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Capítulo Vinte e Nove

Conversas entre Nārada e o Rei Prācīnabarhi

VERSO 1: O rei Prācīnabarhi respondeu: Meu caro senhor, não somos capazes de apreciar inteiramente o significado de vossa história alegórica do rei Purañjana. Na verdade, aqueles que são perfeitos em conhecimento espiritual podem entendê-la, mas, para nós, que estamos demasia­damente apegados a atividades fruitivas, é muito difícil compreender o significado de vossa história.

VERSO 2: O grande sábio Nārada Muni prosseguiu: Deves entender que Purañjana, a entidade viva, transmigra, de acordo com seu próprio trabalho, para diferentes classes de corpos, os quais podem ser de uma perna, duas pernas, três pernas, quatro pernas, muitas pernas ou simplesmente sem pernas. Transmigrando para essas várias classes de corpos, a entidade viva, como o suposto desfrutador, passa a ser conhecida como Purañjana.

VERSO 3: A pessoa que acabo de descrever como desconhecida é a Suprema Personalidade de Deus, o senhor e amigo eterno da entidade viva. Uma vez que as entidades vivas não podem perceber a Suprema Personalidade de Deus através de nomes, atividades ou qualidades materiais, Ele permanece perpetuamente desconhecido para a alma condicionada.

VERSO 4: Desejando desfrutar dos modos da natureza material em sua totalidade, a entidade viva prefere, dentre muitas formas corpóreas, aceitar o corpo que tem nove portões, duas mãos e duas pernas. Assim, ela prefere tornar-se um ser humano ou um semideus.

VERSO 5: O grande sábio Nārada continuou: A palavra pramadā mencionada a este respeito refere-se à inteligência material, ou à ignorância. Ela deve ser entendida assim. Alguém que se refugie nessa espécie de inteligência identifica-se com o corpo material. Influenciado pela consciência material de “eu” e “meu”, coloca-se a desfrutar e sofrer através de seus sentidos. Assim, a entidade viva é presa em uma armadilha.

VERSO 6: Os cinco sentidos funcionais e os cinco sentidos que adquirem conhecimento são todos amigos de Purañjanī. A entidade viva é assistida por esses sentidos na aquisição de conhecimento e no exercício de atividades. As ocupações dos sentidos são conhecidas como amigas, e a serpente, que, conforme se descreveu, tem cinco cabeças, é o ar vital que age dentro dos cinco processos circulatórios.

VERSO 7: O décimo primeiro assistente, que é o comandante dos demais, é conhecido como a mente. Ele é o líder dos sentidos, tanto para a aquisição de conhecimento quanto para a realização de trabalho. O reino Pañcāla é a atmosfera na qual se desfruta dos cinco objetos dos sentidos. Dentro desse reino Pañcāla, encontra-se a cidade do corpo, a qual tem nove portões.

VERSO 8: Os olhos, as narinas e os ouvidos são pares de portões situados em um lugar. A boca, o órgão genital e o ânus também são diferentes portões. Encontrando-se em um corpo com esses nove portões, a entidade viva age externamente no mundo material e goza de obje­tos dos sentidos, tais como as formas e os sabores.

VERSO 9: Dois olhos, duas narinas e uma boca – cinco ao todo – encontram-se na frente. O ouvido direito é tido como o portão meridional, e o ouvido esquerdo é o portão setentrional. As duas cavidades, ou por­tões, situadas no ocidente são conhecidas como o ânus e o órgão genital.

VERSO 10: Os dois portões chamados Khadyotā e Āvirmukhī, dos quais já se falou, são os dois olhos situados lado a lado em um só lugar. Deve-se compreender que a cidade chamada Vibhrājita é a forma. Dessa maneira, os dois olhos vivem ocupados em ver diferentes espécies de formas.

VERSO 11: As duas portas chamadas Nalinī e Nālinī representam as duas narinas, e a cidade chamada Saurabha representa o aroma. O com­panheiro mencionado como Avadhūta é o sentido do olfato. A porta chamada Mukhyā é a boca, e Vipaṇa é a faculdade da fala. Rasajña é o sentido do paladar.

VERSO 12: A cidade chamada Āpaṇa representa a faculdade de falar da língua, e Bahūdana é a variedade de alimentos. O ouvido direito se chama portão de Pitṛhū, e o esquerdo se chama portão de Devahū.

