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Capítulo Nove

O Aparecimento do Demônio Vṛtrāsura

Como se descreve neste capítulo, Indra, o rei dos céus, matou Viśvarūpa. Em consequência disso, o pai de Viśvarūpa executou um yajña para matar Indra. Quando, devido a esse yajña, Vṛtrāsura apareceu, os semideuses, com medo, buscaram refúgio na Suprema Persona­lidade de Deus e glorificaram-nO.

Devido à afeição que sentia pelos demônios, Viśvarūpa lhes fornecia secretamente os restos deixados no yajña. Ao tomar conhecimento disso, Indra decapitou Viśvarūpa; em seguida, porém, lamentou-se de ter matado Viśvarūpa, haja vista que Viśvarūpa era um brāhmaṇa. Embora pudesse anular as reações pecaminosas a que se sujeita aquele que mata um brāhmaṇa, Indra não tomou nenhuma medida para isso. Muito pelo contrário, preferiu aceitar as reações. Mais tarde, distribuiu as reações com a terra, a água, as árvores e as mulheres em geral. Como a terra aceitou um quarto das reações pecaminosas, uma parte da terra transformou-se em deserto. As árvores também receberam um quarto das reações pecaminosas, de modo que elas go­tejam seiva, a qual não se deve beber. Como aceitaram um quarto das reações pecaminosas, as mulheres são intocáveis durante o pe­ríodo menstrual. Uma vez que a água também foi infestada por reações pecaminosas, quando aparecem bolhas na água, ela não pode ser usada para nenhum propósito.

Depois que Viśvarūpa foi morto, Tvaṣṭā, seu pai, executou um sacrifício para matar o rei Indra. Infelizmente, se os mantras são can­tados de maneira irregular, produzem o resultado oposto. Foi isso o que aconteceu quando Tvaṣṭā executou esse yajña. Enquanto executava o sacrifício para matar Indra, Tvaṣṭā cantou um mantra para que os inimigos de Indra se tornassem mais numerosos, mas, como cantou o mantra de maneira errada, o sacrifício produziu um asura chamado Vṛtrāsura, de quem Indra era inimigo. Quando Vṛtrāsura foi gerado do sacrifício, seu aspecto feroz fez o mundo inteiro ficar amedrontado, e sua refulgência pessoal diminuiu até mesmo o poder dos semideuses. Não encontrando nenhum outro meio de proteção, os semideuses passaram a adorar a Suprema Personalidade de Deus, o desfrutador de todos os resultados dos sacrifícios e que é supremo em toda a extensão do universo. Todos os semideuses o adoraram porque, afinal, Ele, e nenhuma outra pessoa, pode proteger a entidade viva e livrá-la do medo e do perigo. Alguém que busca refúgio nos semideuses em vez de adorar a Suprema Personalidade de Deus fica em uma situação equivalente a tentar cruzar o oceano agarrando-se à cauda de um cachorro. Um cachorro pode nadar, mas isso não significa que alguém possa cruzar o oceano agarrando-se à cauda do animal.

Estando satisfeito com os semideuses, a Suprema Personalidade de Deus os aconselhou a se aproximarem de Dadhīci para lhe pedir os ossos de seu corpo. Dadhīci atenderia ao pedido dos semideuses, e, com a ajuda dos seus ossos, Vṛtrāsura poderia ser morto.

VERSO 1: Śrī Śukadeva Gosvāmī continuou: Viśvarūpa, que estava ocupado como sacerdote dos semideuses, tinha três cabeças. Usava uma para tomar a bebida soma-rasa, a outra para beber vinho e a terceira para ingerir alimentos. Ó rei Parīkṣit, foi isso o que as autoridades me falaram.

VERSO 2: Ó Mahārāja Parīkṣit, o vínculo que existia entre Viśvarūpa e os semideuses advinha do pai dele, e, portanto, ele visivelmente oferecia manteiga clarificada no fogo enquanto cantava mantras, tais como indrāya idaṁ svāhā [“isto se destina ao rei Indra”] e idam agnaye [“isto é para o semideus do fogo”]. Ele cantava esses mantras bem alto, e oferecia a cada um dos semideuses a parte que a esse tocava.

