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CAPÍTULO SESSENTA E TRÊS

O Senhor Kṛṣṇa Luta contra Bāṇāsura

Este capítulo descreve a batalha entre o Senhor Kṛṣṇa e o senhor Śiva, bem como a glorificação que Śiva prestou a Kṛṣṇa depois que o Senhor decepara os braços de Bāṇāsura.

Porque Aniruddha não voltava de Śoṇitapura, Sua família e amigos passaram os quatro meses da estação das chuvas em extrema aflição. Quando, por fim, ficaram sabendo por meio de Nārada Muni como Aniruddha fora capturado, um grande exército dos melhores guerrei­ros Yādavas, sob a proteção de Kṛṣṇa, partiu para a capital de Bāṇāsura e sitiou a cidade. Bāṇāsura se opôs ferozmente a eles com seu próprio exército de igual tamanho. Para ajudar Bāṇāsura, o senhor Śiva, acompanhado por Kārtikeya e uma horda de sábios místicos, pegou de suas armas e atacou Balarāma e Kṛṣṇa. Bāṇa começou a lutar contra Sātyaki, e o filho de Bāṇa lutou contra Sāmba. Todos os semi­deuses reuniram-se no céu para assistir à batalha. Com Suas flechas, o Senhor Kṛṣṇa atormentou os seguidores do senhor Śiva e, deixan­do o senhor Śiva em um estado de desorientação, Ele conseguiu destruir o exército de Bāṇāsura. A agressão de Kārtikeya sobre Pradyumna foi tamanha que Pradyumna fugiu do campo de batalha, enquanto o restante do exército de Bāṇāsura, assolado pelos golpes da maça do Senhor Balarāma, dis­persou-se em todas as direções.

Enfurecido ao ver a destruição de seu exército, Bāṇāsura arreme­teu contra Kṛṣṇa para atacá-lO. Mas o Senhor matou de imediato o quadrigário de Bāṇa e quebrou sua quadriga e arco, após o que soou Seu búzio Pāñcajanya. A seguir, a mãe de Bāṇāsura, tentando salvar seu filho, apareceu nua diante do Senhor Kṛṣṇa, que virou o rosto para esquivar-se de olhar para ela. Aproveitando a oportunida­de, Bāṇa fugiu para a sua cidade.

Depois que o Senhor Kṛṣṇa havia derrotado por completo os fantasmas e duendes que lutavam sob a tutela do senhor Śiva, a arma Śiva-jvara – uma personificação da febre, dotada de três cabeças e três pernas – aproximou-se do Senhor Kṛṣṇa para combatê-lO. Vendo o Śiva-jvara, Kṛṣṇa lançou Seu Viṣṇu-jvara. O Śiva-jvara foi dominado pelo Viṣṇu-jvara; sem ter para onde se voltar em busca de abrigo, o Śiva-jvara começou a dirigir-se ao Senhor Kṛṣṇa, glorificando-O e pedindo por misericórdia. O Senhor Kṛṣṇa ficou satisfeito com o Śiva-jvara, então, depois de o Senhor lhe outorgar destemor, o Śiva-jvara prostrou-se diante dEle e partiu.

Em seguida, Bāṇāsura voltou e atacou de novo o Senhor Śrī Kṛṣṇa, brandindo todas as espécies de armas em suas mil mãos. Mas o Senhor Kṛṣṇa pegou de seu disco Sudarśana e passou a decepar todos os braços do demônio. O senhor Śiva aproximou-se de Kṛṣṇa e orou pela vida de Bāṇāsura, e, quando o Senhor concordou em poupá-­lo, Ele dirigiu a palavra a Śiva como segue: “Bāṇāsura não merece morrer, pois nasceu na família de Prahlāda Mahārāja. Cortei todos os braços de Bāṇa, à exceção de quatro, apenas para destruir seu falso orgulho, e ani­quilei seu exército, visto que este era um fardo para a Terra. De agora em diante, ele será alguém livre da velhice e da morte e, permanecendo destemido em todas as circunstâncias, será um de teus principais au­xiliadores.”

Assegurado de que não tinha nada a temer, Bāṇāsura ofereceu reverências ao Senhor Kṛṣṇa e pediu a Ūṣā e Aniruddha que se sentassem em sua quadriga nupcial, após o que os levou diante do Senhor. Kṛṣṇa, então, partiu para Dvārakā com Aniruddha e Sua noiva liderando a procissão. Ao chegarem à capital do Senhor, os recém-casados foram honrados pelos cidadãos, pelos parentes do Senhor e pelos brāhmaas.