VERSO 13: Nārada Muni prosseguiu: A cidade chamada Dakṣiṇa-pañcāla representa as escrituras destinadas a orientar pravṛtti, o processo de gozo dos sentidos em atividades fruitivas. A outra cidade, chamada Uttara-pañcāla, representa as escrituras destinadas a diminuir as atividades fruitivas e aumentar o conhecimento. A entidade viva recebe diferentes espécies de conhecimento por intermédio dos dois ouvidos, e algumas entidades vivas são promovidas a Pitṛloka e outras a Devaloka. Tudo isso se torna possível através dos dois ouvidos.

VERSO 14: A cidade chamada Grāmaka, à qual se chega através do portão inferior chamado Āsurī [o órgão genital], destina-se ao sexo, o qual é muito agradável para homens comuns que não passam de tolos e patifes. A faculdade de procriação chama-se Durmada, e o ânus chama-se Nirṛti.

VERSO 15: Ao se dizer que Purañjana foi a Vaiśasa, isso significa que ele foi ao inferno. Lubdhaka, o sentido funcional do ânus, o acompanha. Anteriormente, falei também de dois associados cegos. Deve-se entender que esses associados são as mãos e as pernas. Valendo-se das mãos e das pernas, a entidade viva realiza toda espécie de trabalhos e se move de um lado a outro.

VERSO 16: A palavra antaḥ-pura se refere ao coração. A palavra viṣūcīna significa “indo a toda parte” e indica a mente. Dentro da mente, a entidade viva goza dos efeitos dos modos da natureza material. Tais efeitos causam ora ilusão, ora satisfação, ora júbilo.

VERSO 17: Anteriormente, explicou-se que a rainha é a inteligência da entidade viva. Durante a vigília ou o sono, essa inteligência cria diferentes situações. Deixando-se influenciar pela inteligência conta­minada, a entidade viva imagina algo e simplesmente imita as ações e reações de sua inteligência.

VERSOS 18-20: Nārada Muni continuou: Aquilo que mencionei como a quadriga era, na realidade, o corpo. Os sentidos são os cavalos que puxam essa quadriga. À medida que o tempo passa, ano após ano, esses cavalos correm sem obstáculos, mas, na verdade, eles não fazem pro­gresso algum. As atividades piedosas e ímpias são as duas rodas da quadriga. Os três modos da natureza material são as bandeiras da quadriga. As cinco classes de ar vital constituem o cativeiro da entidade viva, e a mente é considerada a rédea. A inteligência é o quadrigário. O coração é a boleia da quadriga, e as dualidades da vida, tais como prazer e dor, são as extremidades onde se amarram os tirantes. Os sete elementos são as coberturas da quadriga, e os sentidos funcionais são os cinco processos externos. Os onze sentidos são os soldados. Estando absorta em gozo dos sentidos, a enti­dade viva, sentada na quadriga, anseia pela satisfação de seus falsos desejos e corre em busca de gozo dos sentidos, vida após vida.

VERSO 21: Aquilo que foi anteriormente explicado como Caṇḍavega, o poderoso tempo, está coberto por dias e noites, chamados Gandharvas e Gandharvīs. A duração de vida do corpo é gradualmente reduzida com o transcurso dos dias e noites, que são em número de trezentos e sessenta.

VERSO 22: Aquilo que foi descrito como Kālakanyā deve ser compreendido como a velhice. Ninguém deseja aceitar a velhice, mas Yavaneśvara [Yavana-rāja], que é a morte, aceita Jarā [a velhice] como sua irmã.

VERSOS 23-25: Os seguidores de Yavaneśvara [Yamarāja] são chamados de soldados da morte, sendo conhecidos como as várias classes de perturbações pertinentes ao corpo e à mente. Prajvāra representa as duas espécies de febre: calor extremo e frio extremo – a febre tifoide e a pneumonia. A entidade viva deitada dentro do corpo é perturbada por muitas tribulações pertinentes à providência, a outras entidades vivas e a seus próprios corpo e mente. Apesar de toda espécie de tribulações, a entidade viva, sujeita às necessidades do corpo, da mente e dos sentidos e padecendo de várias espécies de doenças, deixa-se levar por muitos planos devido a seu desejo luxurioso de gozar do mundo. Embora transcendental a esta existência material, a entidade viva, por ignorância, aceita todos esses sofrimentos mate­riais sob o pretexto do falso egoísmo (“eu” e “meu”). Dessa maneira, ela vive por cem anos dentro deste corpo.

