No edit permissions for Português

Capítulo Seis

A Liberação de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya

Em seu Amṛta-pravāha-bhāṣya, Śrīla Bhaktivinoda Ṭhākura faz o seguinte estudo resumido do sexto capítulo: Ao entrar no templo de Jagannātha, Śrī Caitanya Mahāprabhu desmaiou de imediato. Então, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya levou-O para a sua casa. Nesse ínterim, Gopīnātha Ācārya, o cunhado de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, encontrou-se com Mukunda Datta e conversou com ele sobre a aceitação de sannyāsa por parte de Caitanya Mahāprabhu e sobre Sua viagem a Jagannātha Purī. Após ficar sabendo que Śrī Caitanya Mahāprabhu desmaiara e fora carregado para a casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, o povo se aglomerou ali para ver o Senhor. Enquanto isso, Śrīla Nityānanda Prabhu e os outros devotos visitavam o templo de Jagannātha. Quando eles voltaram à casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, Śrī Caitanya Mahāprabhu recobrou Sua consciência externa. Sārvabhauma Bhaṭṭācārya acolheu a todos e distribuiu mahā-prasāda com muito carinho. Sārvabhauma Bhaṭṭācārya foi, então, apresentado a Śrī Caitanya Mahāprabhu e arrumou acomodações para Ele na casa de sua tia. Gopīnātha Ācārya, seu cunhado, reconhecia o Senhor Caitanya Mahāprabhu como o próprio Kṛṣṇa, mas Sārvabhauma e seus muitos discípulos não podiam aceitar esse fato.
Contudo, Gopīnātha Ācārya convenceu Sārvabhauma de que ninguém pode entender a Suprema Personalidade de Deus sem que Ele o favoreça. Provou através dos śāstras, citando as escrituras reveladas, que Śrī Caitanya Mahāprabhu é o próprio Kṛṣṇa, em pessoa. Ainda assim, Sārvabhauma não levou muito a sério essas afirmações. Ao ouvir todos aqueles argumentos, Caitanya Mahāprabhu disse a Seus devotos que Sārvabhauma era Seu mestre espiritual e que tudo o que ele dizia por afeição era para o benefício de todos.

Ao encontrar-se com Śrī Caitanya Mahāprabhu, Sārvabhauma pediu-Lhe que o ouvisse explanar a filosofia vedānta. Śrī Caitanya Mahāprabhu aceitou essa proposta, ouvindo por sete dias consecutivos a explicação de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya sobre o Vedānta-sūtra. Entretanto, o Senhor manteve-Se calado. Devido ao Seu silêncio, o Bhaṭṭācārya perguntou-Lhe se estava compreendendo a filosofia vedānta, ao que o Senhor respondeu: “Cavalheiro, embora Eu possa entender muito bem a filosofia vedānta, não posso entender tuas explicações.” Então, houve um debate entre o Bhaṭṭācārya e Śrī Caitanya Mahāprabhu a respeito da autoridade das escrituras védicas, especificamente das Upaniṣads e do Vedānta-sūtra. O Bhaṭṭācārya era impersonalista, mas Śrī Caitanya Mahāprabhu provou que a Verdade Absoluta é a Suprema Personalidade de Deus. Mostrou serem incorretos os conceitos dos filósofos māyāvādīs a respeito da Verdade Absoluta impessoal.

A Verdade Absoluta não é impessoal nem destituída de poder. O maior erro que os filósofos māyāvādīs cometem é conceber a Verdade Absoluta como impessoal e sem energia. Em todos os Vedas, aceitam-se as ilimitadas energias da Verdade Absoluta. Aceita-se também que a Verdade Absoluta tem Sua forma transcendental, bem-aventurada e eterna. Segundo os Vedas, tanto o Senhor quanto a entidade viva são iguais em qualidade, mas são diferentes quantitativamente. A verdadeira filosofia da Verdade Absoluta afirma que o Senhor e Sua criação são inconcebível e simultaneamente iguais e diferentes. A conclusão é que, na verdade, os filósofos māyāvādīs são ateístas. Sārvabhauma e Caitanya Mahāprabhu discutiram muito sobre esse assunto, mas, a despeito de todos os seus esforços, o Bhaṭṭācārya foi, por fim, derrotado.

