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VERSO 35

bhagavān sarva-bhūteṣu
lakṣitaḥ svātmanā hariḥ
dṛśyair buddhy-ādibhir draṣṭā
lakṣaṇair anumāpakaiḥ

bhagavān — a Personalidade de Deus; sarva — todas; bhūteṣu — nas entidades vivas; lakṣitaḥ — é visível; sva-ātmanā — juntamente com o eu; hariḥ — o Senhor; dṛśyaiḥ — por aquilo que é visto; buddhi-ādibhiḥ — pela inteligência; draṣṭā alguém que vê; lakṣaṇaiḥ — por diferentes sinais; anumāpakaiḥ — pela hipótese.

A Personalidade de Deus, o Senhor Śrī Kṛṣṇa, está em todo ser vivo juntamente com a alma individual. E podemos perceber e admitir esse fato valendo-nos de nossa capacidade visual e de nossa inteligência.

SIGNIFICADO—O argumento geral do homem comum é que, se o Senhor não é visível a nossos olhos, como pode alguém render-se a Ele ou prestar-Lhe transcendental serviço amoroso? Para esse homem comum, Śrīla Śukadeva Gosvāmī apresenta aqui uma sugestão prática para que a pessoa saiba perceber o Senhor Supremo através da razão e da percepção. De fato, o Senhor não é percebido através de nossos sentidos materializados, mas, quando a pessoa adota na prática uma atitude de serviço que a torna convicta da presença do Senhor, ocorre uma revelação pela misericórdia do Senhor, e esse devoto puro do Senhor sempre pode perceber a presença do Senhor em toda parte. Ele consegue perceber que a inteligência está sob a direção de Paramātmā, a porção plenária da Personalidade de Deus. Mesmo o homem comum não terá muita dificuldade em compreender que Paramātmā faz companhia a todos. O procedimento é o seguinte. A pessoa pode perceber sua autoidentificação e sentir definitivamente que ela existe. Talvez ela não sinta isso muito abruptamente, mas, usando um pouco de inteligência, ela poderá sentir que não é o corpo. Ela pode sentir que a mão, a perna, a cabeça, o cabelo e os membros são todos suas partes integrantes corpóreas, mas, dentro desse contexto, a mão, a perna, a cabeça etc. não podem ser identificadas com o seu eu. Por isso, pelo simples fato de usar sua inteligência, ela pode distinguir e separar seu eu de outras coisas que vê. Logo, a conclusão natural é que o ser vivo, seja homem, seja animal selvagem, é o observador, e, além dele, ele vê todas as outras coisas. Então, há uma diferença entre o observador e aquilo que é observado. Agora, usando um pouco a inteligência, também podemos prontamente concordar que o ser vivo que com uma visão comum vê as coisas além de si mesmo não tem poder de ver ou mover-se de maneira independente. Todas as nossas ações e percepções corriqueiras dependem de várias formas de energia que a natureza nos fornece em várias combinações. Nossos sentidos de percepção e ação, quer dizer, nossos cinco sentidos de percepção, que são a (1) audição, (2) o tato, (3) a visão, (4) o paladar e (5) o olfato, bem como nossos cinco sentidos de ação, a saber, (1) mãos, (2) pernas, (3) fala, (4) órgãos de evacuação e (5) órgãos reprodutivos, e também nossos três sentidos sutis, ou seja (1) mente, (2) inteligência e (3) ego (treze sentidos ao todo), nos são fornecidos pelos vários arranjos das formas grosseiras ou sutis da energia natural. E é igualmente evidente que os objetos de nossa percepção não passam de produtos das inexauríveis permutas e combinações das formas que a energia natural assume. Como isso prova conclusivamente que o ser vivo comum não tem sob sua dependência o poder de percepção ou de movimento, e como sentimos indubitavelmente nossa existência sendo condicionada pela energia da natureza, concluímos que aquele que vê é o espírito, e que os sentidos, bem como os objetos da percepção, são materiais. A qualidade espiritual do observador manifesta-se em nossa insatisfação com o estado limitado da existência materialmente condicionada. Essa é a diferença entre o espírito e a matéria. Existem alguns argumentos menos inteligentes de que a matéria desenvolve o poder da visão e movimento como um certo desenvolvimento orgânico, mas esse argumento não pode ser aceito porque não há nenhuma evidência experimental de que a matéria tenha alguma vez produzido uma entidade viva. Não confie em promessas futuras, por mais agradáveis que pareçam. Conversas fiadas sobre o futuro desenvolvimento da matéria em espírito são realmente bobagem, pois, em nenhuma parte do mundo, a matéria alguma vez desenvolveu o poder de ver ou mover-se. Definitivamente, a matéria e o espírito são duas identidades diferentes, e tira essa conclusão quem usa a inteligência. Agora chegamos ao ponto de que as coisas que são vistas por um pouco de uso da inteligência não podem ser animadas a não ser que aceitemos que alguém usa ou coordena a inteligência. A inteligência orienta a pessoa como uma espécie de autoridade superior, e, sem o uso da inteligência, o ser vivo não pode ver ou mover-se ou comer ou fazer qualquer coisa. Quando deixa de tirar proveito da inteligência, o indivíduo torna-se um demente. Assim sendo, o ser vivo é dependente da inteligência ou da orientação de um ser superior. Essa inteligência é onipenetrante. Todo ser vivo tem sua inteligência, e essa inteligência, sendo a orientação de alguma autoridade superior, é como o pai que dá orientação ao seu filho. A autoridade superior, que está presente e reside dentro de cada ser vivo individual, é o Supereu.