VERSO 1: Śukadeva Gosvāmī disse: Ó descendente de Bharata, os pa­rentes de Aniruddha, por não O verem regressar, passaram os quatro meses da estação das chuvas a lamentarem-se.

VERSO 2: Após ouvir Nārada narrar os feitos de Aniruddha e Sua captu­ra, os Vṛṣṇis, que adoravam o Senhor Kṛṣṇa como sua Deidade pessoal, foram para Śoṇitapura.

VERSOS 3-4: Com o Senhor Balarāma e o Senhor Kṛṣṇa na dianteira, os chefes do clã Sātvata – Pradyumna, Sātyaki, Gada, Sāmba, Sāraṇa, Nanda, Upananda, Bhadra e outros – convergiram com um exército de doze divisões para a capital de Bāṇāsura, sitiando-a por completo de todos os lados.

VERSO 5: Bāṇāsura encheu-se de ira ao vê-los destruir os jardins suburbanos, baluartes, torres de vigia e portais de sua cidade; devido a isso, saiu para enfrentá-los com um exército de igual tamanho.

VERSO 6: Em prol de Bāṇa, o senhor Rudra, acompanhado de seu filho Kārtikeya e dos Pramathas, veio montado em Nandi, seu touro transportador, para lutar contra Balarāma e Kṛṣṇa.

VERSO 7: Então, começou uma batalha muito extraordinária, tumultuosa e arrepiante, com o Senhor Kṛṣṇa a lutar contra o Senhor Śaṅkara, e Pradyumna contra Kārtikeya.

VERSO 8: O Senhor Balarāma lutou contra Kumbhāṇḍa e Kūpakarṇa, Sāmba lutou contra o filho de Bāṇa, e Sātyaki enfrentou Bāṇa.

VERSO 9: Brahmā e os outros semideuses governantes, juntamente com Siddhas, Cāraṇas e grandes sábios, bem como Gandharvas, Apsarās e Yakṣas, todos vieram em seus aeroplanos celestiais assistir à batalha.

VERSOS 10-11: Com flechas pontiagudas disparadas de Seu arco Śārṅga, o Senhor Kṛṣṇa expulsou os vários seguidores do senhor Śiva – Bhūtas, Pramathas, Guhyakas, Ḍākinīs, Yātudhānas, Vetālas, Vināyakas, Pretas, Mātās, Piśācas, Kuṣmāṇḍas e Brahma-rākṣasas.

VERSO 12: O senhor Śiva, o manejador do tridente, disparou várias armas contra o Senhor Kṛṣṇa, o portador do Śārṅga. Mas o Senhor Kṛṣṇa não ficou nem um pouco perplexo: Ele neutralizou todas essas armas com armas contrárias apropriadas.

VERSO 13: O Senhor Kṛṣṇa neutralizou uma brahmāstra com outra brahmāstra, uma arma vento com uma arma montanha, uma arma ­fogo com uma arma chuva, e a arma pessoal do senhor Śiva, a pāśupatāstra, com Sua própria arma pessoal, a nārāyaṇāstra.

VERSO 14: Depois de confundir o senhor Śiva fazendo-o bocejar com uma arma de bocejo, o Senhor Kṛṣṇa passou a derrubar o exército de Bāṇāsura com Sua espada, maça e flechas.

VERSO 15: Afligido pela torrente de flechas lançadas por Pradyumna, que choviam de todos os lados, o Senhor Kārtikeya fugiu do campo de batalha montado em seu pavão, enquanto sangue jorrava dos membros de seu corpo.

VERSO 16: Kumbhāṇḍa e Kūpakarṇa, atormentados pela maça do Senhor Balarāma, caíram sem vida. Ao verem que seus líderes haviam sido mortos, os soldados desses dois demônios dispersaram-se em todas as direções.

VERSO 17: Bāṇāsura enfureceu-se ao ver toda a sua força militar ser destroçada. Deixando sua luta com Sātyaki, ele atravessou o campo de batalha em sua quadriga e atacou o Senhor Kṛṣṇa.

VERSO 18: Empolgado ao extremo com a luta, Bāṇa retesou todas as cordas de seus quinhentos arcos ao mesmo tempo e fixou duas flechas em cada corda.

VERSO 19: O Senhor Śrī Hari partiu cada um dos arcos de Bāṇāsura ao mesmo tempo, e também derrubou o quadrigário, a quadriga e os cavalos dele. O Senhor, então, soou Seu búzio.

VERSO 20: Bem naquele momento, a mãe de Bāṇāsura, Koṭarā, desejando salvar a vida de seu filho, apareceu nua e com os cabelos soltos diante do Senhor Kṛṣṇa.