VERSOS 26-27: A entidade viva, por natureza, tem independência diminuta para escolher sua própria boa ou má fortuna, mas, esquecendo-se de seu mestre supremo, a Personalidade de Deus, ela se entrega aos modos da natureza material. Estando influenciada pelos modos da nature­za material, ela se identifica com o corpo e, pelo interesse do corpo, apega-se a várias atividades. Às vezes, fica sob a influência do modo da ignorância, outras vezes, sob a influência do modo da paixão e, outras vezes, sob a influência do modo da bondade. Assim, a entidade viva obtém diferentes espécies de corpos sob os modos da natureza material.

VERSO 28: Aqueles que estão situados no modo da bondade agem piedosamente, de acordo com os preceitos védicos. Assim, eles se elevam aos sistemas planetários superiores, onde vivem os semideuses. Aqueles que estão sob a influência do modo da paixão se ocupam em várias classes de atividades produtivas nos sistemas planetários onde vivem os seres humanos. Do mesmo modo, os influenciados pelo modo da escuridão se sujeitam a várias classes de sofrimentos e vivem no reino animal.

VERSO 29: Coberta pelo modo da ignorância na natureza material, a entidade viva ora é um ser masculino, ora um ser feminino, ora um eunuco, ora um ser humano, ora um semideus, ora um pássaro, ora uma fera e assim por diante. Dessa maneira, ela vaga dentro do mundo material. Sua aceitação de diferentes classes de corpos é provocada por suas atividades sob a influência dos modos da natureza.

VERSOS 30-31: A entidade viva é exatamente como um cachorro, o qual, dominado pela fome, vai de porta em porta em busca de alguma comida. Con­forme seu destino, às vezes o cão é castigado e enxotado e, outras vezes, recebe um pouco de alimento para comer. Analogamente, a enti­dade viva, sob a influência de tantos desejos, divaga por diferentes espécies de vida, conforme seu destino. Às vezes, ela está no alto e, às vezes, está em baixo. Ora ela vai aos planetas celestiais, ora vai ao inferno, ora ruma aos planetas intermediários, e assim por diante.

VERSO 32: As entidades vivas procuram neutralizar as diferentes condições dolorosas pertinentes à providência, a outras entidades vivas ou ao corpo e à mente. Mesmo assim, elas são obrigadas a permanecer condicionadas pelas leis da natureza, apesar de todas as tentativas de contrariar essas leis.

VERSO 33: Um homem poderá carregar uma carga sobre sua cabeça e, ao sentir que ela está muito pesada, descansará sua cabeça, colocando a carga sobre o ombro. Dessa maneira, ele tentará aliviar-se do peso. Contudo, qualquer processo que ele invente para anular a carga não fará nada mais do que mudar a mesma carga de um lugar para o outro.

VERSO 34: Nārada prosseguiu: Ó tu que estás livre de toda atividade pecaminosa! Ninguém pode neutralizar os efeitos de atividades fruitivas simplesmente inventando uma atividade diferente, desprovida de consciência de Kṛṣṇa. Todas essas atividades devem-se à nossa ignorância. Quando temos um sonho incômodo, não podemos nos livrar dele com uma alucinação incômoda. Só é possível neutralizar um sonho despertando. Do mesmo modo, nossa existência material deve-se à nossa ignorância e ilusão. A menos que despertemos para a consciência de Kṛṣṇa, não poderemos nos livrar desses sonhos. Para darmos a solução última de todos os problemas, devemos desper­tar para a consciência de Kṛṣṇa.

VERSO 35: Às vezes, sofremos porque vemos um tigre em um sonho ou uma serpente em uma visão, mas, na realidade, não existe nem tigre nem serpente. Assim, criamos uma situação de forma sutil e sofremos as consequências. Não podemos mitigar esses sofrimentos a menos que despertemos de nosso sonho.

VERSOS 36-37: O verdadeiro interesse da entidade viva é escapar da ignorância que faz com que ela sofra repetidos nascimentos e mortes. O único remédio é entregar-se à Suprema Personalidade de Deus através de Seu representante. A menos que prestemos serviço devocional à Suprema Personalidade de Deus, Vāsudeva, não temos possibili­dade de desapegar-nos por completo deste mundo material, nem nos é possível manifestar verdadeiro conhecimento.

