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Capítulo Dezoito

Mahārāja Parīkṣit é Amaldiçoado por um Menino Brāhmaṇa

VERSO 1: Śrī Sūta Gosvāmī disse: Devido à misericórdia da Personalidade de Deus, Śrī Kṛṣṇa, que age maravilhosamente, Mahārāja Parīkṣit, embora atacado pela arma do filho de Droṇa no ventre de sua mãe, não pôde ser queimado.

VERSO 2: Além disso, Mahārāja Parīkṣit estava sempre conscientemente rendido à Personalidade de Deus e, portanto, não ficava temeroso nem dominado pelo medo devido à serpente alada que iria picá-lo devido à fúria de um menino brāhmaṇa.

VERSO 3: Além disso, após deixar todos os seus associados, o rei se rendeu como discípulo ao filho de Vyāsa [Śukadeva Gosvāmī] e, desse modo, foi capaz de entender a verdadeira posição da Personalidade de Deus.

VERSO 4: Isso sucedeu porque aqueles que dedicam suas vidas aos tópicos transcendentais da Personalidade de Deus, sobre quem cantam os hinos védicos, e que estão constantemente ocupados em lembrar-se dos pés de lótus do Senhor, não correm o risco de ter concepções errôneas mesmo no momento final de suas vidas.

VERSO 5: Enquanto o grande e poderoso filho de Abhimanyu permanecer como imperador do mundo, não haverá possibilidade de que a personalidade de Kali floresça.

VERSO 6: No mesmo dia e momento em que a Personalidade de Deus, o Senhor Śrī Kṛṣṇa, deixou esta Terra, a personalidade de Kali, que promove todos os tipos de atividades irreligiosas, veio a este mundo.

VERSO 7: Mahārāja Parīkṣit era um realista, assim como as abelhas que aceitam somente a essência [de uma flor]. Ele sabia perfeitamente bem que, nesta era de Kali, as coisas auspiciosas produzem bons efeitos imediatamente, ao passo que os atos inauspiciosos têm que ser realmente executados [para surtirem efeito]. Assim, ele nunca teve inveja da personalidade de Kali.

VERSO 8: Mahārāja Parīkṣit considerou que os homens menos inteligentes poderiam julgar a personalidade de Kali muito poderosa, mas que aqueles que fossem autocontrolados nada teriam a temer. O rei era poderoso como um tigre e zelava pelas pessoas tolas e descuidadas.

VERSO 9: Ó sábios, conforme vós me perguntastes, agora já descrevi quase tudo a respeito das narrações sobre o Senhor Kṛṣṇa no tocante à história do piedoso Mahārāja Parīkṣit.

VERSO 10: Aqueles que têm o desejo de alcançar a completa perfeição na vida devem ouvir submissamente todos os tópicos que estão vinculados com as atividades e qualidades transcendentais da Personalidade de Deus, que age maravilhosamente.

VERSO 11: Os bons sábios disseram: Ó grave Sūta Gosvāmī! Que vivas muitos anos e tenhas fama eterna, pois estás falando muito bem sobre as atividades do Senhor Kṛṣṇa, a Personalidade de Deus. Para seres mortais como nós, isso é exatamente como néctar.

VERSO 12: Acabamos de dar início à realização desta atividade fruitiva, um fogo sacrificatório, sem ter certeza sobre seus resultados, devido às muitas imperfeições de nossa ação. Nossos corpos enegreceram-se por causa da fumaça, mas estamos realmente satisfeitos com o néctar dos pés de lótus da Personalidade de Deus, Govinda, que tu estás distribuindo.

VERSO 13: O valor de um momento de associação com o devoto do Senhor não pode nem mesmo ser comparado a alcançar os planetas celestiais ou à liberação da matéria, para não falar das bênçãos mundanas sob a forma de prosperidade material, que se destinam àqueles cujo destino é a morte.

VERSO 14: A Personalidade de Deus, o Senhor Kṛṣṇa [Govinda], é o abrigo exclusivo para todos os grandes seres vivos, e Seus atributos transcendentais não podem sequer ser medidos por senhores de poderes místicos, tais como o senhor Śiva e o senhor Brahmā. Alguém hábil em saborear o néctar [rasa] poderia, algum dia, saciar-se plenamente ouvindo tópicos sobre Ele?

VERSO 15: Ó Sūta Gosvāmī, tu és um erudito e devoto puro do Senhor, pois a Personalidade de Deus é teu principal objeto de serviço. Portanto, descreve-nos, por favor, os passatempos do Senhor, que estão acima de toda a concepção material, porque estamos ansiosos por receber tais mensagens.

VERSO 16: Ó Sūta Gosvāmī, por favor, descreve esses tópicos sobre o Senhor pelos quais Mahārāja Parīkṣit, cuja inteligência estava fixa na liberação, alcançou os pés de lótus do Senhor, que é o abrigo de Garuḍa, o rei dos pássaros. Aqueles tópicos foram vibrados pelo filho de Vyāsa [Śrīla Śukadeva].

