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CAPÍTULO SETENTA E CINCO

Duryodhana Humilhado

Este capítulo descreve a gloriosa conclusão do sacrifício Rājasūya e a humilhação que o príncipe Duryodhana passou no palácio do rei Yudhiṣṭhira.

Por ocasião do sacrifício Rājasūya do rei Yudhiṣṭhira, muitos de seus parentes e benquerentes se esforçaram em agradar-lhe com a prestação de serviços necessários. Quando o sacrifício terminou, o rei adornou os sacerdotes, os membros ilustres da assembleia e seus próprios parentes com pasta aromática de sândalo, guirlandas de flores e roupas finas. Então, foram todos para as margens do Ganges realizar o banho ritualístico que marca o fim do período de iniciação do patrocinador do sacrifício. Antes do banho final, houve muito di­vertimento no rio entre os homens e mulheres participantes. Borrifadas com água aromática e outros líquidos, Draupadī e as outras damas pareciam muito belas, com seus rostos brilhantes a realçar­-lhes o riso tímido.

Depois que os sacerdotes tinham executado os rituais finais, o rei e sua rainha, Śrīmatī Draupadī, banharam-se no Ganges. Em segui­da, todos os presentes que pertenciam às ordens do varṇāśrama se banharam. Yudhiṣṭhira vestiu roupas novas e adorou os brāhmaṇas eruditos, sua família, amigos e benquerentes conforme convinha a cada um, e ofereceu a todos eles vários presentes. Os hóspedes, então, partiram para suas casas. O rei Yudhiṣṭhira, no entanto, estava tão ansioso por causa da iminente separação daqueles que lhe eram queridos que obrigou muitos dos parentes e amigos mais próximos, inclusive o Senhor Kṛṣṇa, a ficarem em Indraprastha mais algum tempo.

O palácio real do rei Yudhiṣṭhira fora construído por Maya Dānava, que o dotara de muitas características e opulências maravilhosas. O rei Duryodhana ardeu de inveja quando viu essas riquezas. Certo dia, Yudhiṣṭhira estava sentado com o Senhor Kṛṣṇa em seu salão de assembleias real. Auxiliado por seus subordinados e familiares, ele ma­nifestava magnificência igual à do senhor Indra. Naquele momento, Duryodhana, mal-humorado, entrou no salão. Enganado pela habi­lidade mística de Maya Dānava, Duryodhana confundiu uma parte do assoalho com água e, por isso, levantou sua roupa, ao passo que, em outro lugar, caiu na água, pensando que era o piso sólido. Ao verem isso, Bhīmasena, as mulheres da corte e os príncipes presentes começaram a rir. Embora Mahārāja Yudhiṣṭhira tentasse impedi-los de rir, o Senhor Kṛṣṇa incentivou o riso deles. Em completo embaraço, Du­ryodhana saiu furioso do salão de assembleias e partiu imediatamente para Hastināpura.

VERSOS 1-2: Mahārāja Parīkṣit disse: Ó brāhmaṇa, segundo o que ouvi de ti, todos os reis, sábios e semideuses reunidos se deleitaram ao ver as maravilhosas festividades do sacrifício Rājasūya do rei Ajātaśatru, sendo Duryodhana a única excessão. Por favor, conta­-me o motivo disso, meu senhor.

VERSO 3: Śrī Bādarāyaṇi disse: No sacrifício Rājasūya de teu santo avô, os membros da família deste, atados por seu amor a ele, ocupa­ram-se em ajudá-lo prestando diversos serviços humildes.

VERSOS 4-7: Bhīma supervisionou a cozinha, Duryodhana encarregou-se da tesouraria, enquanto Sahadeva recebeu respeitosamente os hós­pedes que chegavam. Nakula providenciou os objetos necessá­rios, Arjuna atendeu os respeitáveis anciãos, e Kṛṣṇa lavou os pés de todos, enquanto Draupadī serviu a comida, e o generoso Karṇa distribuiu os presentes. Muitos outros, tais como Yuyu­dhāna, Vikarṇa, Hārdikya, Vidura, Bhūriśravā e outros filhos de Bāhlīka, e Santardana, também se ofereceram para realizar várias tarefas durante o primoroso sacrifício. Eles fizeram isso por causa de sua avidez por agradar Mahārāja Yudhiṣṭhira, ó melhor dos reis.

