que tem relação com este corpo é meu.”
SIGNIFICADO—Na Bhagavad-gītā (15.7), o Senhor Kṛṣṇa diz claramente que mamaivāṁśo jīva-loke jīva-bhūtaḥ: “Todas as entidades vivas fazem parte de Mim.” Qualitativamente, portanto, as entidades vivas são iguais à Suprema Personalidade de Deus, que é o líder, o Supremo entre todas as entidades vivas. Os Vedas dizem que nityo nityānāṁ cetanaś cetanānām: o Senhor é a principal entidade viva individual, o líder das entidades vivas subordinadas. Porque as entidades vivas são partes ou amostras de Deus, suas qualidades não são diferentes daquelas do Senhor Supremo. As entidades vivas têm as mesmas qualidades do Senhor, assim como uma gota da água do mar é composta dos mesmos elementos químicos de que é formado o imenso mar. Assim, existem as mesmas qualidades em uma quantidade diferente. Pode-se entender a Suprema Personalidade de Deus entendendo-se a amostra, a entidade viva, porque, nas entidades vivas, existem todas as qualidades de Deus em quantidade diminuta. Existe unidade, mas Deus é grande, ao passo que as entidades vivas são extremamente pequenas. Aṇor aṇīyān mahato mahīyān. (Kaṭha Upaniṣad 1.2.20) As entidades vivas são menores do que o átomo, mas Deus é maior do que o maior. Nosso conceito de grandeza pode ser representado pelo céu porque pensamos que o céu é ilimitadamente grande, mas Deus é maior do que o céu. Do mesmo modo, temos o conhecimento de que, menores do que os átomos, as entidades vivas são do tamanho de um décimo de milésimo da ponta de um cabelo, mas a qualidade de ser a suprema causa de todas as causas existe na entidade viva bem como na Suprema Personalidade de Deus. Na verdade, é devido à presença da entidade viva que o corpo existe e que acontecem as mudanças corpóreas. Igualmente, é devido ao fato de o Senhor Supremo estar dentro deste universo que as mudanças ditadas pelas leis materiais ocorrem.
A palavra ekaḥ, que significa “individual”, é significativa. Como se explica na Bhagavad-gītā (9.4), mat-sthāni sarva-bhūtāni na cāhaṁ teṣv avasthitaḥ. Tudo o que é material ou espiritual, incluindo a terra, a água, o ar, o fogo, o céu e as entidades vivas, existe em conexão com a alma espiritual. Embora tudo emane da Suprema Personalidade de Deus, ninguém deve pensar que o Senhor Supremo depende de alguma outra coisa.
Deus e a entidade viva são plenamente conscientes. Como entidades vivas, somos conscientes de nossa existência corpórea. Do mesmo modo, o Senhor é consciente da gigantesca manifestação cósmica. Isso é confirmado nos Vedas. Yasmin dyauḥ pṛthivī cāntarīkṣam. Vijñātāram adhikena vijānīyāt. Ekam evādvitīyam. Ātma-jyotiḥ samrāḍ ihovāca. Sa imān lokān asṛjata. Satyaṁ jñānam anantam. Asaṅgo hy ayaṁ puruṣaḥ. Pūrṇasya pūrṇam ādāya pūrṇam evāvaśiṣyate. Todos esses preceitos védicos provam que tanto a Suprema Personalidade de Deus quanto a alma diminuta têm sua individualidade. Um é grande, e o outro, pequeno, mas ambos são a causa de todas as causas – o ser corporalmente limitado e o ser universalmente ilimitado.
Devemos sempre lembrar que, embora sejamos iguais à Suprema Personalidade de Deus em qualidade, nunca somos iguais a Ele em quantidade. As pessoas com um pequeno cabedal de inteligência, julgando-se detentores das mesmas qualidades de Deus, pensam tolamente que as têm na mesma quantidade por Ele apresentada. A inteligência delas se chama aviśuddha-buddhayaḥ – inteligência grosseira ou contaminada. Quando tais pessoas, após muitas e muitas vidas de esforço árduo em busca da causa suprema, enfim passam a realmente conhecer Kṛṣṇa, Vāsudeva, elas se rendem a Ele (vāsudevaḥ sarvam iti sa mahātmā sudurlabhaḥ). Assim, elas se tornam grandes mahātmās, almas perfeitas. Se alguém for assaz afortunado para entender sua relação com Deus, sabendo que Deus é grande (vibhu), ao passo que a entidade viva é pequena (aṇu), ele tem conhecimento perfeito. Quando pensa que ele é o corpo material e que tudo relacionado com o corpo material lhe pertence, o indivíduo jaz na escuridão. Isso se chama ahaṁ mama (janasya moho ’yam ahaṁ mameti). Isso é ilusão. Todos devem abandonar esse conceito ilusório e, assim, tornarem-se cientes de tudo e plenamente.