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CAPÍTULO ONZE

As Quatro Classes Sociais de uma Sociedade Perfeita

Este capítulo descreve os princípios gerais que, seguindo-os, todo ser humano, e especificamente aquele que esteja interessado em avançar na vida espiritual, poderá tornar-se perfeito.

Ao tomar conhecimento das características de Prahlāda Mahārāja, Mahārāja Yudhiṣṭhira ficou muitíssimo satisfeito. Agora, ele pergunta a Nārada Muni sobre a verdadeira religião do ser humano e sobre os aspectos especiais do varṇāśrama-dharma, o qual assinala o mais elevado status da civilização humana. Quando Mahārāja Yudhiṣṭhira lhe perguntou esses assuntos, Nārada Muni parou de fornecer suas próprias explicações e passou a mencionar as explicações do Senhor Nārāyaṇa, pois Ele é a suprema autoridade, a partir de quem são estabelecidos os códigos religiosos (dharmaṁ tu sākṣād bhagavat-praṇītam). A todo ser humano compete adquirir trinta qualidades, tais como veracidade, misericórdia e austeridade. O processo através do qual alguém segue os princípios religiosos é conhecido como sanātana-dharma, o sistema religioso eterno.

O sistema varṇāśrama delineia as divisões de brāhmaṇa, kṣatriya, vaiśya e śūdra, e apresenta o sistema de saṁskāras. O garbhādhāna-saṁskāra, a cerimônia recomendada para aqueles que querem gerar filhos, deve ser observado pela seção de pessoas mais elevadas, a saber, os dvijas. Aquele que segue o sistema garbhādhāna-saṁskāra é realmente duas vezes nascido, ao passo que aqueles que, não adotando esse procedimento, desviam-se dos princípios do varṇāśrama-dharma, são chamados dvija-bandhus. As principais ocupações do brāhmaṇa são adorar a Deidade, ensinar os outros como adorar a Deidade, estudar os textos védicos, ensinar esses mesmos textos, aceitar caridade dada por outros e, por sua vez, dar caridade aos outros. O brāhmaṇa deve subsistir dessas seis ocupações. O dever do kṣatriya é proteger os cidadãos e arrecadar imposto deles, mas lhe é vedado cobrar imposto dos brāhmaṇas. Portanto, os membros do movimento da consciência de Kṛṣṇa devem ser isentos do imposto governamental. Os kṣatriyas podem cobrar impostos de todos, exceto dos brāhmaṇas. Os vaiśyas devem cultivar a terra, produzir grãos alimentícios e proteger as vacas, ao passo que os śūdras, que jamais adquirem as qualidades dos brāhmaṇas, kṣatriyas ou vaiśyas, devem servir às três classes superiores e ficar satisfeitos com isso. Também se prescrevem aos brāhmaṇas quatro outros meios de manutenção, os quais consistem em śālīna, yāyāvara, śila e uñchana. Cada um desses deveres ocupacionais é superior ao precedente.

Exceto quando for necessário, quem pertencer a um determinado grau de vida social inferior não poderá aceitar ocupações destinadas às classes superiores. Em emergências, todas as classes, exceto os kṣatriyas, podem aceitar deveres ocupacionais diferentes dos seus. Os meios de manutenção conhecidos como ṛta (śiloñchana), amṛta (ayācita), mṛta (yācñā), pramṛta (karṣaṇa) e satyānṛta (vāṇijya) podem ser aceitos por todos, exceto pelos kṣatriyas. Sempre que o brāhmaṇa ou o kṣatriya se ocupam no serviço próprio para os vaiśyas ou śūdras, considera-se que eles assumem a posição de um cachorro.

