VERSO 3
sa cāhaṁ vitta-lobhena
pratyācakṣe kathaṁ dvijam
pratiśrutya dadāmīti
prāhrādiḥ kitavo yathā
saḥ — uma pessoa como eu; ca — também; aham — sou; vitta-lobhena — deixando-me encantar pela cobiça de se obter dinheiro; pratyācakṣe — enganarei ou direi não após ter dito sim; katham — como; dvijam — especialmente a um brāhmaṇa; pratiśrutya — depois de já ter prometido; dadāmi — que dares; iti — assim; prāhrādiḥ — eu, que sou famoso como o neto de Mahārāja Prahlāda; kitavaḥ — um trapaceiro ordinário; yathā — tal qual.
Sou neto de Mahārāja Prahlāda. Como é que eu, movido pela cobiça de obter dinheiro, poderia retirar minha promessa depois de ter dito que daria esta terra? Como posso, diante de um brāhmaṇa, comportar-me como um trapaceiro ordinário?
SIGNIFICADO—Bali Mahārāja já fora abençoado por seu avô, Prahlāda Mahārāja. Portanto, ele era um devoto puro, embora nascido em família de demônios. Existem duas classes de devotos de alta categoria, chamados sādhana-siddha e kṛpā-siddha. Sādhana-siddha refere-se a alguém que se tornou devoto através da execução regular dos princípios reguladores mencionados nos śāstras, conforme a ordem e orientação do mestre espiritual. Se alguém executa regularmente esse serviço devocional, decerto alcança a perfeição no decorrer do tempo. Todavia, existem outros devotos que, embora não tenham se submetido a todas as formalidades requeridas no serviço devocional, recebem a misericórdia especial do guru e de Kṛṣṇa – o mestre espiritual e a Suprema Personalidade de Deus – e alcançam imediatamente a perfeição do serviço devocional puro. Exemplos dessa classe de devotos são as yajña-patnīs, Mahārāja Bali e Śukadeva Gosvāmī. As yajña-patnīs eram esposas de brāhmaṇas comuns ocupados em atividades fruitivas. Embora fossem muito eruditos e avançados em conhecimento védico, os brāhmaṇas não puderam alcançar a misericórdia de Kṛṣṇa-Balarāma, ao passo que suas esposas obtiveram a completa perfeição no serviço devocional, apesar de serem mulheres. Igualmente, Vairocani, Bali Mahārāja, recebeu a misericórdia de Prahlāda Mahārāja e, pela misericórdia de Prahlāda Mahārāja, também recebeu a misericórdia do Senhor Viṣṇu, que apareceu diante dele sob a forma de um brahmacārī pedinte. Assim, devido à misericórdia especial do guru e de Kṛṣṇa, Bali Mahārāja se tornou um kṛpā-siddha. Caitanya Mahāprabhu confirma esse favor: guru-kṛṣṇaprasāde pāya bhakti-latā-bīja. (Caitanya-caritāmṛta, Madhya 19.151) Bali Mahārāja, pela graça de Prahlāda Mahārāja, obteve a semente do serviço devocional e, quando essa semente se desenvolveu, ele colheu o fruto maduro desse serviço, a saber, amor ao Supremo (premā pum-artho mahān), no mesmo instante em que o Senhor Vāmanadeva apareceu. Bali Mahārāja mantinha sua devoção regular pelo Senhor, e, porque se purificara, o Senhor apareceu diante dele. Devido ao amor imaculado pelo Senhor, então, ele logo decidiu: “Devo dar a este pequeno brāhmaṇa anão tudo o que Ele me pedir.” Isso é sinal de amor. Portanto, Bali Mahārāja é tido como alguém que, através de misericórdia especial, atingiu a perfeição máxima do serviço devocional.