VERSO 3: Embora oferecesse manteiga clarificada no fogo do sacrifício em nome dos semideuses, ele também oferecia oblações aos demônios sem que os semideuses soubessem disso. Ele o fazia porque eram seus parentes por parte de mãe.

VERSO 4: Certa vez, entretanto, Indra, o rei dos céus, percebeu que Viśvarūpa estava enganando os semideuses, secretamente oferecendo obla­ções em benefício dos demônios. Ele ficou com muito medo de ser derrotado pelos demônios e, com grande ira contra Viśvarūpa, dece­pou suas três cabeças.

VERSO 5: Depois disso, a cabeça própria para beber soma-rasa foi transformada em kapiñjala [francolim]. Igualmente, a cabeça própria para beber vinho e transformou em um kalaviṅka [pardal], e a cabeça própria para ingerir alimentos se tornou um tittiri [perdiz comum].

VERSO 6: Embora fosse tão poderoso a ponto de poder neutralizar as reações pecaminosas a que se submete alguém que mata um brāhmaṇa, Indra, arrependido e de mãos postas, aceitou a carga dessas reações. Ele sofreu por um ano e, então, de maneira a se purificar, distribuiu entre a terra, a água, as árvores e as mulheres as reações desse assassinato pecaminoso.

VERSO 7: Em reconhecimento à bênção do rei Indra de que os buracos na terra se encheriam automaticamente, a terra aceitou um quarto das reações pecaminosas decorrentes do assassinato de um brāhmaṇa. De­vido a essas reações pecaminosas, encontramos muitos desertos na superfície da Terra.

VERSO 8: Como sinal de gratidão à bênção de Indra de que seus galhos e brotos voltariam a crescer quando podados, as árvores aceitaram um quarto das reações decorrentes do assassinato de um brāhmaṇa. Essas reações são visíveis no fluxo de seiva das árvores. [Portanto, proíbe-se que se beba essa seiva.]

VERSO 9: Em retribuição à bênção do senhor Indra de que seriam capazes de desfrutar de desejos luxuriosos continuamente, mesmo durante a gravidez, contanto que o ato sexual não prejudique o embrião, as mulheres aceitaram um quarto das reações pecaminosas. Como resultado dessas reações, a cada mês as mulheres manifestam os sinais da menstruação.

VERSO 10: E em sinal de agradecimento pela bênção do rei Indra de que a água aumentaria o volume das outras substâncias com que se misturasse, a água aceitou um quarto das reações pecaminosas. Por­tanto, aparecem bolhas e espumas na água. Quando alguém recolhe água, deve rejeitar as bolhas e espumas.

VERSO 11: Depois que Viśvarūpa foi morto, Tvaṣṭā, seu pai, executou ceri­mônias ritualísticas para matar Indra. Ofereceu oblações no fogo de sacrifício, dizendo: “Ó inimigo de Indra, cresce para matar o teu inimigo sem demora.”

VERSO 12: Depois disso, do lado sul do fogo de sacrifício conhecido como Anvāhārya, surgiu uma personalidade sinistra, que parecia o destrui­dor de toda a criação no final do milênio.

VERSOS 13-17: Como flechas disparadas aos quatro ventos, o corpo do demônio crescia a cada dia que passava. Alto e enegrecido, ele parecia uma co­lina chamuscada e era tão fúlgido como um resplandecente agrupa­mento de nuvens ao fim da tarde. O pelo do corpo do demônio e sua barba e bigode tinham a cor do cobre derretido, e seus olhos eram pe­netrantes como o sol do meio-dia. Ele parecia invencível, como se estivesse segurando os três mundos nas pontas do seu tridente em chamas. Dançando e gritando, ele fazia toda a superfície da Terra tremer, como se ela estivesse sendo abalada por um terremoto. À medida que bocejava repetidas vezes, parecia tentar engolir todo o céu com sua boca, que era tão profunda como uma caverna. Parecia estar lambendo todas as estrelas do céu com sua língua e comendo todo o universo com seus dentes longos e afiados. Vendo esse demônio gigantesco, todos, com grande medo, corriam de um lado para outro, em todas as direções.