A pedido de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, Śrī Caitanya Mahāprabhu explicou, então, o verso ātmārāma do Śrīmad-Bhāgavatam de dezoito maneiras diferentes. Quando o Bhaṭṭācārya ficou convencido, Śrī Caitanya Mahāprabhu revelou-lhe Sua verdadeira identidade. Então, o Bhaṭṭācārya recitou cem versos em louvor ao Senhor Caitanya Mahāprabhu e Lhe prestou suas reverências. Depois disso, Gopīnātha Ācārya e todos os demais, tendo visto as potências maravilhosas do Senhor Caitanya Mahāprabhu, se encheram de júbilo.

Certa manhã, após esse incidente, Śrī Caitanya Mahāprabhu recebeu um pouco de prasāda de Jagannātha e a ofereceu a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya. Sem ligar para formalidades, imediatamente o Bhaṭṭācārya partilhou da mahā-prasāda. Em um outro dia, quando o Bhaṭṭācārya perguntou a Śrī Caitanya Mahāprabhu qual era a melhor maneira de adorar e meditar, o Senhor aconselhou-o a cantar o mahā-mantra Hare Kṛṣṇa. Em outro dia, o Bhaṭṭācārya quis mudar a leitura do verso tat te ’nukampām, pois não gostava da palavra mukti-pada. Ele a quis substituir pela palavra bhakti-pada. Śrī Caitanya Mahāprabhu aconselhou Sārvabhauma a não mudar a leitura do Śrīmad-Bhāgavatam, pois mukti-pada indicava os pés de lótus da Suprema Personalidade de Deus, o Senhor Kṛṣṇa. Visto que se tornara um devoto puro, o Bhaṭṭācārya disse: “Porque o significado é obscuro, ainda prefiro bhakti-pada.” Com isso, Śrī Caitanya Mahāprabhu e os outros habitantes de Jagannātha Purī ficaram muito satisfeitos. Assim, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya tornou-se um vaiṣṇava puro, e os outros estudiosos eruditos de lá o seguiram.

VERSO 1: Ofereço minhas respeitosas reverências ao Senhor Gauracandra, a Suprema Personalidade de Deus, que converteu em grande devoto o insensível Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, o reservatório de toda lógica defeituosa. 

VERSO 2: Todas as glórias ao Senhor Caitanya Mahāprabhu! Todas as glórias ao Senhor Nityānanda Prabhu! Todas as glórias a Advaita Ācārya! E todas as glórias aos devotos do Senhor Caitanya!

VERSO 3: Em êxtase, Śrī Caitanya Mahāprabhu foi de Āṭhāranālā para o templo de Jagannātha. Após ver o Senhor Jagannātha, Ele ficou muito inquieto devido ao amor a Deus.

VERSO 4: O Senhor Śrī Caitanya Mahāprabhu foi rapidamente abraçar o Senhor Jagannātha, mas, ao entrar no templo, foi tomado tão fortemente de amor por Deus que desmaiou e caiu ao chão.

VERSO 5: Quando Śrī Caitanya Mahāprabhu caiu, coincidiu de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya vê-lO. Ao perceber o guarda ameaçando bater no Senhor, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya de imediato o proibiu de fazê-lo.

VERSO 6: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya ficou muito surpreso vendo a beleza pessoal do Senhor Caitanya Mahāprabhu, bem como as transformações transcendentais produzidas em Seu corpo devido ao amor a Deus.

VERSO 7: Śrī Caitanya Mahāprabhu permaneceu inconsciente por um longo tempo. Nesse ínterim, chegou a hora de oferecer prasāda ao Senhor Jagannātha, e o Bhaṭṭācārya tentou pensar em um remédio.

VERSO 8: Enquanto o Senhor Caitanya Mahāprabhu estava inconsciente, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, com o auxílio dos guardas e de alguns discípulos, carregou-O para sua casa e O deitou em um aposento muito santificado.