Nārada Muni também descreve que a característica do brāhmaṇa é o controle dos sentidos, as características do kṣatriya são o poder e a fama, a característica do vaiśya é que ele presta serviço aos brāhmaṇas e kṣatriyas, e a característica do śūdra é prestar serviço às três classes superiores. A qualificação da mulher é ser uma esposa muito casta e fiel. Dessa maneira, Nārada Muni descreve as características das pessoas de nível superior e inferior e recomenda que todos sigam os princípios de sua casta ou ocupação hereditária. Ninguém pode deixar repentinamente a ocupação a que está acostumado. Portanto, recomenda-se que todos adotem um processo de despertar gradual. Os sintomas dos brāhmaṇas, kṣatriyas, vaiśyas e śūdras são muito importantes, de modo que a pessoa deve ser reconhecida somente por meio desses sintomas, e não por intermédio do seu nascimento. A designação baseada em nascimento é estritamente proibida por Nārada Muni e por todas as grandes personalidades.

VERSO 1: Śukadeva Gosvāmī continuou: Após ouvir sobre as atividades e o caráter de Prahlāda Mahārāja, os quais grandes personalidades, tais como o senhor Brahmā e o senhor Śiva, adoram e comentam, Yudhiṣṭhira Mahārāja, o rei mais respeitável entre personalidades elevadas, sentindo imensa satisfação, voltou a fazer perguntas ao grande santo Nārada Muni.

VERSO 2: Mahārāja Yudhiṣṭhira disse: Meu querido senhor, quero que me delineies os princípios religiosos através dos quais se pode alcançar a meta última da vida – o serviço devocional. Quero ouvir sobre os deveres ocupacionais gerais da sociedade humana e sobre o sistema de avanço social e espiritual conhecido como varṇāśrama-dharma.

VERSO 3: Ó melhor dos brāhmaṇas, és, diretamente, o filho do Prajāpati [senhor Brahmā]. Devido a tuas austeridades, yoga místico e transe, és considerado o melhor de todos os filhos do senhor Brahmā.

VERSO 4: No que se refere a levar uma vida pacífica ou outorgar misericórdia, ninguém é superior a ti, e ninguém sabe mais do que tu como executar serviço devocional ou como se tornar o melhor dos brāhmaṇas. Portanto, conheces todos os princípios confidenciais da vida religiosa, e ninguém os conhece mais do que tua pessoa.

VERSO 5: Śrī Nārada Muni disse: Após ter, em primeiro lugar, oferecido minhas reverências ao Senhor Kṛṣṇa, o protetor dos princípios religiosos de todas as entidades vivas, prontifico-me, então, a explicar os princípios do sistema religioso eterno, o que ouvi da boca de Nārāyaṇa.

VERSO 6: O Senhor Nārāyaṇa, juntamente com Sua manifestação parcial Nara, apareceu neste mundo através da filha de Dakṣa Mahārāja, conhecida como Mūrti. Em benefício de todas as entidades vivas, Ele foi gerado por Dharma Mahārāja. Inclusive, próximo ao local conhecido como Badarikāśrama, Ele continua ocupado em executar grandes austeridades.

VERSO 7: O Ser Supremo, a Personalidade de Deus, é a essência de todo o conhecimento védico, a raiz de todos os princípios religiosos e a memória das grandes autoridades. Ó rei Yudhiṣṭhira, este princípio da religião se manifesta como uma evidência. Com base nesse princípio religioso, tudo se satisfaz, inclusive a mente, a alma e até mesmo o corpo.

VERSOS 8-12: Estes são os princípios gerais a serem seguidos por todos os seres humanos: veracidade, misericórdia, austeridade (observar jejum em certos dias do mês), banhar-se duas vezes ao dia, tolerância, distinguir entre o certo e o errado, controle da mente, controle dos sentidos, não-violência, celibato, caridade, leitura das escrituras, simplicidade, satisfação, prestar serviço às pessoas santas, deixar gradualmente as ocupações desnecessárias, perceber quão fúteis são as atividades desnecessárias da sociedade humana, permanecer silencioso e grave e evitar conversas inúteis, analisar se a pessoa é o corpo ou a alma, distribuição equânime de alimento para todas as entidades vivas (tanto para os homens quanto para os animais), ver toda alma (especialmente sob a forma humana) como parte do Senhor Supremo, ouvir sobre as atividades e instruções da Suprema Personalidade de Deus (que é o refúgio das pessoas santas), glorificar essas atividades e instruções, sempre se lembrar dessas atividades e instruções, procurar prestar serviço, executar adoração, oferecer reverências, tornar-se servo, tornar-se amigo e render-se por completo. Ó rei Yudhiṣṭhira, essas trinta qualificações devem ser adquiridas na forma de vida humana. Pelo simples fato de adquiri-las, a pessoa pode satisfazer a Suprema Personalidade de Deus.