Neste ponto de nossa investigação, podemos considerar a seguinte questão: Por um lado, compreendemos que todas as nossas percepções e atividades são condicionadas pelos arranjos da natureza material; por outro, também é rotineiro sentirmos e dizermos: “Estou percebendo” ou “Estou fazendo”. Portanto, podemos dizer que nossos sentidos materiais de percepção e ação estão se movendo porque identificamos o eu com o corpo material, e que o princípio superior, o Supereu, está nos orientando e suprindo de acordo com nosso desejo. Tirando proveito da orientação do Supereu na forma da inteligência, podemos continuar a estudar e colocar em prática nossa conclusão de que “eu não sou este corpo”, ou podemos escolher permanecer com a falsa identificação material, fantasiando-nos de proprietários e autores. Nossa liberdade consiste em orientar nosso desejo para a ignorante e errônea concepção material ou para a verdadeira concepção espiritual. Podemos facilmente alcançar a verdadeira concepção espiritual, reconhecendo o Supereu (Paramātmā) como nosso amigo e guia e harmonizando nossa inteligência com a inteligência superior do Paramātmā. O Supereu e o eu individual são espírito, de modo que o Supereu e o eu individual são qualitativamente unos e distintos da matéria. Mas o Supereu e o eu individual não podem estar em nível de igualdade porque o Supereu dá orientação e inteligência, e o eu individual segue a orientação, e assim as ações são adequadamente realizadas. O indivíduo é inteiramente dependente da orientação do Supereu porque, a cada passo, o eu individual segue tudo o que o Supereu determina o que ele deve ver, ouvir, pensar, sentir, querer etc.

No que diz respeito a bom senso, chegamos à conclusão de que existem três identidades, a saber, matéria, espírito e Superespírito. Se nos dirigimos agora à Bhagavad-gītā, ou à inteligência védica, podemos entender com maior profundidade que todas as três identidades, a saber, matéria, espírito individual e o Superespírito, são todos dependentes da Suprema Personalidade de Deus. O Supereu é uma representação parcial ou uma porção plenária da Suprema Personalidade de Deus. A Bhagavad-gītā afirma que, através apenas de Sua representação parcial, a Suprema Personalidade de Deus exerce domínio sobre todo o mundo material. Deus é grande, e não pode ser um simples supridor dos pedidos dos eus individuais; portanto, o Supereu não pode ser uma completa representação do Eu Supremo, Puruṣottama, a Personalidade de Deus Absoluta. O fato de o eu individual compreender o Supereu indica que ele está no começo da autorrealização, e, progredindo nessa autorrealização, ele é capaz de compreender a Suprema Personalidade de Deus através da inteligência, através da ajuda das escrituras reveladas e, principalmente, através da graça do Senhor. A Bhagavad-gītā é a concepção preliminar acerca da Suprema Personalidade de Deus Śrī Kṛṣṇa, e o Śrīmad-Bhāgavatam é a continuação da explicação da ciência do Supremo. Assim, se nos fixarmos à nossa determinação e orarmos pela misericórdia do diretor da inteligência que está situado dentro da mesma árvore corpórea, assim como um pássaro pousa com outro pássaro (como explicado nas Upaniṣads), na certa o significado da informação revelada nos Vedas se tornará claro à nossa visão, e não haverá dificuldade em compreender a Suprema Personalidade de Deus, Vāsudeva. O homem inteligente, portanto, depois de muitos nascimentos com essa capacidade de usar a inteligência, rende-se aos pés de lótus de Vāsudeva, como confirma a Bhagavad-gītā (7.19).

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