VERSO 8: Depois que os sacerdotes, os ilustres delegados, os eruditíssi­mos santos e os mais íntimos benquerentes do rei haviam todos recebido as devidas honras sob a forma de palavras agradáveis, oferendas auspiciosas e vários presentes como remuneração, e depois que o rei de Cedi imergira nos pés de lótus do Senhor dos Sātvatas, realizou-se, então, o banho avabhṛtha no divino rio Ya­munā.

VERSO 9: Durante a celebração do avabhṛtha, ressoou a música de muitas espécies de instrumentos, tais como mṛdaṅgas, búzios, paṇavas, dhundhuris, timbales e chifres gomukhas.

VERSO 10: Dançarinas bailavam em grande júbilo, e coros cantavam, en­quanto as altas vibrações de vīṇās, flautas e címbalos de mão che­gavam até as regiões celestes.

VERSO 11: Todos os reis, usando colares de ouro, partiram, então, para o Yamunā. Eles levavam bandeiras e flâmulas de várias cores e estavam acompanhados de soldados de infantaria e soldados bem enfeitados sobre elefantes majestosos, quadrigas e ca­valos.

VERSO 12: Os exércitos reunidos dos Yadus, Sṛñjayas, Kāmbojas, Kurus, Kekayas e Kośalas faziam tremer a terra enquanto seguiam em procissão Yudhiṣṭhira Mahārāja, o realizador do sacrifício.

VERSO 13: Os dirigentes da assembleia, os sacerdotes e outros excelentes brāhmaṇas vibravam com retumbância os mantras védicos, enquanto os semideuses, sábios divinos, Pitās e Gandharvas cantavam louvores e lançavam chuvas de flores.

VERSO 14: Homens e mulheres, todos enfeitados com pasta de sândalo, guirlandas de flores, joias e roupas finas, divertiam-se untando e borrifando uns aos outros com vários líquidos.

VERSO 15: Os homens lambuzavam as cortesãs com grande quantidade de óleo, iogurte, água perfumada, cúrcuma e vermelhão em pó, e as cortesãs brincavam de lambuzar os homens com as mesmas substâncias.

VERSO 16: Rodeadas por guardas, as rainhas do rei Yudhiṣṭhira saíram em suas quadrigas para ver a diversão, assim como as esposas dos semideuses aparecem no céu em aeroplanos celestiais. Con­forme os primos maternos e amigos íntimos borrifavam líquidos nas rainhas, os rostos das damas desabrochavam em tímidos sor­risos, realçando-lhes a esplêndida beleza.

VERSO 17: Enquanto as rainhas, com bisnagas na mão, esguichavam água em seus cunhados e outros companheiros, as roupas delas se enchar­caram, revelando seus braços, seios, coxas e cinturas. Em sua agitação, as flores caíram de suas tranças soltas. Com esses en­cantadores passatempos, elas inquietavam os homens de consciência contaminada.

VERSO 18: O imperador, montado em sua quadriga que era puxada por excelentes cavalos enfeitados com arreios de ouro, parecia esplêndido em companhia de suas esposas, assim como o brilhan­te sacrifício Rājasūya rodeado por seus vários rituais.

VERSO 19: Os sacerdotes orientaram o rei através da execução dos rituais finais chamados patnī-saṁyāja e avabhṛthya. Então, solicitaram que ele e a rainha Draupadī sorvessem água para se purificar e se banhassem no Ganges.

VERSO 20: Os timbales dos deuses ressoavam, juntamente com os dos homens. Ao mesmo tempo, semideuses, sábios, antepassados e seres hu­manos lançavam chuvas de flores.

VERSO 21: Todos os cidadãos incluídos nas várias ordens de varṇa e āśra­ma banharam-se, então, naquele lugar, onde até mesmo o mais cruel pecador pode libertar-se de imediato de todas as reações pecaminosas.

VERSO 22: Em seguida, o rei vestiu roupas de seda novas e adornou-se com requintadas joias. Então, honrou os sacerdotes, dirigentes da as­sembleia, brāhmaṇas eruditos e outros hóspedes presenteando-os com ornamentos e roupas.

VERSO 23: De várias maneiras, o rei Yudhiṣṭhira, que dedicara sua vida por completo ao Senhor Nārāyaṇa, honrou continuamente seus parentes, família imediata, outros reis, amigos e benquerentes, bem como todos os presentes na cerimônia.

VERSO 24: Adornados com brincos de pedras preciosas, guirlandas de flores, turbantes, coletes, dhotīs de seda e valiosos colares de pé­rolas, todos os homens ali brilhavam como semideuses. Os gra­ciosos rostos das mulheres eram embelezados por seus formosos brincos e cachos de cabelo, e todas elas usavam cinturões de ouro.

