CAPÍTULO SEIS
As Atividades do Senhor Ṛṣabhadeva
Este capítulo conta como o Senhor Ṛṣabhadeva deixou Seu corpo. Ele não estava apegado a Seu corpo mesmo quando este estava sendo queimado em um incêndio na floresta. Quando a semente das atividades fruitivas é queimada pelo fogo do conhecimento, o caráter espiritual e os poderes místicos manifestam-se automaticamente, mas esses poderes místicos não afetam o bhakti-yoga. Porque o yogī comum se deixa cativar pelos poderes místicos, ele não progride; portanto, o yogī perfeito não os vê com bons olhos. Por ser inquieta e insegura, a mente deve permanecer sempre sob controle. Mesmo a mente do avançado yogī Saubhari criou tanta perturbação que perdeu seus poderes ióguicos místicos. Devido à mente inquieta, mesmo um yogī avançadíssimo pode cair. A mente é tão inquieta que induz até mesmo um yogī perfeito a ser controlado pelos sentidos. Portanto, o Senhor Ṛṣabhadeva, com o propósito de instruir todos os yogīs, mostrou como devemos abandonar o corpo. Enquanto viajava pelo sul da Índia, pelas províncias de Karṇāṭa, Koṅka, Veṅka e Kuṭaka, o Senhor Ṛṣabhadeva chegou aos entornos de Kuṭakācala. Subitamente, houve um incêndio florestal que incinerou a floresta e o corpo do Senhor Ṛṣabhadeva. O rei de Koṅka, Veṅka e Kuṭaka conhecia os passatempos em que o Senhor Ṛṣabhadeva agia como uma alma liberada. O nome desse rei era Arhat. Mais tarde, ele se deixou cativar pela energia ilusória, e foi nessa condição que ele estabeleceu os princípios básicos do jainismo. O Senhor Ṛṣabhadeva expôs os princípios religiosos que podem libertar-nos do cativeiro material, e exterminou toda espécie de atividades ateístas. Neste planeta Terra, a região conhecida como Bhārata-varṣa era muito piedosa, pois foi onde o Senhor Supremo apareceu sempre que desejou encarnar.
O Senhor Ṛṣabhadeva não deu qualquer importância aos poderes místicos pelos quais os yogīs comuns anseiam. Devido à beleza do serviço devocional, os devotos não têm qualquer interesse no dito poder místico. O mestre de todo poder ióguico, o Senhor Kṛṣṇa, pode, em benefício de Seu devoto, manifestar todos os poderes. O serviço devocional é mais valioso do que os poderes do yoga místico. Devotos que são às vezes desencaminhados aspiram à liberação e aos poderes místicos. O Senhor Supremo confere a esses devotos tudo o que desejam, mas eles não podem alcançar a meta mais importante: o serviço devocional. O serviço devocional ao Senhor é garantido àqueles que não desejam a liberação nem o poder místico.
VERSO 1: O rei Parīkṣit perguntou a Śukadeva Gosvāmī: Meu querido senhor, para aqueles que são completamente puros de coração, o conhecimento é obtido através da prática de bhakti-yoga, e o apego às atividades fruitivas é completamente reduzido a cinzas. Para essas pessoas, os poderes do yoga místico surgem automaticamente e não lhes causam aflição. Por que, então, o Senhor Ṛṣabhadeva os negligenciou?
VERSO 2: Śrīla Śukadeva Gosvāmī respondeu: Meu querido rei, falaste as palavras corretas. Contudo, após capturar um animal, o caçador astuto não confia nele, pois ele pode escapar. Assim também, aqueles que são avançados na vida espiritual não confiam na mente. Na verdade, eles sempre permanecem vigilantes e observam as atividades mentais.
VERSO 3: Todos os estudiosos eruditos deram sua opinião. A mente é por natureza muito inquieta, e não devemos fazer amizade com ela. Se depositarmos plena confiança na mente, ela poderá enganar-nos a qualquer momento. Mesmo o senhor Śiva ficou agitado ao ver a forma Mohinī do Senhor Kṛṣṇa, e Saubhari Muni também caiu da fase madura de perfeição ióguica.