VERSO 21: O Senhor Gadāgraja virou o rosto para não ver a mulher nua, e Bāṇāsura – privado de sua quadriga e com seu arco quebra­do – aproveitou a oportunidade para fugir para a sua cidade.

VERSO 22: Depois que os seguidores do senhor Śiva foram expulsos, o Śiva-jvara, que tinha três cabeças e três pés, precipitou-se contra o Senhor Kṛṣṇa para atacá-lO. À medida que se aproximava, o Śiva-jvara parecia queimar tudo nas dez direções.

VERSO 23: Assim, vendo aproximar-se essa arma personificada, o Senhor Nārāyaṇa lançou Sua própria arma da febre personificada, de nome Viṣṇu-jvara. O Śiva-jvara e o Viṣṇu-jvara travaram, então, um grande duelo.

VERSO 24: O Śiva-jvara, dominado pela força do Viṣṇu-jvara, gritava de dor. Porém, sem encontrar nenhum refúgio, o assustado Śiva-jvara aproximou-se do Senhor Kṛṣṇa, o mestre dos sentidos, com a esperança de conseguir abrigo junto a Ele. Assim, de mãos postas, ele se colocou a louvar o Senhor.

VERSO 25: O Śiva-jvara disse: Prostro-me diante de Vós que tendes potências ilimitadas, o Senhor Supremo, a Superalma de todos os seres. Possuís consciência pura e completa e sois a causa da criação, manutenção e dissolução cósmicas. Perfeitamente pacífico, sois a Verdade Absoluta a quem os Vedas fazem referência indireta.

VERSO 26: O tempo, o destino, o karma, a jīva e suas propensões, os elementos materiais sutis, o corpo material, o ar vital, o falso ego, os vários sentidos, e a totalidade desses fatores enquanto refleti­dos no corpo sutil do ser vivo — tudo isso constitui Vossa energia material ilusória, māyā, um ciclo interminável, como o da semen­te e da planta. Refugio-me em Vós, a negação dessa māyā.

VERSO 27: Com várias intenções, executais passatempos para manter os semideuses, as pessoas santas e os códigos de religião para este mundo. Por meio desses passatempos, também matais aqueles que se desviam do caminho correto e vivem de violência. Em verda­de, esta Vossa encarnação se destina a aliviar o fardo da Terra.

VERSO 28: Estou sendo torturado pelo feroz poder de Vossa terrível arma da febre, que é fria mas queima. Todas as almas corporificadas têm de sofrer enquanto permanecem atadas às ambições materiais e, assim, mantêm-se avessas a servirem Vossos pés.

VERSO 29: O Senhor Supremo disse: Ó pessoa de três cabeças, estou satisfeito contigo. Que teu medo de Minha arma de febre se dissipe, e que quem se lembrar de nossa conversa aqui não tenha razão para temer-te.

VERSO 30: Assim ordenado, o Māheśvara-jvara prostrou-se diante do Senhor infalível e, em seguida, partiu. Mas então apareceu Bāṇāsura, avançando em sua quadriga para combater o Senhor Kṛṣṇa.

VERSO 31: Carregando numerosas armas em suas mil mãos, ó rei, o de­mônio terrivelmente enfurecido disparou muitas flechas contra o Senhor Kṛṣṇa, o portador da arma disco.

VERSO 32: Enquanto Bāṇa continuava atirando armas contra Ele, o Senhor Supremo começou a usar Seu afiadíssimo cakra para decepar os braços de Bāṇa como se fossem galhos de árvore.

VERSO 33: O senhor Śiva, sentindo compaixão de seu devoto Bāṇāsura, cujos braços estavam sendo decepados, aproximou-se do Senhor Cakrāyudha [Kṛṣṇa] e disse-Lhe o seguinte.

VERSO 34: Śrī Rudra disse: Somente Vós sois a Verdade Absoluta, a luz su­prema, o mistério oculto na manifestação verbal do Absoluto. Aqueles cujos corações são imaculados podem ver-Vos, dado que Sois incontaminado, como o céu.

VERSOS 35-36: O céu é Vosso umbigo, o fogo é Vosso rosto, a água é Vosso sêmen, e o firmamento é Vossa cabeça. As direções cardeais são Vosso sen­tido da audição, as ervas são Vossos pelos, e as nuvens portadoras de água são Vossos cabelos. A Terra é Vosso pé, a Lua é Vossa mente, e o Sol é Vossa visão, enquanto eu sou Vosso ego. O oceano é Vosso abdômen, Indra é Vosso braço, o senhor Brahmā é Vossa inteligên­cia, o progenitor da humanidade é Vossos órgãos genitais, e a re­ligião é Vosso coração. Sois de fato o puruṣa original, o criador dos mundos.