VERSO 17: Assim, por favor, conta-nos as narrações do Ilimitado, pois elas são purificantes e supremas. Elas foram faladas a Mahārāja Parīkṣit, e são muito queridas pelos devotos puros, sendo repletas de bhakti-yoga.

VERSO 18: Śrī Sūta Gosvāmī disse: Ó Deus, embora tenhamos nascido numa casta mista, ainda assim somos promovidos em direito inato simplesmente por servirmos e seguirmos os grandiosos que são avançados em conhecimento. Mesmo por conversar com essas grandes almas, uma pessoa pode purificar-se rapidamente de todas as desqualificações resultantes de nascimentos inferiores.

VERSO 19: E o que dizer daqueles que estão sob a direção dos grandes devotos, cantando o santo nome do Ilimitado, que tem potência ilimitada? A Personalidade de Deus, ilimitado em potência e transcendental por atributos, chama-se Ananta [Ilimitado].

VERSO 20: Agora está confirmado que Ele [a Personalidade de Deus] é ilimitado e que não há ninguém igual a Ele. Consequentemente, ninguém pode falar dEle de forma adequada. Grandes semideuses não podem obter o favor da deusa da fortuna nem mesmo por orações, mas essa mesma deusa presta serviço ao Senhor, embora Ele não deseje receber tal serviço.

VERSO 21: Quem pode ser digno do nome do Senhor Supremo além da Personalidade de Deus Śrī Kṛṣṇa? Brahmājī recolheu a água que emana das unhas de Seus pés para oferecê-la ao senhor Śiva como uma adoração de boas-vindas. Essa mesma água [o Ganges] está purificando todo o universo, incluindo o senhor Śiva.

VERSO 22: As pessoas autocontroladas que são apegadas ao Supremo Senhor Śrī Kṛṣṇa podem abandonar subitamente o mundo do apego material, incluindo o corpo grosseiro e a mente sutil, e podem partir para alcançar a perfeição máxima da ordem de vida renunciada e, consequentemente, não-violência e renúncia.

VERSO 23: Ó ṛṣis tão poderosamente puros como o Sol, tentarei descrever-vos os passatempos transcendentais de Viṣṇu de acordo com o meu conhecimento. Assim como os pássaros voam no céu tanto quanto lhes permitem suas capacidades, da mesma forma os devotos eruditos descrevem o Senhor tanto quanto lhes permitem suas compreensões.

VERSOS 24-25: Certa vez, Mahārāja Parīkṣit, enquanto se ocupava em caçar na floresta com arco e flechas, sentiu-se extremamente fatigado, faminto e sedento enquanto perseguia os veados. Enquanto procurava um reservatório d’água, ele entrou no eremitério do famoso Śamīka Ṛṣi e viu o sábio sentado silenciosamente com os olhos fechados.

VERSO 26: Os órgãos sensoriais, a respiração, a mente e a inteligência do muni estavam todos retraídos das atividades materiais, e ele estava situado num transe à parte dos três estados de consciência [vigília, sonho e inconsciência], tendo alcançado a posição transcendental de igualdade qualitativa com o Absoluto Supremo.

VERSO 27: O sábio em meditação estava coberto com pele de veado, e seu cabelo longo e escorrido espalhava-se sobre todo o seu corpo. O rei, cujo palato estava seco de sede, pediu-lhe água.

VERSO 28: Como o rei não foi recebido com as boas-vindas formais, não lhe tendo sido ofertado um assento, um cômodo, água e palavras agradáveis, ele se considerou negligenciado e, pensando assim, enfureceu-se.

VERSO 29: Ó brāhmaṇas, tendo sido perturbado pelas circunstâncias que o fizeram sedento e faminto, o rei dirigiu contra o sábio sua ira e sua inveja, algo que ele nunca dirigira a um brāhmaṇa.

VERSO 30: Sendo assim insultado, o rei, enquanto se retirava, pegou uma serpente morta com seu arco e, tomado de raiva, colocou-a sobre o ombro do sábio. Então, ele retornou a seu palácio.

VERSO 31: Ao retornar, ele começou a considerar e raciocinar consigo mesmo se o sábio estava realmente em meditação, com os sentidos concentrados e os olhos fechados, ou se ele havia somente fingido transe, apenas para evitar de receber um kṣatriya inferior.

VERSO 32: O sábio tinha um filho que era muito poderoso, uma vez que era filho de um brāhmaṇa. Enquanto brincava com meninos inexperientes, ele ficou sabendo da aflição de seu pai, que fora ocasionada pelo rei. Sem mais demora, o menino começou a falar o seguinte.

