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VERSO 34

reme tayā cātma-rata
ātmārāmo ’py akhaṇḍitaḥ
kāmināṁ darśayan dainyaṁ
strīṇāṁ caiva durātmatām

reme — Ele desfrutou; tayā — com Ela; ca — e; ātma-rataḥ — Ele que obtém prazer apenas dentro de Si mesmo; ātma-ārāmaḥ — completamen­te autossatisfeito; api — embora; akhaṇḍitaḥ — jamais incompleto; kā­minām — de homens luxuriosos comuns; darśayan — mostrando; dai­nyam — a condição degradada; strīṇām — de mulheres comuns; ca eva — também; durātmatām — a dureza de coração.

[Śukadeva Gosvāmī continuou:] O Senhor Kṛṣṇa desfrutou com aquela gopī, embora Ele, sendo autossatisfeito e completo em Si mesmo, desfrute apenas internamente. Dessa maneira, por contraste, Ele mostrou a desventura dos homens luxuriosos comuns e das mulheres duras de coração.

SIGNIFICADO—Este verso refuta diretamente a crítica superficial que os materia­listas às vezes dirigem contra os passatempos do Senhor Kṛṣṇa. O filósofo Aristóteles sustentava que as atividades ordinárias não são dignas de Deus, e, com esta ideia em mente, há quem declare que, como as atividades do Senhor Kṛṣṇa assemelham-se às atividades dos seres humanos ordinários, Ele não pode ser a Verdade Absoluta.

Neste verso, contudo, Śukadeva Gosvāmī salienta com toda a ênfase que o Senhor Kṛṣṇa age na plataforma liberada da autossatisfação es­piritual. Este fato é indicado aqui pelos termos ātma-rata, ātmārāma e akhaṇḍita. É inconcebível às pessoas comuns que um rapaz atrativo e uma bela jovem a desfrutarem de românticas aventuras conjugais ao luar da floresta possam estar ocupados em uma atividade pura, livre de desejo egoísta e de luxúria. Ainda assim, embora o Senhor Kṛṣṇa seja inconcebível às pessoas comuns, aqueles que O amam podem com­preender com facilidade a natureza pura e absoluta de Suas atividades.

Talvez alguém argumente que “a beleza está nos olhos de quem a vê” e que, portanto, os devotos de Kṛṣṇa estão apenas imaginando que as atividades do Senhor são puras. Esse argumento ignora muitos fatos significativos. Em primeiro lugar, o caminho da consciência de Kṛṣṇa, ou seja, do desenvolvimento de amor por Kṛṣṇa, exige que um devoto siga à risca quatro princípios reguladores: não ter relação sexual ilícita, não participar de jogos de azar, não se intoxicar e não comer carne, peixes nem ovos. Quando alguém se liberta da luxúria material e eleva-se à plataforma liberada, além do desejo material, ele compreende a beleza absoluta do Senhor Kṛṣṇa. Este processo não é teórico: ele tem sido praticado e concluído por muitos milhares de grandes sábios, que nos deixaram seu brilhante exemplo e seus luminosos ensinamentos sobre o caminho da consciência de Kṛṣṇa.

Sem dúvidas, a beleza está nos olhos de quem vê. Contudo, a ver­dadeira beleza é percebida pelo olho da alma, e não pelo olho luxu­rioso do corpo material. É por isso que a literatura védica enfatiza reiteradas vezes que apenas aqueles que se livraram do desejo material podem ver a beleza do Senhor Kṛṣṇa com o olho da alma pura, un­gido com o amor por Deus. Pode-se observar, por fim, que, ao com­preender os passatempos do Senhor Kṛṣṇa, a pessoa se liberta de todos os traços do desejo sexual, um estado de espírito que dificil­mente resultaria da meditação sobre aventuras sexuais materiais.

Uma nota final: Os passatempos conjugais de Kṛṣṇa constituem a plenitude perfeita de Sua qualificação como a Suprema Verdade Absoluta. O Vedānta afirma que a Verdade Absoluta é a fonte de tudo; logo, o Absoluto decerto não pode carecer de nenhuma das belas coisas deste mundo. É apenas porque as aventuras românticas exis­tem de forma pura e espiritual no Absoluto que elas podem manifestar-se de forma pervertida e material neste mundo. Portanto, a aparente beleza deste mundo não deve ser rejeitada de forma abso­luta; ao contrário, a beleza deve ser aceita em sua forma pura, es­piritual.

Desde o início dos tempos, homens e mulheres têm sido inspirados ao enlevo poético através da arte do romance. Infelizmente, o romance em geral neste mundo leva a um desapontamento esmagador, causado por uma mudança de atitude do coração ou pela morte. Assim, embora possamos considerar os casos românticos como sendo belos e prazerosos no início, eles acabam arruinados pelas investidas da natureza material. Toda­via, não é razoável rejeitar por completo o conceito de romance. Devemos, antes, aceitar a atração conjugal como ela existe em Deus, em sua forma absoluta, pura e perfeita, sem vestígio de luxúria ou egoísmo materiais. Esta atração conjugal pura – a suprema beleza e prazer da Verdade Suprema – é aquilo sobre o que estamos lendo aqui nas páginas do Śrīmad-Bhāgavatam.

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