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VERSO 50

yo ’syotprekṣaka ādi-madhya-nidhane yo ’vyakta-jīveśvaro
yaḥ sṛṣṭvedam anupraviśya ṛṣiṇā cakre puraḥ śāsti tāḥ
yaṁ sampadya jahāty ajām anuśayī suptaḥ kulāyaṁ yathā
taṁ kaivalya-nirasta-yonim abhayaṁ dhyāyed ajasraṁ harim

yaḥ — quem; asya — este (universo); utprekṣakaḥ — aquele que vigia; ādi — em seu começo; madhya — meio; nidhane — e fim; yaḥ — que; avyakta — do não-manifestado (a natureza material); jīva — e das entidades vivas; īśvaraḥ — o Senhor; yaḥ — que; sṛṣṭvā — tendo gerado; idam — este (universo); anupraviśya — entrando; ṛṣiṇā — juntamente com a alma jīva; cakre — produziu; puraḥ — corpos; śāsti — regula; tāḥ — a eles; yam — a quem; sampadya — por render-se; jahāti — abandona; ajām — o não-nascido (a natureza material); anuśayī — abraçando-a; suptaḥ — uma pessoa adormecida; kulāyam — seu corpo; yathā — como; tam — sobre Ele; kaivalya — por Sua condição puramente espiritual; nirasta — mantido afastado; yonim — o nascimento material; abhayam — para obter o destemor; dhyāyet — deve-se meditar; ajasram — incessantemente; harim — no Supremo Senhor Kṛṣṇa.

Ele é o Senhor que protege eternamente este universo, que existe antes, durante e depois de sua manifestação. Ele é o amo tanto da energia material imanifesta quanto da alma espiritual. Depois de gerar a criação, Ele entra nela, acompanhando cada entidade viva. Ali, Ele cria os corpos materiais e, então, permanece como seu regulador. Rendendo-se a Ele, pode-se escapar do abra­ço da ilusão, assim como uma pessoa ao sonhar esquece o próprio corpo. Quem deseja libertar-se do medo deve meditar incessantemente nEle, o Senhor Hari, que está sempre na plataforma da perfeição e, por isso, jamais Se sujeita ao nascimento material.

SIGNIFICADO—Por dirigir um olhar ao universo adormecido na ocasião de lançar as almas jīvas na criação, o Senhor Supremo provê todas as suas necessidades: Para aqueles seres vivos que são trabalhadores fruitivos, Ele provê a inteligência e sentidos necessários para lograr sucesso no trabalho material. Para aqueles que buscam conhecimento transcen­dental, Ele provê a inteligência pela qual eles podem fundir-se na refulgência espiritual de Deus, alcançando assim a liberação. E para os devotos, Ele provê a compreensão que os leva a Seu serviço devo­cional puro.

Para providenciar estas variadas facilidades, o Senhor impele a natureza material a começar o processo da evolução universal. Dessa maneira, o Senhor é nimitta-kāraṇam, ou a causa eficiente da criação. Ele é também upādāna-kāraam, a causa constituinte, uma vez que tudo emana dEle e apenas Ele está constantemente presente antes, durante e depois da manifestação do cosmos criado. O próprio Senhor Nā­rāyaṇa declara isso no Catuḥ-ślokī Bhāgavatam:

aham evāsam evāgre
nānyad yat sad-asat-param
paścād ahaṁ yad etac ca
yo ’vaśiṣyeta so ’smy aham

“Sou Eu, a Personalidade de Deus, que existia antes da criação, quando não havia nada além de Mim. Tampouco havia a natureza material, a causa desta criação. Aquilo que agora vês também sou Eu, a Personalidade de Deus, e, após a aniquilação, o que permane­cer também serei Eu, a Personalidade de Deus.” (Śrīmad-Bhāgavatam 2.9.33) A māyā primordial e a alma jīva podem merecer os títulos respectivos de causas upādāna e nimitta da criação em sentido relativo, mas o Senhor, afinal, é a origem de ambas.

Até escolher aceitar a misericórdia da Personalidade de Deus, a alma jīva está anuśayī, desamparadamente presa no abraço da ilusão. Quando se volta para a adoração ao Senhor, ela torna-se anuśayī em um sentido diferente: caída como uma vara para prestar reverências aos pés do Senhor. Por meio desta rendição, a alma tem facilidade de rechaçar a ilusão. Mesmo que a alma liberada pareça estar vivendo ainda em um corpo material, a ligação que aquela tem com este não passa de uma aparência externa; ela não lhe dispensa mais conside­ração do que um homem adormecido dispensa a seu corpo enquanto está muito ocupado e distante em seu mundo onírico.

A pessoa deixa a ignorância ao abandonar a identificação falsa com o próprio corpo material. Às vezes, alguém pode alcançar esse estado apenas através de um severo esforço que leva muitas vidas, mas, em alguns casos, o Senhor pode mostrar consideração especial por alguém que Ele favoreça, sem levar em conta o pouco crédito que aquela alma possa ter adquirido mediante a prática regulada. Con­forme as palavras de Śrī Bhīṣmadeva, yam iha nirīkṣya hatā gatāḥ svarūpam: “Aqueles que simplesmente viram Kṛṣṇa no Campo de Batalha de Kurukṣetra alcançaram suas formas originais depois de serem mortos.” (Śrīmad-Bhāgavatam 1.9.39) O fato de que até mesmo demônios como Agha, Baka e Keśī foram liberados pelo Senhor Kṛṣṇa sem terem executado nenhuma prática espiritual é uma indicação de Sua posição única como a original Personalidade de Deus. Sabendo disso, devemos deixar de lado todo medo e dúvida e nos entregarmos sem re­servas ao processo do serviço devocional.

Como palavras finais de seu comentário sobre este capítulo, Śrīla Śrīdhara Svāmī escreve:

sarva-śruti-śiro-ratna-
nīrājita-padāmbujam
bhoga-yoga-pradaṁ vande
mādhavam karmi-namrayoḥ

“Com sua refulgência, as principais joias entre todos os śrutis oferecem āratī aos pés de lótus do Senhor Mādhava. Presto homenagem a Ele, que concede o gozo material honrado pelos trabalhadores materiais e que também concede a ligação divina com Ele valorizada por aqueles que se prostram diante dEle com reverência.”

Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura também aproveita essa oportunidade para oferecer esta oração humilde:

he bhaktā dvāry ayaṁ cañcad-
vāladhī rauti vo manāk
prasādaṁ labhatāṁ yasmād
viśiṣṭaḥ śveva nāthati

“Ó devotos, esta pobre criatura está postada à vossa porta abanando o rabo e latindo. Por favor, dai-lhe alguma prasada para que ela possa tornar-se excepcional entre os cães e conseguir o melhor dos amos como seu dono.” Nesta passagem, o ācārya faz um troca­dilho com seu próprio nome: viś(iṣṭaḥ), “excepcional”; śva(iva), “como um cão”; nātha(ati), “sendo um amo”. Tal é a perfeição da humildade vaiṣṇava.

Neste ponto, encerram-se os significados apresentados pelos humildes servos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupāda referentes ao décimo canto, octogésimo sétimo capítulo do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “As Orações dos Vedas Personificados”.

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