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CAPÍTULO SESSENTA E SEIS

Pauṇḍraka, o Falso Vāsudeva

Este capítulo relata a ida do Senhor Kṛṣṇa a Kāśī (atual Benares) e o extermínio de Pauṇḍraka e Kāśirāja, e como o disco Sudarśana do Senhor derrotou um demônio, incinerou a cidade de Kāśī e matou Sudakṣiṇa.

Enquanto o Senhor Baladeva visitava Vraja, o rei Pauṇḍraka de Karūṣa, incentivado por tolos, proclamou ser o verdadeiro Vāsudeva. Por isso ele, desafiou o Senhor Kṛṣṇa com a seguinte mensagem: “Já que apenas eu sou a verdadeira Personalidade de Deus, deves abando­nar Tua falsa reivindicação dessa posição, bem como meus símbolos divinos, e refugiar-Te em mim. Caso contrário, prepara-Te para a batalha.”

Quando Ugrasena e os membros de sua assembleia real ouviram as tolas palavras arrogantes de Pauṇḍraka, todos se puseram a garga­lhar. Śrī Kṛṣṇa, então, mandou o mensageiro de Pauṇḍraka levar uma mensagem a seu amo: “Ó tolo, Eu te forçarei a abandonar o falso disco Sudarśana e outros símbolos divinos Meus que ousaste carregar. E quando jazeres no campo de batalha, tu serás o abrigo de cães.”

O Senhor Kṛṣṇa, em seguida, foi para Kāśī. Pauṇḍraka, vendo que o Senhor Se preparava para a batalha, saiu depressa da cidade para enfrentá-lO com seu exército. Seu amigo Kāśirāja seguiu-o, coman­dando a retaguarda. Assim como o fogo da devastação universal des­trói todos os seres vivos em todas as direções, da mesma forma o Senhor Kṛṣṇa aniquilou os exércitos de Pauṇḍraka e Kāśirāja. Então, depois de castigar Pauṇḍraka, o Senhor decapitou Pauṇḍraka e Kāśirāja com Seu disco Sudarśana. Em seguida, regressou a Dvārakā. Porque constantemente meditara no Senhor Supremo, chegando até a vestir-se como Ele, Pauṇḍraka logrou a liberação.

Quando Kṛṣṇa decapitou Kāśirāja, a cabeça do rei voou até a sua cidade, e, quando suas rainhas, filhos e outros parentes viram-na, todos eles começaram a lamentar-se. Naquele momento, um dos filhos de Kāśirāja, chamado Sudakṣiṇa, querendo vingar a morte do pai, passou a adorar o senhor Śiva com a intenção de destruir o assassino de seu pai. Satisfeito com a adoração de Sudakṣiṇa, o senhor Śiva ofereceu­-lhe a oportunidade de escolher uma bênção, e Sudakṣiṇa pediu como bênção um meio de matar quem exterminara seu pai. O senhor Śiva o aconselhou a adorar o fogo Dakṣiṇāgni com rituais de magia negra. Sudakṣiṇa fez isso, e, como resultado, surgiu da pira do fogo de sa­crifício um terrível demônio com um corpo flamejante. O demônio levantou-se carregando um tridente de fogo e partiu de imediato para Dvārakā.

Os residentes da capital do Senhor Kṛṣṇa ficaram aterrorizados ao verem aproximar-se o demônio, mas o Senhor Kṛṣṇa garantiu-lhes proteção e enviou Seu cakra Sudarśana para contra-atacar a criação mágica do senhor Śiva. O Sudarśana subjugou o demônio, que regressou, então, a Vārāṇasī e reduziu a cinzas Sudakṣiṇa e seus sacerdotes. O disco Sudarśana, perseguindo o demônio, entrou em Vārāṇasī e incinerou toda a cidade. Então, o disco do Senhor retornou a Seu lado em Dvārakā.

VERSO 1: Śukadeva Gosvāmī disse: Ó rei, enquanto o Senhor Balarāma estava ausente visitando Vraja, a vila de Nanda, o governador de Karūṣa, tolamente pensando: “Eu sou o Senhor Supremo, Vāsudeva”, mandou um mensageiro ao Senhor Kṛṣṇa.

VERSO 2: Pauṇḍraka foi encorajado pela adulação de homens infantis, que lhe disseram: “Tu és Vāsudeva, o Senhor Supremo e mestre do universo, que agora desceste à Terra.” Dessa forma, ele ima­ginava ser a infalível Personalidade de Deus.

VERSO 3: Então, o estúpido rei Pauṇḍraka enviou um mensageiro ao inescrutável Senhor Kṛṣṇa em Dvārakā. Pauṇḍraka estava agindo como um menino ininteligente que outras crianças fazem de conta que é um rei.

VERSO 4: Chegando a Dvārakā, o mensageiro encontrou Kṛṣṇa, que tem olhos de lótus, em Sua assembleia real e transmitiu a mensagem do rei ao Senhor onipotente.