VERSO 18: Por força de sua austeridade, aquele temível demônio, que, em verdade, era o filho de Tvaṣṭā, cobriu todos os sistemas planetários. Portanto, ele foi chamado de Vṛtra, ou aquele que tudo encobre.

VERSO 19: Com seus soldados, os semideuses, encabeçados por Indra, investiram contra o demônio, atacando-o com seus arcos, flechas e outras armas sobrenaturais, mas Vṛtrāsura engoliu todas essas armas.

VERSO 20: Pegos de surpresa e decepcionados ao verem a força do demônio, os semideuses perderam sua própria força. Por isso, todos eles se reuniram para tentar satisfazer a Superalma, a Suprema Personalidade de Deus, Nārāyaṇa, prestando-Lhe adoração.

VERSO 21: Os semideuses disseram: Os três mundos foram criados pelos cinco elementos – a saber, éter, ar, fogo, água e terra –, os quais são controlados por vários semideuses, começando com o senhor Brahmā. Tendo muito medo de que o fator tempo acabe com a nossa existência, oferecemos dádivas ao tempo, executando o trabalho que o tempo nos impõe. Contudo, o próprio fator tempo teme a Suprema Personalidade de Deus. Portanto, adoremos esse Senhor Supremo, pois apenas Ele pode conceder-nos completa proteção.

VERSO 22: Livre de todas as concepções da existência material e nunca Se deixando espantar por coisa alguma, o Senhor é sempre alegre e ple­namente satisfeito com Sua própria perfeição espiritual. Ele não tem designações materiais e, portanto, é estável e desapegado. Essa Su­prema Personalidade de Deus é o único refúgio de todos. Quem deseja ser protegido por outrem decerto é um grande tolo que pensa em cruzar o oceano se agarrando à cauda de um cachorro.

VERSO 23: O Manu chamado rei Satyavrata se salvou outrora ao amarrar ao chifre do avatāra Matsya, a encarnação de peixe, o pequeno bote do mundo inteiro. Pela graça do avatāra Matsya, Manu se salvou do grande perigo da inundação. Que essa mesma encarnação de peixe nos salve do grande e terrível perigo causado pelo filho de Tvaṣṭā.

VERSO 24: No começo da criação, um vento formidável provocou incontroláveis ondas de água inundante. As grandes ondas produziram um som tão horripilante que o senhor Brahmā, sentado no lótus, quase caiu na água da devastação, mas foi salvo pelo socorro do Senhor. Assim também, esperamos que o Senhor nos proteja desta condição perigosa.

VERSO 25: A Suprema Personalidade de Deus, que nos criou através de Sua potência externa e por cuja misericórdia expandimos a criação do universo, sempre está situado diante de nós como a Superalma, mas não podemos ver Sua forma. Somos incapazes de vê-lO porque todos nós pensamos que somos deuses separados e independentes.

VERSOS 26-27: Através de Sua inconcebível potência interna, a Suprema Personalidade de Deus assume vários corpos transcendentais e se expande como Vāmanadeva, a encarnação da força entre os semideuses; Paraśurāma, a encarnação entre os santos; Nṛsiṁhadeva e Varāha, encarnações entre os animais; e Matsya e Kūrma, encarnações entre os seres aquáticos. Entre todas as classes de entidades vivas, Ele aceita vários corpos transcendentais e, entre os seres humanos, Ele aparece especialmente como o Senhor Kṛṣṇa e o Senhor Rāma. Por Sua misericórdia imotivada, Ele protege os semideuses, que sempre são hostilizados pelos demônios. Ele é a Deidade suprema e digna da adoração de todas as entidades vivas. Ele é a causa suprema, repre­sentado como as energias criativas masculina e feminina. Embora diferente deste universo, Ele existe sob Sua forma universal [virāṭ­-rūpa]. Em nossa condição temerária, refugiemo-nos nEle, pois es­tamos certos de que o Senhor Supremo, a Alma Suprema, conferirá Sua proteção a nós.