VERSO 4: Uma mulher incasta é muito facilmente levada por amantes, e, algumas vezes, ocorre que seu esposo é violentamente morto pelos seus amantes. Se o yogī concede uma oportunidade à sua mente e não a restringe, sua mente atrairá os inimigos, tais como a luxúria, a ira e a cobiça, os quais, sem dúvida alguma, matarão o yogī.
VERSO 5: A mente é a causa fundamental da luxúria, ira, orgulho, cobiça, lamentação, ilusão e medo, os quais, combinados, constituem o cativeiro às atividades fruitivas. Que homem erudito depositaria fé na mente?
VERSO 6: O Senhor Ṛṣabhadeva era o líder de todos os reis e imperadores deste universo, mas, assumindo a vestimenta e linguagem de um avadhūta, Ele agia como se fosse um tolo enredado materialmente. Por conseguinte, ninguém podia observar Sua opulência divina. Ele adotou esse comportamento apenas para ensinar aos yogīs como abandonar o corpo. Todavia, Ele mantinha Sua posição original como uma expansão plenária do Senhor Vāsudeva, Kṛṣṇa. Mantendo sempre essa atitude, Ele abandonou Seus passatempos em que, dentro do mundo material, agia como o Senhor Ṛṣabhadeva. Quem, seguindo os passos do Senhor Ṛṣabhadeva, consegue abandonar seu corpo sutil, elimina por completo a possibilidade de aceitar novamente um corpo material.
VERSO 7: Na verdade, o Senhor Ṛṣabhadeva não tinha um corpo material, mas, devido a yoga-māyā, Ele considerava Seu corpo como sendo material e, portanto, porque agia como um ser humano comum, Ele abandonou a mentalidade de identificar-Se com o corpo. Seguindo esse princípio, Ele começou a vagar pelo mundo inteiro. Enquanto viajava, Ele chegou à província de Karṇāṭa, no sul da Índia, e passou por Koṅka, Veṅka e Kuṭaka. Ele não planejava essas viagens, mas chegou perto de Kuṭakācala, onde adentrou uma floresta. Colocando pedras dentro de Sua boca, Ele, desnudo e com Seu cabelo desgrenhado, o que O fazia parecer um louco, colocou-Se a caminhar pela floresta.
VERSO 8: Enquanto Ele estava vagando de uma região a outra, irrompeu um grande incêndio florestal, causado pela fricção de bambus, que estavam sendo agitados pelo vento. Nesse incêndio, toda a floresta localizada perto de Kuṭakācala e o corpo do Senhor Ṛṣabhadeva foram reduzidos a cinzas.
VERSO 9: Śukadeva Gosvāmī continuou a falar a Mahārāja Parīkṣit: Meu querido rei, o rei de Koṅka, Veṅka e Kuṭaka, chamado Arhat, tomou conhecimento das atividades de Ṛṣabhadeva e, imitando os princípios de Ṛṣabhadeva, introduziu um novo sistema de religião. Aproveitando-se de Kali-yuga, a era das atividades pecaminosas, o rei Arhat, estando confuso, abandonou os princípios védicos, que são livres de qualquer perigo, e inventou um novo sistema de religião que conflita com os Vedas. Esse foi o início do dharma jainista. Muitas outras ditas religiões apareceram com base nesse sistema ateísta.
VERSO 10: Os mais baixos da humanidade e que se deixam confundir pela energia ilusória do Senhor Supremo abandonarão o varṇāśrama-dharma original e suas regras e regulações. Eles deixarão de tomar os três banhos diários e de adorar o Senhor. Rejeitando a limpeza e negligenciando o Senhor Supremo, eles aceitarão princípios disparatados. Não se banhando ou lavando a boca regularmente, eles permanecerão sempre sujos e arrancarão seus cabelos. Seguindo uma religião inventada, eles florescerão. Durante esta era de Kali, as pessoas são mais propensas aos sistemas irreligiosos. Em consequência disso, essas pessoas naturalmente ridicularizarão a autoridade védica, os seguidores da autoridade védica, os brāhmaṇas, a Suprema Personalidade de Deus e os devotos.
VERSO 11: Devido à sua imensa ignorância, pessoas de classe inferior introduzem sistemas de religião que se desviam dos princípios védicos. Seguindo suas próprias invenções mentais, elas automaticamente caem nas mais tenebrosas regiões da existência.