VERSO 5: [Em nome de Pauṇḍraka, o mensageiro disse:] Eu sou o único e exclusivo Senhor Vāsudeva, e não existe outro. Eu é que desci a este mundo para mostrar misericórdia aos seres vivos. Portan­to, abandona Teu nome falso.

VERSO 6: Ó Sātvata, abandona meus símbolos pessoais, que carregas agora por tolice, e vem refugiar-Te em mim. Se não o fizeres, então terás de combater-me.

VERSO 7: Śukadeva Gosvāmī disse: O rei Ugrasena e os outros membros da assembleia riram bem alto ao ouvirem esta mensagem vã e pre­sunçosa do ininteligente Pauṇḍraka.

VERSO 8: A Personalidade de Deus, depois de Se divertir com os grace­jos feitos na assembleia, disse ao mensageiro [que transmitisse uma mensagem a seu amo:] “Tolo! Arrancarei, certamente, as armas de que tanto te vanglorias.”

VERSO 9: “Quando estiveres morto, ó tolo, com teu rosto coberto por abutres, garças e aves vaṭa, tu te tornarás o refúgio de cães.”

VERSO 10: Depois que o Senhor disse essas palavras, o mensageiro partiu e transmitiu na íntegra a resposta insultuosa dEle a seu amo. O Senhor Kṛṣṇa, então, montou em Sua quadriga e foi para as pro­ximidades de Kāśī.

VERSO 11: Ao observar os preparativos do Senhor Kṛṣṇa para o comba­te, o poderoso guerreiro Pauṇḍraka saiu depressa da cidade com duas divisões militares completas.

VERSOS 12-14: O amigo de Pauṇḍraka, o rei de Kāśī, seguiu atrás, ó rei, chefiando a retaguarda com três divisões akṣauhiṇīs. O Senhor Kṛṣṇa viu que Pauṇḍraka usava as próprias insígnias do Senhor, tais como o búzio, o disco, a espada e a maça, e também um arco Śārṅga e uma marca Śrīvatsa de imitação. Usava uma joia Kaustu­bha falsa, estava enfeitado com uma guirlanda de flores silvestres e vestido com roupas superiores e inferiores de requintada seda amarela. Seu estandarte trazia a imagem de Garuḍa, e ele usava uma valiosa coroa e refulgentes brincos em forma de tubarão.

VERSO 15: O Senhor Hari gargalhou ao ver como o rei se vestira imitando exatamente Sua própria aparência, tal qual um ator no palco.

VERSO 16: Os inimigos do Senhor Hari atacaram-nO com tridentes, maças, clavas, chuços, ṛṣṭis, dardos farpados, lanças, espadas, machados e flechas.

VERSO 17: O Senhor Kṛṣṇa, porém, contra-atacou ferozmente o exército de Pauṇḍraka e Kāśirāja, que consistia em elefantes, quadrigas, cavalaria e infantaria. Com sua maça, espada, disco Sudarśana e flechas, o Senhor atormentou Seus inimigos, assim como o fogo da aniquilação atormenta as várias espécies de criaturas no final de uma era cósmica.

VERSO 18: O campo de batalha, repleto de quadrigas, cavalos, elefantes, seres humanos, mulas e camelos que haviam sido destroçados pela arma disco do Senhor, brilhava como o horripilante lugar de diversão do senhor Bhūtapati, dando prazer aos sábios.

VERSO 19: Então, o Senhor Kṛṣṇa dirigiu-Se a Pauṇḍraka: Meu querido Pauṇḍraka, aquelas mesmas armas de que falaste por intermédio de teu mensageiro, agora Eu as lanço a ti.

VERSO 20: Ó tolo, agora farei abdicares do Meu nome, que assumiste falsamente. E com certeza Me refugiarei em ti caso não queira lutar contigo.

VERSO 21: Tendo assim ridicularizado Pauṇḍraka, o Senhor Kṛṣṇa des­truiu a quadriga dele com Suas flechas pontiagudas. Então, o Senhor, com o disco Sudarśana, decepou-lhe a cabeça, assim como o senhor Indra, com seu raio, decepa abruptamente o pico de uma montanha.

VERSO 22: Com Suas flechas, o Senhor Kṛṣṇa arrancou do mesmo modo a cabeça de Kāśirāja, arremessando-a pelos ares até a cidade de Kāśī tal qual uma flor de lótus atirada pelo vento.

VERSO 23: Tendo assim matado o invejoso Pauṇḍraka e seu aliado, o Senhor Kṛṣṇa regressou a Dvārakā. Enquanto Ele entrava na cidade, os Siddhas dos céus cantavam Suas imortais glórias nec­táreas.

VERSO 24: Por sua constante meditação no Senhor Supremo, Pauṇḍraka desfez todos os seus vínculos materiais. De fato, por imitar a aparên­cia do Senhor Kṛṣṇa, ó rei, ele acabou tornando-se consciente de Kṛṣṇa.