VERSO 13: Aqueles que se aperfeiçoaram através da cerimônia garbhādhāna e outros métodos reformatórios prescritos, executados ininterruptamente com mantras védicos, e que receberam aprovação do senhor Brahmā, são dvijas, ou duas vezes nascidos. Tais brāhmaṇas, kṣatriyas e vaiśyas, purificados por suas tradições familiares e por seu comportamento, devem adorar o Senhor, estudar os Vedas e fazer caridade. Nesse sistema, devem seguir os princípios em que se apoiam os quatro āśramas [brahmacarya, gṛhastha, vānaprastha e sannyāsa].

VERSO 14: Para o brāhmaṇa, existem seis atividades ocupacionais. O kṣatriya não deve aceitar caridade, mas pode executar os outros cinco desses deveres. O rei ou o kṣatriya não tem permissão de cobrar impostos dos brāhmaṇas, mas ele pode adquirir sua subsistência cobrando dos seus outros súditos impostos, taxas alfandegárias e multas por contravenções.

VERSO 15: A comunidade mercantil deve sempre seguir as orientações dos brāhmaṇas e desenvolver atividades, tais como agricultura, comércio e proteção às vacas. Quanto aos śūdras, cabe-lhes apenas aceitar um amo pertencente a uma ordem social mais elevada e se ocupar em servi-lo.

VERSO 16: Como alternativa, o brāhmaṇa pode também assumir deveres ocupacionais dos vaiśyas – agricultura, proteção às vacas ou comércio. Ele pode subsistir daquilo que tenha recebido sem esmolar, pode esmolar nos campos de arroz todos os dias, pode coletar o arroz deixado nos campos pelo proprietário, ou pode juntar grãos alimentícios deixados em vários lugares nas mercearias dos negociantes de cereais. Esses são quatro meios de subsistência que os brāhmaṇas também podem adotar. Entre esses quatro, cada um deles é sucessivamente melhor do que o anterior.

VERSO 17: Exceto em tempos de emergência, pessoas inferiores não devem aceitar deveres ocupacionais destinados àqueles que são mais elevados. Porém, quando surge essa emergência, todos, exceto o kṣatriya, podem aceitar os meios de subsistência próprios dos outros.

VERSOS 18-20: Em tempos de emergência, pode-se aceitar qualquer uma das várias classes de ocupações conhecidas como ṛta, amṛta, mṛta, pramṛta e satyānṛta, mas, em nenhuma circunstância, deve alguém aceitar uma posição de cachorro. A ocupação uñchaśila, pegar os grãos que estão nos campos, é chamada ṛta. Coletar sem pedir chama-se amṛta, esmolar cereais chama-se mṛta, cultivar a terra é chamado pramṛta, e o comércio denomina-se satyānṛta. Todavia, ocupar-se no mesmo serviço que é designado a pessoas de classe inferior chama-se śva-vṛtti, atividade de cachorro. Especificamente, os brāhmaṇas e os kṣatriyas não devem ocupar-se no serviço prestado pelos śūdras, que é inferior e abominável. Os brāhmaṇas devem estar bem familiarizados com todo o conhecimento védico, e os kṣatriyas devem estar bem afeitos à adoração aos semideuses.

VERSO 21: As características do brāhmaṇa são controle da mente, controle dos sentidos, austeridade e penitência, limpeza, satisfação, clemência, simplicidade, conhecimento, misericórdia, veracidade e completa rendição à Suprema Personalidade de Deus.