VERSO 28: Śrī Śukadeva Gosvāmī disse: Meu querido rei, quando todos os semideuses Lhe ofereceram suas orações, o Senhor Hari, a Supre­ma Personalidade de Deus, portando Suas armas, o búzio, o disco e a maça, apareceu primeiramente dentro de seus corações e, em seguida, diante deles.

VERSOS 29-30: Cercando e servindo a Suprema Personalidade de Deus, Nārāyaṇa, havia dezesseis atendentes pessoais, decorados com ornamentos e com uma aparência idêntica à dEle, com a diferença de que lhes faltavam a marca de Śrīvatsa e a joia Kaustubha. Ó rei, ao verem o Senhor Supremo naquela postura, sorrindo com olhos que lembra­vam pétalas de lótus crescidas no outono, todos os semideuses fica­ram inundados de felicidade e, oferecendo daṇḍavats, imediatamente caíram como varas. Depois, levantaram-se lentamente e agradaram o Senhor oferecendo-Lhe orações.

VERSO 31: Os semideuses disseram: Ó Suprema Personalidade de Deus, sois competente para outorgar os resultados dos sacrifícios, e também sois o fator tempo que, chegado o momento, destrói todos esses re­sultados. Sois aquele que lançais o cakra para matar os demônios. Ó Senhor, possuidor de muitas variedades de nomes, nós Vos oferecemos respeitosas reverências.

VERSO 32: Ó controlador supremo, controlais os três destinos [promoção rumo aos planetas celestiais, nascimento como ser humano e condenação rumo ao inferno], e, ao mesmo tempo, Vossa morada suprema é o Vaikuṇṭha-dhāma. Como aparecemos apenas depois que criastes esta manifestação cósmica, é-nos impossível entender Vossas atividades. Portanto, tudo o que nos resta é oferecer-Vos nossas humildes reverências.

VERSO 33: Ó Suprema Personalidade de Deus, ó Nārāyaṇa, ó Vāsudeva, a pessoa original! Ó personalidade insigne, experiência suprema, bem-estar personificado! Ó bênção suprema, que tendes misericór­dia suprema e sois imutável! Ó alicerce da manifestação cósmica, proprietário único de todos os sistemas planetários, mestre de tudo e esposo da deusa da fortuna! Vossa Onipotência é depreendido pelos sannyāsīs mais elevados, que vagam mundo afora para pregar a cons­ciência de Kṛṣṇa, absortos em pleno samādhi através de bhakti-yoga. Porque suas mentes estão concentradas em Vós, seus corações ple­namente purificados podem acolher o conceito atinente à Vossa personalidade. Quando a escuridão em seus corações é erradicada por completo e Vós Vos revelais a eles, a bem-aventurança transcendental de que eles desfrutam é a forma transcendental de Vossa Onipotên­cia. Ninguém além dessas pessoas pode compreender-Vos. Portan­to, tudo o que fazemos é oferecer-Vos nossas respeitosas reverências.

VERSO 34: Ó Senhor, não precisais de auxílio algum e, embora não tenhais um corpo material, não precisais da nossa cooperação. Uma vez que sois a causa da manifestação cósmica e, sem sofrerdes nenhuma mudança, forneceis os seus ingredientes materiais, sozinho, Vós criais, mantendes e aniquilais esta manifestação cósmica. Entretanto, em­bora pareçais ocupado em atividades materiais, sois transcendental a todas as qualidades materiais. Em consequência disso, é extremamente difícil entender essas Vossas atividades transcendentais.