VERSO 9: Examinando o corpo de Śrī Caitanya Mahāprabhu, Sārvabhauma verificou que Seu abdômen não se mexia, e que Ele não respirava. Ao ver Sua condição, o Bhaṭṭācārya ficou muito preocupado.

VERSO 10: Então, o Bhaṭṭācārya pegou um fino floco de algodão e o colocou perante as narinas do Senhor. Ao ver o algodão se mover muito levemente, ele ficou esperançoso.

VERSO 11: Sentado ao lado de Śrī Caitanya Mahāprabhu, ele pensou: “Esta é uma transformação de êxtase transcendental provocada pelo amor a Kṛṣṇa.”

VERSO 12: Ao ver o sinal de sūddīpta-sāttvika, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya logo pôde entender a transcendental transformação extática no corpo do Senhor Caitanya Mahāprabhu. Tal sinal se manifesta apenas no corpo de devotos eternamente liberados.

VERSO 13: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya considerou: “Os incomuns sintomas extáticos de adhirūḍha-bhāva estão aparecendo no corpo de Śrī Caitanya Mahāprabhu. Isso é muito maravilhoso! Como é possível que se manifestem no corpo de um ser humano?”

VERSO 14: Enquanto o Bhaṭṭācārya pensava dessa maneira em sua casa, todos os devotos de Caitanya Mahāprabhu, liderados por Nityānanda Prabhu, aproximaram-se do Siṁha-dvāra [a porta de entrada do templo].

VERSO 15: Lá, os devotos ouviram o povo conversando sobre um mendicante que chegara a Jagannātha Purī e visitara a Deidade de Jagannātha.

VERSO 16: O povo dizia que o sannyāsī caíra inconsciente ao ver a Deidade do Senhor Jagannātha. Como Sua consciência não retornava, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya levou-O para sua casa.

VERSO 17: Ouvindo isso, os devotos puderam entender que estavam falando do Senhor Caitanya Mahāprabhu. Nessa altura, chegou Śrī Gopīnātha Ācārya.

VERSO 18: Gopīnātha Ācārya era habitante de Nadia, genro de Viśārada e devoto de Caitanya Mahāprabhu. Ele conhecia a verdadeira identidade de Sua Onipotência.

VERSO 19: Gopīnātha Ācārya já conhecia Mukunda Datta, e, ao vê-lo em Jagannātha Purī, ficou muito admirado.

VERSO 20: Ao se encontrar com Gopīnātha Ācārya, Mukunda Datta lhe prestou reverências. Após abraçar Mukunda Datta, Gopīnātha Ācārya lhe pediu notícias de Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 21: Mukunda Datta respondeu: “O Senhor já chegou aqui. Viemos com Ele.”

VERSO 22: Assim que Gopīnātha Ācārya viu Nityānanda Prabhu, prestou-Lhe suas reverências. Dessa maneira, encontrando todos os devotos, pediu repetidamente notícias do Senhor Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 23: Mukunda Datta continuou: “Após aceitar a ordem de sannyāsa, o Senhor Caitanya Mahāprabhu veio a Jagannātha Purī e trouxe conSigo todos nós.”

VERSO 24: “O Senhor Caitanya Mahāprabhu deixou nossa companhia e caminhou à frente para ver o Senhor Jagannātha. Acabamos de chegar e agora estamos à procura dEle.”

VERSO 25: “Pelo que diz o povo em geral, concluímos que o Senhor agora Se encontra na casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.”

VERSO 26: “Ao ver o Senhor Jagannātha, Caitanya Mahāprabhu ficou em êxtase e caiu inconsciente, e Sārvabhauma Bhaṭṭācārya levou-O para sua casa nessas condições.”

VERSO 27: “Justamente agora, eu estava pensando em te encontrar, e, por acaso, de fato nos encontramos.”

VERSO 28: “Primeiro vamos todos à casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya para vermos Caitanya Mahāprabhu. Mais tarde, iremos ver o Senhor Jagannātha.”