VERSO 38: Ó melhor dos reis, alguém que é fiel, que está sempre ouvindo as glórias da Suprema Personalidade de Deus, que sempre se ocupa no cultivo da consciência de Kṛṣṇa e em ouvir a respeito das atividades do Senhor, muito em breve se habilita a ver a Suprema Personalidade de Deus face a face.

VERSOS 39-40: Meu querido rei, no lugar onde vivem os devotos puros, seguindo as regras e regulações e, deste modo, puramente conscientes e ocupados, com grande avidez, em ouvir e cantar as glórias da Suprema Personalidade de Deus – nesse lugar, se alguém obtiver a oportunidade de ouvir o constante fluir do néctar que emana deles, o qual é exatamente como as ondas de um rio, haverá de se esquecer das necessidades da vida – ou seja, da fome e da sede – e ficará imune a toda espécie de medo, lamentação e ilusão.

VERSO 41: Como a alma condicionada vive sendo perturbada pelas necessidades corpóreas, tais como fome e sede, ela tem pouquíssimo tempo para cultivar apego à audição das palavras nectáreas da Suprema Personalidade de Deus.

VERSOS 42-44: O poderosíssimo senhor Brahmā, o pai de todos os progenitores; o senhor Śiva; Manu, Dakṣa e outros governantes da humanidade; os quatro santos brahmacārīs de primeira classe, liderados por Sana­ka e Sanātana; os grandes sábios Marīci, Atri, Aṅgirā, Pulastya, Pulaha, Kratu, Bhṛgu e Vasiṣṭha, e minha humilde pessoa [Nārada] somos todos brāhmaṇas resolutos, capazes de falar com autoridade sobre a literatura védica. Nós somos muito poderosos devido às austeridades, meditação e educação. Entretanto, mesmo após in­dagar acerca da Suprema Personalidade de Deus, que sempre vemos, não O conhecemos perfeitamente.

VERSO 45: Apesar do cultivo de conhecimento védico, que é ilimitado, e da adoração a diferentes semideuses com característicos mantras védicos, a adoração a semideuses não nos ajuda a entender a suprema e poderosa Personalidade de Deus.

VERSO 46: Uma pessoa que se ocupa plenamente em serviço devocional é favorecida pelo Senhor, que lhe concede Sua imotivada misericórdia. Nesse momento, o devoto desperto abandona todas as atividades materiais e cerimônias ritualísticas mencionadas nos Vedas.

VERSO 47: Meu querido rei Barhiṣmān, nunca deves, por ignorância, adotar os rituais védicos ou as atividades fruitivas, os quais podem ser agradáveis de se ouvir ou que podem parecer a meta do interesse pessoal. Jamais deves aceitar essas coisas como a meta última da vida.

VERSO 48: Aqueles que são menos inteligentes aceitam as cerimônias ritualís­ticas védicas como tudo que existe. Eles desconhecem que o propósito dos Vedas é compreender nosso próprio lar, onde vive a Suprema Personali­dade de Deus. Não estando interessados em seu verdadeiro lar, eles andam iludidos à procura de outros lares.

VERSO 49: Meu querido rei, o mundo inteiro está coberto com as pontas afiadas da grama kuśa, e, baseado nisso, ficaste orgulhoso por teres matado várias espécies de animais em sacrifício. Devido à tua tolice, não sabes que o serviço devocional é o único meio pelo qual pode­mos satisfazer a Suprema Personalidade de Deus. Não podes entender esse fato. Tuas únicas atividades devem ser aquelas que podem satisfazer a Personalidade de Deus. Nossa educação deve ser tal que possamos nos elevar à consciência de Kṛṣṇa.

VERSO 50: Śrī Hari, a Suprema Personalidade de Deus, é a Superalma e guia de todas as entidades vivas que aceitaram corpos materiais dentro deste mundo. Ele é o controlador supremo de todas as atividades materiais na natureza material. Ele é também nosso melhor amigo, e todos devem refugiar-se a Seus pés de lótus. Fazendo-o, suas vidas serão auspiciosas.

VERSO 51: Uma pessoa ocupada em serviço devocional em nada teme a existência material. Isso porque a Suprema Personalidade de Deus é a Superalma e o amigo de todos. Quem conhece este segredo é realmente instruído, podendo tornar-se o mestre espiritual do mundo. Um mestre espiritual realmente fidedigno, representante de Kṛṣṇa, não é diferente de Kṛṣṇa.

