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VERSO 102

eta śuni’ hāsi’ prabhu balilā vacana
duḥkha nā mānaha yadi, kari nivedana

eta assim; śuni’ ouvindo; hāsi’ sorrindo; prabhu o Senhor Caitanya Mahāprabhu; balilā disse; vacana Suas palavras; duḥkha — infelizes; não; mānaha — aceitais isso; yadi se; kari Eu disser; nivedana — algo a vós.

Após ouvir os sannyāsīs māyāvādīs falarem daquela maneira, o Senhor Caitanya Mahāprabhu sorriu levemente e disse: “Meus queridos senhores, se não vos importardes, posso dizer-vos algo a respeito da filosofia vedānta.”

SIGNIFICADO—Os sannyāsīs māyāvādīs, apreciando o Senhor Caitanya Mahāprabhu, perguntaram-Lhe por que Ele não discutia a filosofia vedānta. Na realidade, contudo, todo o sistema de atividades vaiṣṇavas baseia-se na filosofia vedānta. Os vaiṣṇavas não negligenciam o Vedānta, mas não aceitam a compreensão do Vedānta com base no comentário Śārīraka-bhāṣya. Portanto, para esclarecer a situação, o Senhor Śrī Caitanya Mahāprabhu, com a permissão dos sannyāsīs māyāvādīs, desejou falar a respeito da filosofia vedānta.

Os vaiṣṇavas são indiscutivelmente os maiores filósofos do mundo, e, dentre eles, o maior foi Śrīla Jīva Gosvāmī Prabhu, cuja filosofia foi novamente apresentada, cerca de quatrocentos anos mais tarde, por Śrīla Bhaktisiddhānta Sarasvatī Ṭhākura Mahārāja. Portanto, é preciso entender muito bem que os filósofos vaiṣṇavas não são sentimentalistas ou devotos baratos como os sahajiyās. Todos os ācāryas vaiṣṇavas eram acadêmicos vastamente eruditos que compreendiam a filosofia vedānta plenamente, pois, a menos que se conheça a filosofia vedānta, não se pode ser um ācārya. Para ser aceito como ācārya entre transcendentalistas indianos que seguem os princípios védicos, é preciso tornar-se um estudioso vastamente erudito na filosofia vedānta, quer por estudá-la, quer por ouvi-la.

Bhakti desenvolve-se de acordo com a filosofia vedānta. Afirma-se isto no Śrīmad-Bhāgavatam (1.2.12):

tac chraddadhāna munayo
jñāna-vairāgya-yuktayā
paśyanty ātmani cātmānaṁ
bhaktyā śruta-gṛhītayā

As palavras bhaktyā śruta-gṛhītayā neste verso são muito importantes, pois indicam que bhakti deve basear-se na filosofia das Upaniṣads e do Vedānta-sūtra. Śrīla Rūpa Gosvāmī disse:

śruti-smṛti-purāṇādi-
pañcarātra-vidhiṁ vinā
aikāntikī harer bhaktir
utpātāyaiva kalpate

“Deve-se considerar o serviço devocional executado sem referência aos Vedas, Purāṇas, Pañcarātras, etc., como sentimentalismo, que só faz perturbar a sociedade.” Há diferentes classes de vaiṣṇavas (kaniṣṭha-adhikārī, madhyama-adhikārī, uttama-adhikārī), mas, para ser um pregador madhyama-adhikārī, é preciso ser um estudioso erudito do Vedānta-sūtra e de outros textos védicos, pois o bhakti-yoga que se desenvolve com base na filosofia vedānta é concreto e firme. A esse respeito, podemos citar a tradução e o significado do verso supramencionado (Śrīmad-Bhāgavatam, 1.2.12):

TRADUÇÃO

O estudante ou sábio seriamente inquisitivo, bem equipado de conhecimento e desapego, compreende esta Verdade Absoluta prestando serviço devocional, de acordo com o que ouviu do Vedānta-śruti.