VERSO 22: Ser influente na batalha, invencível, perseverante, desafiante e caridoso, exercer controle sobre as necessidades corpóreas, ser clemente, estar apegado à natureza bramânica e ser sempre alegre e veraz – estas são as características do kṣatriya.

VERSO 23: Ser sempre devotado aos semideuses, ao mestre espiritual e a Viṣṇu, o Senhor Supremo; esforçar-se para avançar nos princípios religiosos, no desenvolvimento econômico e no gozo dos sentidos [dharma, artha e kāma]; acreditar nas palavras do mestre espiritual e nas escrituras, e sempre se empenhar habilmente para ganhar dinheiro – essas são as características do vaiśya.

VERSO 24: Oferecer reverências às classes mais elevadas da sociedade [os brāhmaṇas, os kṣatriyas e os vaiśyas], ser sempre muito limpo, estar livre da duplicidade, servir ao seu amo, executar sacrifícios sem proferir mantras, não roubar, sempre falar a verdade e dar toda a proteção às vacas e aos brāhmaṇas – essas são as características do śūdra.

VERSO 25: Prestar serviço ao esposo, ser sempre favoravelmente propensa ao esposo, mostrar a mesma disposição aos parentes e amigos de seu esposo e seguir os votos do esposo – estes são os quatro princípios a serem seguidos pelas mulheres definidas como castas.

VERSOS 26-27: A mulher casta deve vestir-se com elegância e se decorar com ornamentos de ouro para o prazer de seu esposo. Sempre usando roupas limpas e atrativas, ela deve varrer e limpar a casa com água e outros líquidos para que toda a casa esteja sempre pura e limpa. Ela deve arrumar os utensílios domésticos e manter a casa sempre perfumada com incenso e flores e deve estar preparada para executar os desejos de seu esposo. Sendo recatada e veraz, controlando seus sentidos e falando palavras doces, de acordo com o tempo e as circunstâncias, a mulher casta deve ocupar-se amorosamente a serviço do seu esposo.

VERSO 28: A mulher casta não deve ser cobiçosa; ela deve mostrar-se satisfeita em todas as circunstâncias. Deve ser muito hábil em executar os afazeres domésticos e estar bem familiarizada com os princípios religiosos. Seu linguajar deve ser agradável e veraz e ela deve ser muito atenciosa e sempre limpa e simples. Assim, a mulher casta deve, com afeição, dedicar-se a servir um esposo que não seja caído.

VERSO 29: A mulher que, seguindo estritamente os passos da deusa da fortuna, ocupa-se a serviço do seu esposo, com certeza retornará ao lar, retornará ao Supremo com seu esposo devoto, e viverá muito feliz nos planetas Vaikuṇṭha.

VERSO 30: Entre as classes mistas conhecidas como saṅkara, aqueles que não são ladrões são conhecidos como antevasāyī ou caṇḍālas [comedores de cachorros], e eles também têm seus costumes hereditários.

VERSO 31: Meu querido rei, os brāhmaṇas versados em conhecimento védico proferiram o veredito de que, em cada era [yuga], o fato de diferentes categorias de pessoas se comportar de acordo com o modo da natureza material que as caracteriza é auspicioso tanto nesta vida quanto o é após a morte.

VERSO 32: Se a pessoa atua em sua ocupação de acordo com sua posição nos modos da natureza e gradualmente deixa essas atividades, ela alcança a fase de niṣkāma.

VERSOS 33-34: Meu querido rei, se um campo agrícola é cultivado repetidas vezes, o seu poder produtivo diminui, e nenhuma semente que é nele plantada consegue germinar. Assim como algumas gotas de ghī jogadas ao fogo jamais o extinguem, ao passo que uma inundação de ghī o faz, do mesmo modo, o excesso de desejos luxuriosos mitigará inteiramente esses desejos.

VERSO 35: Se em seu comportamento alguém apresenta as características acima descritas de brāhmaṇa, kṣatriya, vaiśya ou śūdra, mesmo que ele tenha aparecido em alguma classe diferente, deve ser aceito de acordo com os sintomas qualificadores.

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