VERSO 52: O grande santo Nārada prosseguiu: Ó grandiosa personalidade, respondi adequadamente tudo aquilo que me perguntaste. Agora, ouve outra narração, a qual é aceita por pessoas santas e é muito confidencial.

VERSO 53: Meu querido rei, por favor, procura aquele veado ocupado em comer grama em um belo jardim florido, junto com sua corça. Esse veado está muito apegado à sua ocupação, e está desfrutando do doce zumbido das abelhas em seu jardim. Procura entender a posição dele. Ele não está ciente de que, diante dele, há um tigre, acostumado a viver às custas da carne alheia. No encalço do veado, há também um caçador, ameaçando trespassá-lo com afiadas flechas. Assim, a morte do veado é iminente.

VERSO 54: Meu querido rei, a mulher, que é muito atrativa no início, mas muito perturbadora no final, é exatamente como a flor, que é atrativa no início e detestável no fim. Com a mulher, o ser vivo enreda­-se em desejos luxuriosos e goza de sexo, assim como alguém que desfruta do aroma de uma flor. Assim, o ser vivo leva uma vida de gozo dos sentidos – desde sua língua até seus órgãos genitais – e, dessa maneira, considera-se muito feliz na vida familiar. Unido com sua esposa, ele sempre permanece absorto nesses pensamentos. Sente muito prazer em ouvir as conversas de sua esposa e de seus filhos, as quais são como o doce zumbido de abelhas que colhem mel de flor em flor. Ele esquece que, diante dele, está o tempo, que reduz a duração de sua vida dia após dia, noite após noite. Ele não vê a redução gradual de sua vida, nem se importa com o superintendente da morte, que está tentando matá-lo pelas costas. Procura compreen­der isso. Tu estás em uma posição precária e estás sendo ameaçado de todos os lados.

VERSO 55: Meu querido rei, simplesmente tenta compreender o significado alegórico do veado. Sê plenamente consciente de ti mesmo e abandona o prazer de ouvir sobre a promoção aos planetas celestiais mediante ativi­dades fruitivas. Abandona a vida familiar, que é cheia de sexo, bem como histórias sobre tais assuntos, e refugia-te na Suprema Personalidade de Deus através da misericórdia das almas liberadas. Dessa maneira, por favor, abandona tua atração pela existência material.

VERSO 56: O rei respondeu: Meu querido brāhmaṇa, ouvi com grande aten­ção tudo o que dissestes e, considerando tudo isso, cheguei à con­clusão de que os ācāryas [mestres] que me ocuparam em atividades fruitivas ignoravam esse conhecimento confidencial. Se o tinham, por que não me explicaram?

VERSO 57: Meu querido brāhmaṇa, há contradições entre vossas instruções e as de meus mestres espirituais que me ocuparam em atividades fruitivas. Agora posso entender a distinção entre serviço devocional, conhecimento e renúncia. Eu carregava comigo algumas dúvidas acerca disso. Agora, porém, bondosamente dissipastes todas as minhas dúvidas. Agora posso entender que até mesmo os grandes sábios estão confusos quanto ao verdadeiro propósito da vida. Evidentemente, o gozo dos sentidos é algo que não devemos sequer cogitar.

VERSO 58: Os resultados de qualquer coisa que uma entidade viva faça nesta vida são desfrutados na vida seguinte.

VERSO 59: Os peritos conhecedores das conclusões védicas dizem como alguém desfruta ou sofre dos resultados de suas atividades passadas. Contudo, na prática, observa-se que o corpo que realizou o trabalho no último nascimento já se perdeu. Assim, como é possível desfrutar ou sofrer as reações daquele trabalho em um corpo diferente?

VERSO 60: O grande sábio Nārada prosseguiu: A entidade viva age em um corpo grosseiro nesta vida. Tal corpo é forçado a agir por meio do corpo sutil, composto de mente, inteligência e ego. Depois que o corpo grosseiro se perde, o corpo sutil continua a existir para desfrutar ou sofrer. Assim, não existe mudança.

VERSO 61: Enquanto sonha, a entidade viva abandona o próprio corpo vivo. Através das atividades de sua mente e de sua inteligência, ela atua em outro corpo, seja como um deus, seja como um cão. Após abandonar este corpo grosseiro, a entidade viva entra, quer em um corpo animal, quer em um corpo de semideus, neste planeta ou em outro planeta. Assim, ela goza dos resultados das ações de sua vida passada.