VERSO 35: Estas são nossas perguntas. A alma condicionada comum está su­jeita às leis materiais e, dessa maneira, recebe os frutos de suas ações. Vossa Onipotência, assim como acontece ao ser humano comum, existe dentro deste mundo material em um corpo produzido pelos modos materiais? Desfrutais ou sofreis os resul­tados positivos ou negativos das ações executadas sob a influência do tempo ou os resulta­dos das atividades passadas e assim por diante? Ou, em vez disso, estais presente aqui apenas como uma testemunha neutra que é autossuficiente, livre de todos os desejos materiais e sempre plena de potência espiritual? É certo que não podemos entender Vossa verdadeira posição.

VERSO 36: Ó Suprema Personalidade de Deus, todas as contradições podem ser dirimidas em Vós. Ó Senhor, como sois a Pessoa Suprema, o reservatório de ilimitadas qualidades espirituais, o controlador supremo, Vossas glórias ilimitadas são inconcebíveis para as almas condicionadas. Sem conhecer precisamente o certo, muitos teólogos modernos argumentam sobre o certo e o errado. Esses argumentos sempre são falsos e os julgamentos inconsistentes porque tais in­divíduos não têm a evidência autorizada de como proceder para conhecer-Vos. Porque suas mentes são agitadas pelas escrituras que contêm conclusões falsas, eles são incapazes de entender a verdade referente a Vós. Ademais, em razão de sua ansiedade poluída, às custas da qual querem chegar à conclusão certa, suas teorias são incapazes de revelar quem sois, Vós que transcendeis todas essas concepções ma­teriais. Ninguém se compara a Vós, e, portanto, em Vós, contradições tais como fazer e não fazer, felicidade e tristeza, não são contraditórias. Vossa potência é tamanha que pode fazer e desfazer qualquer coisa como bem quiserdes. Com a ajuda dessa potência, o que é impossível para Vós? Como em Vossa posição consti­tucional não há dualidade, podeis fazer tudo mediante a influência de Vossa energia.

VERSO 37: Uma corda causa medo a uma pessoa que, confusa, pensa estar diante de uma serpente, mas não a outrem que, com inteligência ade­quada, sabe que se trata apenas de uma corda. Do mesmo modo, Vós, como a Superalma no coração de todos, infundis temor ou destemor de acordo com a inteligência da pessoa, mas não há dualidade em Vós.

VERSO 38: Com discernimento, é possível ver que a Alma Suprema, em­bora manifesta de diferentes maneiras, é, de fato, o princípio básico de tudo. A totalidade da energia material é a causa da manifestação material, mas a energia material é causada por Ele. Portanto, Ele é a causa de todas as causas, aquele que manifesta a inteligência e os sentidos. Ele é percebido como a Superalma de tudo. Sem Ele, tudo estaria morto. Vós, como essa Superalma, o controlador supremo, sois tudo o que resta.

VERSO 39: Portanto, ó matador do demônio Madhu, incessante bem-aven­turança transcendental flui nas mentes daqueles que pelo menos uma vez saborearam uma simples gota do néctar do oceano de Vossas glórias. Tais devotos sublimes se esquecem do tênue reflexo emitido pela aparente felicidade material produzida pelos sentidos materiais de visão e audição. Livres de todos os desejos, esses devotos são os verdadeiros amigos de todas as entidades vivas. Oferecendo-Vos suas mentes e desfrutando de bem-aventurança transcendental, eles sabem muito bem como alcançar a verdadeira meta da vida. Ó Senhor, sois a alma e o querido amigo desses devotos, que nunca precisam regressar a este mundo material. Como eles poderiam deixar de ocupar­-se em Vosso serviço devocional?

VERSO 40: Ó Senhor, ó três mundos personificados, pai dos três mundos! Ó força dos três mundos, sob a forma da encarnação Vāmana! Ó Senhor sob a forma do Nṛsiṁhadeva de três olhos! Ó belíssima pessoa dentro dos três mundos! Tudo e todos, incluindo os seres humanos e até mesmo os demônios Daitya e os Dānavas, são mera expansão de Vossa energia. Ó pessoa supremamente poderosa, sempre apare­ceis sob as formas de várias encarnações para punir os demônios logo que eles se tornam muito poderosos. Apareceis como o Senhor Vāmanadeva, o Senhor Rāma e o Senhor Kṛṣṇa. Às vezes, assumis uma forma de animal, como o Senhor Javali, às vezes, uma encarnação mista, como o Senhor Nṛsiṁhadeva e o Senhor Hayagrīva, e, outras vezes, a forma de um ser aquático, tal qual o Senhor Peixe e a encarnação de Tartaruga. Assumindo essas várias formas, sempre punistes os demônios e os Dānavas. Portanto, oramos a Vossa Onipotência que, se assim o desejardes, apareçais hoje como outra encarnação para matar o grande demônio Vṛtrāsura.