VERSO 33: [Śṛṅgi, o filho do brāhmaṇa, disse:] Oh! Vede só os pecados dos governantes que, como corvos e cães de guarda à porta, perpetram pecados contra seus senhores, contrariando os princípios que regem os servos.

VERSO 34: Os descendentes das ordens reais são claramente designados como cães de guarda e devem manter-se à porta. Com que fundamento os cães podem entrar na casa e exigir jantar com o dono no mesmo prato?

VERSO 35: Após a partida do Senhor Śrī Kṛṣṇa, a Personalidade de Deus e governante supremo de todos, esses indivíduos arrogantes têm florescido, uma vez que nosso protetor Se foi. Portanto, eu próprio me encarregarei disso e os castigarei. Testemunhai o meu poder!

VERSO 36: O filho do ṛṣi, com seus olhos vermelhos de ira, tocou a água do rio Kauśika enquanto falava com seus companheiros de folguedos e descarregou a seguinte tempestade de palavras.

VERSO 37: O filho do brāhmaṇa amaldiçoou o rei da seguinte maneira: No sétimo dia a partir de hoje, uma serpente alada picará o mais vil desta dinastia [Mahārāja Parīkṣit], pois ele violou as leis da etiqueta ao insultar meu pai.

VERSO 38: A seguir, quando o menino regressou ao eremitério, viu uma serpente no ombro de seu pai e, movido pela aflição, chorou muito alto.

VERSO 39: Ó brāhmaṇas, ao ouvir seu filho chorando, o ṛṣi, que nascera na família de Aṅgirā Muni, gradualmente abriu seus olhos e viu a serpente morta em torno de seu pescoço.

VERSO 40: Atirou de lado a serpente morta e perguntou a seu filho por que ele estava chorando, se alguém lhe fizera mal. Ao ouvir isso, o filho explicou-lhe o que tinha acontecido.

VERSO 41: O filho contou ao pai que havia amaldiçoado o rei, embora este nunca devesse ter sido condenado, pois era o melhor entre todos os seres humanos. O ṛṣi não pôde congratular-se com seu filho, mas, ao invés disso, começou a lamentar-se, dizendo: Ai de mim! Meu filho cometeu um ato pecaminoso terrível, aplicando uma pesada punição a uma ofensa insignificante.

VERSO 42: Ó meu filho, tua inteligência é imatura e, portanto, não tens conhecimento de que o rei, que é o melhor entre os seres humanos, é tão bom como a Personalidade de Deus. Ele nunca deve ser posto em pé de igualdade com os homens comuns. Os cidadãos do estado vivem em prosperidade, sendo protegidos pelos seus poderes insuperáveis.

VERSO 43: Meu caro filho, o Senhor, que carrega a roda de uma quadriga, é representado pelo regime monárquico, e, quando esse regime é abolido, todo o mundo se enche de ladrões, que então aniquilam imediatamente os súditos desprotegidos como se fossem cordeiros dispersos.

VERSO 44: Devido ao término dos regimes monárquicos e ao saque da riqueza do povo por parte de ladrões e salteadores, haverá grandes convulsões sociais. O povo será morto e ferido, e os animais e as mulheres serão raptados. E nós seremos os responsáveis por todos esses pecados.

VERSO 45: Nessa altura, as pessoas em geral se desviarão sistematicamente do caminho de uma civilização progressista com respeito às ocupações qualitativas das castas e ordens da sociedade e aos preceitos védicos. Assim, elas se atrairão mais pelo desenvolvimento econômico para o gozo dos sentidos, e, como resultado, haverá população indesejada ao nível de cães e macacos.

VERSO 46: O imperador Parīkṣit é um rei piedoso. Ele é altamente célebre e um devoto de primeira classe da Personalidade de Deus. Ele é um santo entre a realeza e executou muitos sacrifícios de cavalos. Quando semelhante rei está cansado ou fatigado, sendo atingido pela fome e pela sede, ele não merece ser amaldiçoado de modo algum.

VERSO 47: Então, o ṛṣi orou à onipenetrante Personalidade de Deus para que perdoasse seu filho imaturo, que não tinha inteligência e que cometera o grande pecado de amaldiçoar alguém que estava completamente livre de todos os pecados, que era subordinado e que merecia proteção.

VERSO 48: Os devotos do Senhor são tão indulgentes que mesmo que sejam difamados, trapaceados, amaldiçoados, perturbados, negligenciados ou mesmo mortos, nunca têm inclinação a se vingarem.

VERSO 49: Dessa maneira, o sábio se lamentou pelo pecado cometido por seu próprio filho. Ele não levou muito a sério o insulto cometido pelo rei.

VERSO 50: Em geral, os transcendentalistas, muito embora ocupados por outros nas dualidades do mundo material, não se afligem. Tampouco eles sentem prazer [em coisas mundanas], pois estão ocupados transcendentalmente.

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