VERSO 62: A entidade viva trabalha sob a influência do conceito corpóreo: “Eu sou isso, eu sou aquilo. Esse é meu dever e, por isso, eu devo cumpri-lo.” Essas impressões são todas mentais, e essas atividades são todas temporárias; entretanto, pela graça da Suprema Persona­lidade de Deus, a entidade viva tem a oportunidade de realizar todas as suas invenções mentais. É assim que ela obtém outro corpo.

VERSO 63: Podemos entender a posição mental ou consciente de uma entidade viva através das atividades de duas classes de sentidos – os sentidos de adquirir conhecimento e os sentidos funcionais. De modo semelhante, através da condição mental ou da consciência de uma pessoa, podemos entender sua posição na vida anterior.

VERSO 64: Às vezes, experimentamos algo repentinamente, embora nunca o tivéssemos experimentado no corpo atual pela visão ou audição. Outras vezes, essas coisas nos aparecem, muito de repente, em nossos sonhos.

VERSO 65: Portanto, meu querido rei, a entidade viva, que tem uma cobertura mental sutil, desenvolve toda espécie de pensamentos e imagens devido a seu corpo anterior. Não tenhas dúvidas quanto a isso que eu compartilho. Inexiste a possibilidade de inventar qualquer coisa mentalmente sem que isso tenha sido percebido no corpo anterior.

VERSO 66: Ó rei, toda boa fortuna a ti! É a mente que faz a entidade viva obter determinada espécie de corpo, segundo o contato dela com a natureza material. Segundo a composição mental de cada entidade viva, podemos saber o que ela foi em sua vida pas­sada, bem como que espécie de corpo terá no futuro. Logo, é a mente quem indica os corpos passados e futuros.

VERSO 67: Às vezes, ao sonharmos, vemos algo nunca experimentado ou ouvido nesta vida, mas todos esses incidentes foram experimentados em outros tempos, em outros lugares e em outras condições.

VERSO 68: A mente da entidade viva continua a existir em vários corpos grosseiros, e, de acordo com os desejos que cada entidade viva tenha de gozo dos sentidos, a mente registra diferentes pensamentos. Essas imagens aparecem juntas na mente, sob a forma de dife­rentes combinações; portanto, às vezes, essas imagens parecem coisas nunca vistas ou nunca ouvidas anteriormente.

VERSO 69: Consciência de Kṛṣṇa significa associar-se constantemente com a Suprema Personalidade de Deus em um estado mental em que o devoto possa observar a manifestação cósmica do mesmo modo como a Suprema Personalidade de Deus o faz. Não é sempre que essa obser­vação é possível, mas, às vezes, ela se manifesta, tal qual o planeta escuro conhecido como Rāhu, que é observado na presença da lua cheia.

VERSO 70: Enquanto existir o corpo material sutil, composto de inteligência, mente, sentidos, objetos dos sentidos e as reações das qualidades materiais, também existirá a consciência de falsa identificação e seu objetivo relativo, o corpo grosseiro.

VERSO 71: Quando a entidade viva jaz em sono profundo, quando desmaia, quando fica muito traumatizada devido a uma grave perda, à hora da morte ou quando a temperatura do corpo está muito alta, o movimento do ar vital fica estagnado. Nesse momento, a entidade viva perde seu conhecimento, deixando de identificar o corpo com o eu.

VERSO 72: Na juventude, todos os dez sentidos e a mente são inteiramente visíveis. Contudo, no ventre materno ou na meninice, os órgãos dos sentidos e a mente permanecem cobertos, assim como a lua cheia é coberta pela escuridão da noite de lua nova.

VERSO 73: Quando a entidade viva sonha, os objetos dos sentidos não estão realmente presentes. Contudo, por ela ter-se associado com os objetos dos sentidos, estes se manifestam. Analogamente, a entidade viva com sentidos não desenvolvidos não deixa de existir material­mente, muito embora não esteja exatamente em contato com os objetos dos sentidos.

VERSO 74: Os cinco objetos dos sentidos, os cinco órgãos dos sentidos, os cinco sentidos de adquirir conhecimento e a mente constituem as dezesseis expansões materiais. Eles se combinam com a entidade viva e são influenciados pelos três modos da natureza material. É assim que se compreende a existência da alma condicionada.