VERSO 41: Ó protetor supremo, ó avô, ó pureza suprema, ó Senhor! Todos nós somos almas rendidas a Vossos pés de lótus. Com efeito, em meditação, nossas mentes estão atadas aos Vossos pés de lótus através da corrente do amor. Agora, por favor, manifestai Vossa encarna­ção. Aceitando-nos como Vossos próprios servos e devotos eternos, ficai satisfeito conosco e tende misericórdia de nós. Através de Vosso olhar cheio de amor, com seu refrescante e agradável sorriso misericordioso, bem como através das doces e nectáreas palavras que emanam de Vosso belo rosto, libertai-nos da ansiedade causada por este Vṛtrāsura, que sempre fere o âmago de nosso coração.

VERSO 42: Ó Senhor, assim como as pequenas centelhas de fogo não podem executar as ações de todo o fogo, nós, centelhas de Vossa Onipotência, não podemos informar-Vos sobre as necessidades de nossas vidas. Sois o todo completo. Portanto, o que precisamos informar-Vos? Vós já conheceis tudo porque sois a causa da qual se origina a manifestação cósmica, sois o mantenedor e aniquilador de toda a criação universal. Com Vossas energias espiritual e mate­rial, sempre Vos ocupais em Vossos passatempos, pois sois o controlador de todas essas várias energias. Existis dentro de todas as entidades vivas, dentro da manifestação cósmica e também além delas. Existis internamente como o Parabrahman e, externamente, como os ingredientes da criação material. Portanto, embora mani­festo em várias etapas, em diferentes épocas e lugares e em vários corpos, Vós, a Personalidade de Deus, sois a causa que origina todas as causas. Na verdade, sois o elemento original. Sois a testemunha de todas as atividades, mas, como sois tão grande como o céu, nenhuma delas jamais Vos influencia. Como o Parabrahman e o Paramātmā, sois a testemunha de tudo. Ó Suprema Personalidade de Deus, nada escapa ao Vosso saber.

VERSO 43: Querido Senhor, sois onisciente e, portanto, sabeis precisamente o motivo pelo qual nos refugiamos a Vossos pés de lótus, que proveem a sombra que nos alivia de todas as perturbações materiais. Já que sois o mestre espiritual supremo e conheceis tudo, buscamos o refúgio dos Vossos pés de lótus para recebermos instruções. Por favor, aliviai-nos, encerrando nossa atual aflição. Vossos pés de lótus são o único refúgio para um devoto plenamente rendido e são o único meio de superar todas as tribulações deste mundo material.

VERSO 44: Portanto, ó Senhor, ó controlador supremo, ó Senhor Kṛṣṇa, por favor, aniquilai este perigoso demônio Vṛtrāsura, filho de Tvaṣṭā, que já engoliu todas as nossas armas, nossos artigos de combate, bem como nossa força e influência.

VERSO 45: Ó Senhor, ó pureza suprema, viveis no âmago do coração de todos e observais todos os desejos e atividades das almas condicio­nadas. Ó Suprema Personalidade de Deus, conhecida como o Senhor Kṛṣṇa, Vossa reputação é brilhante e luminosa. Não tendes come­ço, pois sois o começo de tudo. Os devotos puros compreendem isso, porque sois facilmente acessível a quem é puro e veraz. Ao libertarem-se e, então, refugiarem-se em Vossos pés de lótus após terem divagado muitos milhões de anos por todo o mundo material, as almas condicionadas alcançam o sucesso máximo da vida. Portan­to, ó Senhor, ó Suprema Personalidade de Deus, oferecemos nossas respeitosas reverências a Vossos pés de lótus.