VERSOS 25-26: Então, os cultíssimos sacerdotes, as eminentes autoridades védi­cas que haviam servido como testemunhas do sacrifício, os reis es­pecialmente convidados, os brāhmaṇas, kṣatriyas, vaiśyas, śūdras, semideuses, sábios, antepassados e espíritos místicos, e os princi­pais governantes planetários e seus seguidores – todos eles, tendo sido adorados pelo rei Yudhiṣṭhira, receberam permissão e par­tiram, ó rei, cada qual para a sua própria morada.

VERSO 27: Enquanto todos glorificavam o admirável Rājasūya-yajña exe­cutado por aquele notável rei santo e servo do Senhor Hari, eles não se saciavam, assim como um homem comum jamais se sacia de beber néctar.

VERSO 28: Naquela ocasião, Rājā Yudhiṣṭhira impediu que vários de seus amigos, parentes próximos e familiares distantes, dentre os quais o Senhor Kṛṣṇa, partissem. Por amor, Yudhiṣṭhira não podia deixá-los partir, pois sentia a dor da separação iminente.

VERSO 29: Meu querido Parīkṣit, depois de ter enviado Sāmba e os outros heróis Yadus de volta para Dvārakā, o Senhor Supremo perma­neceu lá por algum tempo para agradar ao rei.

VERSO 30: Dessa maneira, o rei Yudhiṣṭhira, o filho de Dharma, tendo pela graça do Senhor Kṛṣṇa atravessado com sucesso o vasto e formidável oceano de seus desejos, mitigou enfim sua ardente ambição.

VERSO 31: Certo dia, Duryodhana, enquanto observava a opulência do palácio do rei Yudhiṣṭhira, sentiu-se muito incomodado com a magnificência tanto do sacrifício Rājasūya quanto de seu exe­cutor, o rei, cuja vida e alma era o Senhor Acyuta.

VERSO 32: Naquele palácio, todas as opulências reunidas dos reis dos homens, demônios e deuses manifestavam-se com esplendor, pois foi Maya Dānava, o inventor cósmico, que as levou para lá. Com aquelas riquezas, Draupadī servia a seus maridos, e Duryodhana, o príncipe dos Kurus, lamentava-se porque sentia muita atração por ela.

VERSO 33: As milhares de rainhas do Senhor Madhupati também perma­neciam no palácio. Seus pés se moviam devagar, devido ao peso de seus quadris, e os guizos de seus tornozelos tilintavam encan­tadoramente. A cintura delas era muito fina, o kuṅkuma de seus seios avermelhava seus colares de pérolas, e seus balançantes brincos e graciosos cachos de cabelo realçavam a beleza primo­rosa de seus rostos.

VERSOS 34-35: Certo dia, o imperador Yudhiṣṭhira, o filho de Dharma, esta­va sentado exatamente como Indra em um trono de ouro no salão de assembleias construído por Maya Dānava. Presentes com ele, estavam seus auxiliares e membros da família, e também o Senhor Kṛṣṇa, seu olho especial. Enquanto exibia as opulências do próprio Brahmā, o rei Yudhiṣṭhira era louvado pelos poetas da corte.

VERSO 36: O orgulhoso Duryodhana, com uma espada em punho e usan­do coroa e colar, entrou irado no palácio em companhia de seus irmãos, ó rei, e insultou os porteiros enquanto passava.

VERSO 37: Desorientado pelas ilusões criadas através da mágica de Maya Dānava, Duryodhana confundiu o chão firme com água e, em razão disso, ergueu a ponta de sua roupa. Em outro lugar, caiu na água, pensando que se tratava de piso sólido.

VERSO 38: Meu querido Parīkṣit, Bhīma riu ao ver isso, e o mesmo o fi­zeram as mulheres, os reis e outras pessoas presentes. O rei Yudhiṣṭhira tentou impedi-los, mas o Senhor Kṛṣṇa mostrou Sua aprovação.

VERSO 39: Humilhado e ardendo de ira, Duryodhana baixou a cabeça, saiu sem dizer uma palavra e regressou a Hastināpura. As pessoas santas presentes clamaram: “Ai, ai!”, e o rei Yudhiṣṭhira ficou um pouco triste. Mas o Senhor Supremo, cujo mero olhar con­fundira Duryodhana, permaneceu em silêncio, pois Sua intenção era remover o fardo da Terra.

VERSO 40: Agora respondi a tua pergunta, ó rei, sobre a razão pela qual Duryodhana ficou descontente por ocasião do formidável sacrifí­cio Rājasūya.

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