SIGNIFICADO

A Verdade Absoluta é compreendida completamente através do processo de serviço devocional ao Senhor, Vāsudeva, ou a Personalidade de Deus, que é a Verdade Absoluta completa. Brahman é Sua refulgência corpórea transcendental, e Paramātmā é Sua representação parcial. Assim, as compreensões Brahman e Paramātmā da Verdade Absoluta são apenas compreensões parciais. Há quatro diferentes tipos de seres humanos – os karmīs, os jñānīs, os yogīs e os devotos. Os karmīs são materialistas, ao passo que os outros três são transcendentais. Os transcendentalistas de primeira classe são os devotos que compreendem a Pessoa Suprema. Transcendentalistas de segunda classe são aqueles que compreendem parcialmente a porção plenária da pessoa absoluta. E transcendentalistas de terceira classe são os que compreendem mal o foco espiritual da pessoa absoluta. Como se afirma na Bhagavad-gītā e em outras obras védicas, a Pessoa Suprema é compreendida através do serviço devocional, que é seguido de conhecimento pleno e desapego do contato com a matéria. Assim como as compreensões Brahman e Paramātmā são percepções imperfeitas da Verdade Absoluta, da mesma forma, os meios de compreender Brahman e Paramātmā, isto é, os caminhos de jñāna e yoga, são também meios imperfeitos de compreender a Verdade Absoluta. O serviço devocional, que se baseia no plano do conhecimento pleno, combinado com o desapego do contato com a matéria, e que se fixa através da recepção auditiva do Vedānta-śruti, é o único método perfeito pelo qual o estudante seriamente inquisitivo pode compreender a Verdade Absoluta. O serviço devocional não se destina, portanto, à classe menos inteligente de transcendentalistas.

Há três classes de devotos, a saber, os de primeira, segunda e terceira classes. Os devotos de terceira classe, ou os neófitos, que não têm conhecimento e não são desapegados do contato com a matéria, mas que estão simplesmente atraídos pelo processo preliminar de adorar a Deidade no templo, são chamados devotos materiais. Os devotos materiais são mais apegados ao benefício material do que ao proveito transcendental. Portanto, tem-se que progredir definitivamente da posição de serviço devocional material à posição devocional de segunda classe. Na posição de segunda classe, o devoto pode discriminar quatro princípios na linha devocional, a saber, a Personalidade de Deus, Seus devotos, o ignorante e o invejoso. Temos que nos elevar pelo menos à fase de devoto de segunda classe e tornarmo-nos, assim, aptos para conhecer a Verdade Absoluta.

Um devoto de terceira classe, portanto, tem de receber as instruções sobre o serviço devocional a partir das fontes autorizadas do Bhāgavatam. O Bhāgavatam número um é a personalidade estabelecida do devoto, e o outro Bhāgavatam é a mensagem do Supremo. O devoto de terceira classe, portanto, tem que se dirigir à personalidade do devoto a fim de aprender as instruções sobre o serviço devocional. Essa personalidade do devoto não é um profissional que ganha a vida recitando o Bhāgavatam. Tal devoto tem que ser um representante de Śukadeva Gosvāmī, como Sūta Gosvāmī, e tem que pregar o culto do serviço devocional para o completo benefício de todos. Um devoto neófito tem pouquíssimo gosto por ouvir das autoridades. Esse devoto neófito faz ostentação de ouvir de um profissional para satisfazer seus sentidos. Essa espécie de ouvir e cantar estraga tudo, de modo que devemos ter muito cuidado com este processo defeituoso. As mensagens sagradas do Supremo, como são transmitidas na Bhagavad-gītā ou no Śrīmad-Bhāgavatam, são indubitavelmente temas transcendentais, mas, mesmo que o sejam, tais assuntos transcendentais não devem ser recebidos de um profissional, que os estrague assim como a serpente estraga o leite com o simples toque de sua língua.

Um devoto sincero deve, portanto, estar preparado para ouvir a literatura védica, como as Upaniṣads, o Vedānta e outras obras, legadas pelos Gosvāmīs ou autoridades anteriores, para o benefício de seu progresso. E, sem ouvir e seguir as instruções, o espetáculo de serviço devocional torna-se inútil e, por conseguinte, um tipo de perturbação no caminho do serviço devocional. Portanto, a menos que o serviço devocional seja estabelecido com base nos princípios das autoridades de śruti, smṛti, purāṇa ou pañcarātra, a exibição de serviço devocional deve ser imediatamente rejeitada. Um devoto não autorizado não deve de forma alguma ser reconhecido como devoto puro. Pela assimilação de tais mensagens das obras védicas, podemos ver constantemente o aspecto localizado e onipenetrante da Personalidade de Deus dentro de nós mesmos. Isso se chama samādhi.

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