VERSO 46: Śrī Śukadeva Gosvāmī continuou: Ó rei Parīkṣit, quando os semi­deuses ofereceram essas suas sinceras orações ao Senhor, Ele as ouviu por causa de Sua misericórdia imotivada. Estando satisfeito, Ele respondeu, então, aos semideuses.

VERSO 47: A Suprema Personalidade de Deus disse: Ó amados semideuses, foi com grande conhecimento que Me oferecestes vossas orações, e decerto estou muito satisfeito convosco. A pessoa se liberta através desse conhecimento, e assim ela se lembra de minha posição elevada, que está acima das condições da vida material. Semelhante devoto se purifica por completo ao oferecer orações com pleno conhecimen­to. Essa é a fonte do serviço devocional a Mim.

VERSO 48: Ó melhores entre os semideuses inteligentes, embora seja verdade que aquele com quem estou satisfeito não tenha dificuldades para obter tudo o que deseje, o devoto puro, cuja mente está unicamente fixa em Mim, não Me pede nada além da oportunidade de se ocupar­ em Meu serviço devocional.

VERSO 49: Aqueles que pensam que os bens materiais são tudo o que existe ou que são a meta última da vida são chamados de avaros [kṛpaṇas]. Eles não conhecem a principal necessidade da alma. Ademais, se alguém favorece os desejos desses tolos, também deve ser conside­rado um tolo.

VERSO 50: O devoto puro, plenamente versado na ciência do serviço de­vocional, jamais instruirá um tolo a ocupar-se em atividades fruiti­vas que propiciam o gozo material, e, muito menos, iria ajudá-lo a executar semelhantes atividades. Tal devoto é como um médico experiente que jamais encoraja um paciente a comer alimentos pre­judiciais à sua saúde, mesmo que este os deseje.

VERSO 51: Ó Maghavan [Indra], desejo-te toda a boa fortuna. Aconselho­-te que te aproximes do grandioso santo Dadhyañca [Dadhīci]. Ele se aperfeiçoou imensamente em conhecimento e em cumprir votos e aus­teridades, e seu corpo é muito forte. Sem demora, vai até ele e lhe pede o seu corpo.

VERSO 52: Esse santo Dadhyañca, também conhecido como Dadhīci, assimilou pessoalmente a ciência espiritual e depois a transmitiu aos Aśvinī-kumāras. Afirma-se que Dadhyañca lhes deu mantras através da cabeça de um cavalo. Portanto, os mantras se chamam Aśvaśira. Após obterem de Dadhīci os mantras da ciência espiritual, os Aśvinī-kumāras se tornaram jīvan-muktas, liberados mesmo nesta vida.

VERSO 53: A invencível cobertura protetora de Dadhyañca, conhecida como Nārāyaṇa-kavaca, foi dada a Tvaṣṭā, que a entregou a seu filho Viśvarūpa, de quem a recebeste. Devido a esse Nārāyaṇa-kavaca, o corpo de Dadhīci agora é muito forte. Portanto, deves pedir-lhe o seu corpo.

VERSO 54: Quando, em prol de vós, os Aśvinī-kumāras pedirem o corpo de Dadhyañca, é evidente que, devido à afeição, ele o dará. Não duvideis disso, pois Dadhyañca é muito avançado em compreensão religiosa. Quando Dadhyañca vos der seu corpo, Viśvakarmā preparará um raio a partir dos ossos. É certo que esse raio matará Vṛtrāsura, pois estará revestido de Meu poder.

VERSO 55: Quando Vṛtrāsura for morto devido à Minha força espiritual, re­conquistareis vossa força, armas e riqueza. Assim, haverá toda a boa fortuna para todos vós. Embora Vṛtrāsura possa destruir todos os três mundos, não fiqueis com medo, pensando que ele vos ator­mentará. Afinal, ele também é um devoto e nunca vos invejará.

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