VERSO 25: Ao verem uma cabeça adornada com brincos jazendo no portal do palácio real, as pessoas presentes ficaram perplexas. Algumas delas perguntavam: “O que é isto?”, e outras diziam: “É uma ca­beça, mas de quem?”

VERSO 26: Meu querido rei, ao reconhecerem que era a cabeça de seu rei – o senhor de Kāśī –, suas rainhas, filhos e outros parentes, junto de todos os cidadãos, começaram a chorar pateticamente: “Ai de nós! Estamos mortos! Ó meu amo, ó meu amo!”

VERSOS 27-28: Depois que Sudakṣiṇa, o filho do rei, executou os ritos fúne­bres obrigatórios em homenagem a seu pai, ele se determinou em sua mente: “Só matando o assassino de meu pai poderei vingar sua morte.” Dessa maneira, o caridoso Sudakṣiṇa, junto de seus sacerdotes, começou a adorar o Senhor Maheśvara com grande atenção.

VERSO 29: Satisfeito com a adoração, o poderoso senhor Śiva apareceu no local sagrado de Avimukta e ofereceu a Sudakṣiṇa a oportuni­dade de escolher uma bênção. O príncipe escolheu como bênção um meio de matar o assassino de seu pai.

VERSOS 30-31: O senhor Śiva disse-lhe: “Acompanhado de brāhmaṇas, serve o fogo Dakṣiṇāgni – o sacerdote original – seguindo os preceitos do ritual abhicāra. Então, o fogo Dakṣiṇāgni, junto de muitos Pramathas, satisfará teu desejo se o dirigires contra alguém hostil aos brāhmaṇas.” Após receber essa instrução, Sudakṣiṇa cumpriu à risca os votos ritualísticos e invocou o abhicāra contra o Senhor Kṛṣṇa.

VERSOS 32-33: Depois disso, o fogo ergueu-se da pira do altar, assumindo a forma de uma pessoa nua e extremamente medonha. A barba e o tufo de cabelo da criatura ígnea assemelhavam-se ao cobre derretido, e seus olhos emitiam resplandecentes brasas em chamas. Seu rosto parecia muito horripilante com suas presas e terríveis sobrancelhas arqueadas e franzidas. Enquanto lambia os cantos de sua boca, o demônio sacudia seu tridente flamejante.

VERSO 34: Com pernas altas como palmeiras, o monstro precipitou-se para Dvārakā na companhia de espíritos espectrais, estremecen­do o chão e queimando o mundo em todas as direções.

VERSO 35: Vendo aproximar-se o demônio de fogo criado pelo ritual abhicāra, os residentes de Dvārakā ficaram todos amedrontados, assim como animais aterrorizados por um incêndio na floresta.

VERSO 36: Perturbados pelo fogo, o povo se colocou a clamar pela Suprema Personalidade de Deus, que Se encontrava na ocasião a jogar dados na corte real: “Salvai-nos! Ó Senhor dos três mundos, salvai-nos deste fogo a incendiar a cidade!”

VERSO 37: Quando o Senhor Kṛṣṇa ouviu a agitação do povo e viu que até Seus próprios homens estavam perturbados, aquele digníssi­mo outorgador de abrigo apenas riu e lhes disse: “Não temais; Eu hei de vos proteger.”

VERSO 38: O Senhor onipotente, a testemunha interna e externa de todos, entendeu que o monstro fora produzido pelo senhor Śiva a partir do fogo do sacrifício. Para derrotar o demônio, Kṛṣṇa enviou Sua arma ­disco, que estava esperando a Seu lado.

VERSO 39: Aquele Sudarśana, a arma disco do Senhor Mukunda, flamejava como milhões de sóis. Sua refulgência brilhava como o fogo da aniquilação universal, e, com seu calor, ele atormentava o firmamento, todas as direções, o céu e a terra, e também o demônio de fogo.

VERSO 40: Frustrado pelo poder da arma do Senhor Kṛṣṇa, ó rei, a cria­tura de fogo produzida por magia negra virou o rosto e retroce­deu. Criado para gerar violência, o demônio, então, regressou a Vārāṇasī, onde cercou a cidade e incinerou Sudakṣiṇa e seus sacerdotes, apesar de aquele ser o seu criador.

VERSO 41: O disco do Senhor Viṣṇu também entrou em Vārāṇasī, no en­calço do demônio de fogo, e passou a incinerar a cidade, incluindo todos os salões de assembleia e palácios residenciais com pórticos elevados, seus numerosos mercados, portais, torres de vigia, armazéns e tesourarias, e todos os edifícios que abrigavam elefan­tes, cavalos, quadrigas e cereais.

VERSO 42: Depois de incendiar toda a cidade de Vārāṇasī, o cakra Sudar­śana do Senhor Viṣṇu retornou ao lado de Śrī Kṛṣṇa, aquele cujas ações são feitas sem esforço.

VERSO 43: Qualquer mortal que narrar este passatempo heroico do Senhor Uttamaḥ-śloka ou que apenas ouvi-lo com atenção, será liberto de todos os pecados.

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