VERSO 29: Ouvindo isso e se sentindo muito satisfeito, Gopīnātha Ācārya imediatamente levou todos os devotos com ele e se aproximou da casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.

VERSO 30: Ao chegarem à casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, todos viram o Senhor deitado inconsciente. Vendo-O naquela condição, Gopīnātha Ācārya ficou muito triste, mas, ao mesmo tempo, feliz de poder ver o Senhor.

VERSO 31: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya permitiu que todos os devotos entrassem em sua casa, e, ao ver Nityānanda prabhu, prestou-Lhe suas reverências.

VERSO 32: Sārvabhauma acolheu todos os devotos os recepcionando adequadamente. Todos estavam contentes de ver o Senhor Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 33: Então, o Bhaṭṭācārya mandou todos voltarem para ver o Senhor Jagannātha, pedindo a seu próprio filho, Candaneśvara, para os acompanhar como guia.

VERSO 34: Todos ficaram muito satisfeitos de ver a Deidade do Senhor Jagannātha. O Senhor Nityānanda, em particular, ficou arrebatado em êxtase.

VERSO 35: Quando o Senhor Nityānanda Prabhu estava quase desmaiando, todos os devotos O seguraram e O equilibraram. Nessa altura, o sacerdote do Senhor Jagannātha trouxe uma guirlanda que fora oferecida à Deidade e a deu a Nityānanda Prabhu.

VERSO 36: Todos ficaram contentes de receber aquela guirlanda usada pelo Senhor Jagannātha. Em seguida, todos regressaram ao local onde Se encontrava o Senhor Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 37: Então, todos os devotos começaram a cantar o mantra Hare Kṛṣṇa em voz alta. Pouco antes do meio-dia, o Senhor recuperou Sua consciência.

VERSO 38: Caitanya Mahāprabhu levantou-Se e cantou bem alto: “Hari! Hari!” Sārvabhauma Bhaṭṭācārya ficou muito satisfeito ao ver o Senhor recuperar a consciência, e pegou a poeira dos pés de lótus do Senhor.

VERSO 39: O Bhaṭṭācārya informou a todos eles: “Por favor, tomai vosso banho do meio-dia imediatamente. Hoje hei de vos oferecer mahā-prasāda, os restos do alimento oferecido ao Senhor Jagannātha.”

VERSO 40: Após banharem-se no mar, Śrī Caitanya Mahāprabhu e Seus devotos regressaram sem demora. Então, o Senhor lavou Seus pés e Se sentou em uma esteira para almoçar.

VERSO 41: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya providenciou para que trouxessem diversas espécies de mahā-prasāda do templo de Jagannātha. Śrī Caitanya Mahāprabhu almoçou, então, com grande alegria.

VERSO 42: Caitanya Mahāprabhu foi servido de arroz especial e legumes de primeira classe em pratos de ouro. Assim, Ele almoçou na companhia de Seus devotos.

VERSO 43: Enquanto Sārvabhauma Bhaṭṭācārya distribuía pessoalmente a prasāda, o Senhor Caitanya Mahāprabhu lhe pediu: “Por favor, dá-Me apenas legumes cozidos.”

VERSO 44: “Podes oferecer os bolos e outras preparações feitas com leite condensado a todos os devotos.” Ao ouvir isso, o Bhaṭṭācārya juntou suas mãos e falou o seguinte.

VERSO 45: “Hoje, por favor, todos vós tratai de saborear o almoço exatamente como o Senhor Jagannātha o aceitou.”

VERSO 46: Após dizer isso, ele fez todos comerem os diversos bolos e preparações de leite condensado. Após alimentá-los, ofereceu-lhes água para lavarem as mãos, os pés e a boca.

VERSO 47: Pedindo permissão ao Senhor Caitanya Mahāprabhu e a Seus devotos, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya foi, então, almoçar com Gopīnātha Ācārya. Terminado seu almoço, eles regressaram até o Senhor Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 48: Prestando suas reverências a Caitanya Mahāprabhu, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse: “Namo nārāyaṇāya” [Ofereço minhas reverências a Nārāyaṇa]. Caitanya Mahāprabhu disse: “Kṛṣṇe matir astu” [Que tua atenção se fixe em Kṛṣṇa].