VERSO 37: Vosso atual advento ao reino material, ó Senhor de irrestrito poder, destina-se a manter os princípios da justiça e beneficiar o universo inteiro. Nós semideuses, cada qual dependendo de Vossa graça e autoridade, desenvolvemos os sete sistemas plane­tários.

VERSO 38: Sois a pessoa original, única e inigualável, transcendental e automanifestante. Não causado, sois a causa de tudo e o controlador último. Não obstante, sois percebido em termos das transforma­ções de matéria efetuadas por Vossa energia ilusória – transfor­mações que sancionais para que as várias qualidades materiais possam manifestar-se por completo.

VERSO 39: Ó todo-poderoso, assim como o Sol, embora oculto por uma nuvem, ilumina a nuvem e todas as outras formas visíveis tam­bém, da mesma forma Vós, embora oculto pelas qualidades ma­teriais, permaneceis autoluminoso e assim revelais todas aquelas qualidades, juntamente com as entidades vivas que as possuem.

VERSO 40: Com sua inteligência desorientada por Vossa māyā, totalmen­te apegadas a filhos, esposa, lar etc., as pessoas mergulhadas no oceano de sofrimento material ora sobem à tona, ora afundam.

VERSO 41: Alguém que alcança esta forma de vida humana como uma dádiva de Deus, mas deixa de controlar os sentidos e honrar Vossos pés, é certamente digno de compaixão, pois está apenas enganando a si próprio.

VERSO 42: Aquele mortal que Vos rejeita – Vós que sois seu verdadeiro Eu, o amigo mais querido e o Senhor – por causa dos objetos dos sentidos, cuja natureza é exatamente o oposto, recusa o néctar e, em seu lugar, consome veneno.

VERSO 43: Eu, o senhor Brahmā, os outros semideuses e os sábios de mente pura rendemo-nos de todo o coração a Vós, nosso mais querido Eu e Senhor.

VERSO 44: Prestemos nossa adoração a Vós, o Senhor Supremo, para nos libertarmos da vida material. Sois o mantenedor do universo e a causa de sua criação e extinção. Equilibrado e perfeitamente em paz, Vós sois o verdadeiro amigo, Eu e Senhor adorável. Sois único e inigua­lável, o abrigo de todos os mundos e de todas as almas.

VERSO 45: Este Bāṇāsura é meu querido e fiel seguidor, e lhe concedi destemor. Portanto, meu Senhor, fazei a gentileza de outorgar-lhe a Vossa misericórdia, assim como mostrastes misericórdia a Prahlāda, o senhor dos demônios.

VERSO 46: O Senhor Supremo disse: Meu querido senhor, para o teu prazer, certamente devemos fazer o que Nos pediste. Concordo completamente com tua conclusão.

VERSO 47: Não matarei este demoníaco filho de Vairocani, pois dei a Prahlāda Mahārāja a bênção de que não mataria nenhum de seus descendentes.

VERSO 48: Foi para subjugar o falso orgulho de Bāṇāsura que lhe decepei os braços. E exterminei seu poderoso exército porque este se tornara um fardo sobre a Terra.

VERSO 49: Este demônio, que ainda tem quatro braços, será imune à velhice e à morte, e servirá como um de teus principais auxiliares. Dessa maneira, ele nada terá a temer de modo algum.

VERSO 50: Livrando-se assim do medo, Bāṇāsura ofereceu reverências ao Senhor Kṛṣṇa tocando o chão com sua cabeça. Bāṇa, então, fez Aniruddha e Sua noiva sentarem-se na quadriga deles e levou-os diante do Senhor.

VERSO 51: Então, à frente do grupo, o Senhor Kṛṣṇa colocou Aniruddha e Sua noiva, ambos belamente adornados com finas roupas e ornamentos, e rodeou-os com toda uma divisão militar. Assim, o Senhor Kṛṣṇa despediu-Se do senhor Śiva e partiu.

VERSO 52: O Senhor, então, entrou em Sua capital. A cidade estava exuberantemente decorada com bandeiras e arcos triunfais, e suas avenidas e encruzilhadas estavam todas borrifadas com água. Enquanto ressoavam búzios, tambores, ānakas e dundubhis, os parentes do Senhor, os brāhmaṇas e o povo em geral aproximaram-se com muito respeito para saudá-lO.

VERSO 53: Quem quer que se levante de manhã cedo e se lembre da vi­tória do Senhor Kṛṣṇa em Sua batalha contra o senhor Śiva jamais experimentará derrota.

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