VERSO 12: Nesta era de Kali, as pessoas estão dominadas pelos modos da paixão e da ignorância. O Senhor Ṛṣabhadeva encarnou para libertá-las das garras de māyā.
VERSO 13: Com as seguintes palavras, os sábios eruditos cantam as qualidades transcendentais do Senhor Ṛṣabhadeva: “Oh! Este planeta terrestre contém sete mares e muitas ilhas e territórios, dentre os quais Bhārata-varṣa é considerada a região mais piedosa! Os residentes de Bhārata-varṣa estão habituados a glorificar as atividades da Suprema Personalidade de Deus em Suas encarnações como o Senhor Ṛṣabhadeva e outros. Todas essas atividades são muito auspiciosas para o bem-estar da humanidade.”
VERSO 14: “Oh! O que direi da dinastia de Priyavrata, que é pura e muitíssimo célebre? Nessa dinastia, a Pessoa Suprema, a original Personalidade de Deus, desceu como uma encarnação e praticou princípios religiosos que podiam libertar o mundo inteiro dos resultados das atividades fruitivas.”
VERSO 15: “Quem é o yogī místico que, mesmo com sua mente, pode seguir os exemplos do Senhor Ṛṣabhadeva? O Senhor Ṛṣabhadeva rejeitou toda espécie de perfeições ióguicas, as quais outros yogīs anseiam por alcançar. Quem é o yogī que pode se comparar ao Senhor Ṛṣabhadeva?”
VERSO 16: Śukadeva Gosvāmī prosseguiu: O Senhor Ṛṣabhadeva é o mestre de todo o conhecimento védico, dos seres humanos, dos semideuses, das vacas e dos brāhmaṇas. Já expliquei Suas atividades puras e transcendentais, que aniquilarão as atividades pecaminosas de todas as entidades vivas. Esta narração dos passatempos do Senhor Ṛṣabhadeva é o reservatório de tudo o que é auspicioso. Qualquer pessoa que, seguindo os passos dos ācāryas, ouça-os ou comente-os com atenção, certamente alcançará imaculado serviço devocional aos pés de lótus do Senhor Vāsudeva, a Suprema Personalidade de Deus.
VERSO 17: A fim de aliviar-se das várias tribulações da existência material, os devotos sempre se banham no serviço devocional. Fazendo isso, eles desfrutam da bem-aventurança suprema, e a liberação personificada vem servi-los. Todavia, eles não aceitam o serviço dela, mesmo que seja oferecido pela Suprema Personalidade de Deus em pessoa. Para os devotos, a liberação [mukti] não tem muita importância porque, tendo obtido o transcendental serviço amoroso ao Senhor, conseguiram tudo o que é desejável e transcenderam todos os desejos materiais.
VERSO 18: Śukadeva Gosvāmī continuou: Meu querido rei, a Pessoa Suprema, Mukunda, é realmente o mantenedor de todos os membros das dinastias Pāṇḍava e Yadu. Ele é teu mestre espiritual, Deidade adorável, amigo e dirigente de tuas atividades. Como se isso não bastasse, Ele às vezes serve à tua família como um mensageiro ou servo. Isso significa que Ele agiu do mesmíssimo modo que os servos comuns. Aqueles que estão ocupados em obter o favor do Senhor têm muita facilidade para receber dEle a liberação, mas Ele não concede muito facilmente a oportunidade de se prestar serviço direto a Ele.
VERSO 19: A Suprema Personalidade de Deus, o Senhor Ṛṣabhadeva, conhecia na íntegra Sua verdadeira identidade; portanto, Ele era autossuficiente e não desejava gozo externo. Como era completo em Si mesmo, Ele não sentia nenhuma necessidade de sucesso. Aqueles que se ocupam inutilmente em conceitos corpóreos e criam uma atmosfera de materialismo sempre ignoram seu verdadeiro interesse pessoal. Por Sua misericórdia imotivada, o Senhor Ṛṣabhadeva ensinou a verdadeira identidade do eu e a meta da vida. Portanto, oferecemos nossas respeitosas reverências ao Senhor, que apareceu como o Senhor Ṛṣabhadeva.