VERSO 75: Em virtude dos processos do corpo sutil, a entidade viva desenvolve e abandona corpos grosseiros. Isso é conhecido como a transmigração da alma. Assim, a alma se sujeita a diferentes classes de ditos gozo, lamentação, temor, felicidade e tristeza.

VERSOS 76-77: A lagarta passa de uma folha a outra, agarrando-se a uma folha antes de abandonar a outra. De modo semelhante, de acordo com seu trabalho anterior, a entidade viva é forçada a assumir outro corpo antes de abandonar aquele que tem. Isso porque a mente é o reservatório de toda espécie de desejos.

VERSO 78: Enquanto desejarmos desfrutar de prazeres dos sentidos, criaremos atividades materiais. Quando a entidade viva age no campo material, ela goza dos sentidos e, ao fazê-lo, cria outra série de atividades materiais. Dessa maneira, a entidade viva fica enredada como alma condicionada.

VERSO 79: Deves saber sempre que esta manifestação cósmica é criada, mantida e aniquilada pela vontade da Suprema Personalidade de Deus. Em consequência disso, tudo dentro desta manifestação cósmica está sob o controle do Senhor. Para serem iluminadas por este conhecimento perfeito, as pessoas devem sempre ocupar-se em serviço devocional ao Senhor.

VERSO 80: O grande sábio Maitreya prosseguiu: O devoto supremo, o grande santo Nārada, explicou assim ao rei Prācīnabarhi a posição constitucional da Suprema Personalidade de Deus e da entidade viva. Após fazer um convite ao rei, Nārada Muni partiu, retor­nando a Siddhaloka.

VERSO 81: Na presença de seus ministros, o santo rei Prācīnabarhi deixou ordens instruindo que seus filhos protegessem os cidadãos. Então, ele deixou o lar e partiu para se submeter a austeridades em um lugar sagrado conhecido como Kapilāśrama.

VERSO 82: Tendo praticado austeridades e penitências em Kapilāśrama, o rei Prācīnabarhi libertou-se plenamente de todas as designações mate­riais. Ele se ocupou constantemente no transcendental serviço amo­roso ao Senhor e alcançou uma posição espiritual qualitativamente igual à da Suprema Personalidade de Deus.

VERSO 83: Meu querido Vidura, todo aquele que ouvir esta narração a respeito da compreensão da existência espiritual da entidade viva, como foi descrita pelo grande sábio Nārada, ou que a relatar a outros, ficará livre do conceito corpóreo de vida.

VERSO 84: Esta narração proferida pelo grande sábio Nārada está repleta da fama transcendental da Suprema Personalidade de Deus. Em consequência disso, essa narração, quando descrita, certamente santifica este mundo material. Ela purifica o coração da entidade viva e a ajuda a alcançar sua identidade espiritual. Todo aquele que relatar esta narração transcendental se libertará de todo o cativeiro mate­rial e não terá mais que perambular dentro deste mundo material.

VERSO 85: A alegoria do rei Purañjana, descrita aqui de acordo com a auto­ridade, é plena de conhecimento espiritual, e eu a ouvi da parte de meu mestre espiritual. Se alguém puder entender o propósito desta alegoria, certamente se aliviará do conceito corpóreo e entenderá com clareza a vida após a morte. Mesmo alguém com dificuldade de entender o que é a transmigração da alma poderá compreender esse tópico por completo estudando esta história.

VERSOS 1a-2a: Na sociedade animal, também, observa-se o desejo de manter o corpo, a esposa e os filhos. Os animais têm plena inteligência para administrar tais afazeres. Se um ser humano só é avançado nesse sentido, qual é, então, a diferença entre ele e um animal? Deve-se ter muito cuidado em entender que esta vida humana é alcançada depois de muitos e muitos nascimentos no processo evolutivo. Um homem erudito que abandone o conceito corpóreo de vida, tanto grosseiro quanto sutil, haverá de se tornar, através da iluminação pelo conhecimento espiritual, uma proeminente alma espiritual individual, assim como o Senhor Supremo.

VERSO 1b : Se uma entidade viva tiver consciência de Kṛṣṇa desenvolvida e for misericordiosa para com os outros, e se o seu conhecimento espiritual de autorrealização for perfeito, ela se libertará imediata­mente do cativeiro da existência material.

VERSO 2b: Tudo que acontece dentro do tempo, que consiste em passado, presente e futuro, não passa de mero sonho. Essa é a compreensão secreta de toda a literatura védica.

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