VERSO 49: Ao ouvir estas palavras, Sārvabhauma entendeu que o Senhor Caitanya era um sannyāsī vaiṣṇava.

VERSO 50: Então, Sārvabhauma disse a Gopīnātha Ācārya: “Gostaria de saber em que posição Caitanya Mahāprabhu estava antes de tomar sannyāsa.”

VERSO 51: Gopīnātha Ācārya respondeu: “Certo homem chamado Jagannātha residia em Navadvīpa, e seu sobrenome era Miśra Purandara.”

VERSO 52: “O Senhor Caitanya Mahāprabhu é filho desse Jagannātha Miśra, e Seu nome anterior era Viśvambhara Miśra. Além disso, Ele é neto de Nīlāmbara Cakravartī.”

VERSO 53: O Bhaṭṭācārya disse: “Nīlāmbara Cakravartī foi colega de escola de meu pai, Maheśvara Viśārada. Foi assim que ele o conheceu.”

VERSO 54: “Jagannātha Miśra Purandara era respeitado por meu pai. Assim, devido à relação deles com meu pai, eu respeito tanto Jagannātha Miśra quanto Nīlāmbara Cakravartī.”

VERSO 55: Ouvindo que Śrī Caitanya Mahāprabhu pertencia ao distrito de Nadia, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya ficou muito satisfeito e se dirigiu ao Senhor da seguinte maneira.

VERSO 56: “És naturalmente respeitável. Além disso, és um sannyāsī. Daí o meu desejo de me tornar Teu servo pessoal.”

VERSO 57: Logo que ouviu isso do Bhaṭṭācārya, Caitanya Mahāprabhu lembrou-Se do Senhor Viṣṇu e começou a lhe falar humildemente como segue.

VERSO 58: “Por seres professor de filosofia vedānta, és o mestre de todas as pessoas do mundo, bem como seu benquerente. És também o benfeitor de toda classe de sannyāsīs.”

VERSO 59: “Sou um jovem sannyāsī e, na verdade, não tenho conhecimento do que é bom e do que é ruim. Refugio-Me em ti, portanto, e te aceito como o Meu mestre espiritual.”

VERSO 60: “Vim aqui só para Me associar contigo, e agora Me refugio em ti. Poderias, por favor, manter-Me, quaisquer que forem as circunstâncias?”

VERSO 61: “O incidente ocorrido hoje foi um grande obstáculo para Mim, mas bondosamente Me aliviaste dele.”

VERSO 62: O Bhaṭṭācārya respondeu: “Não deves ir ver a Deidade no templo de Jagannātha sozinho. É melhor que procures ir comigo ou com meus homens.”

VERSO 63: O Senhor disse: “Jamais entrarei no templo, mas ficarei ao lado do Garuḍa-stambha sempre que Eu for ver o Senhor.”

VERSO 64: Então, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse a Gopīnātha Ācārya: “Leva o Gosvāmījī e Lhe mostra o Senhor Jagannātha.”

VERSO 65: “Além disso, o aposento pertencente à minha tia materna se encontra em um local muito solitário. Faze todos os arranjos para que Ele permaneça lá.”

VERSO 66: Assim, Gopīnātha Ācārya levou o Senhor Caitanya Mahāprabhu até aquela residência e Lhe mostrou onde encontrar água, tinas e jarros d’água. Na verdade, ele providenciou tudo.

VERSO 67: No dia seguinte, Gopīnātha Ācārya levou o Senhor Caitanya Mahāprabhu para ver o despertar do Senhor Jagannātha de manhã cedo.

VERSO 68: Então, Gopīnātha Ācārya se fez acompanhar de Mukunda Datta até a casa de Sārvabhauma. Ao chegarem lá, Sārvabhauma disse o seguinte a Mukunda Datta.

VERSO 69: “O sannyāsī é muito manso e humilde por natureza, e Sua pessoa é muito bela de se ver. Consequentemente, sinto aumentar minha afeição por Ele.”

VERSO 70: “De que sampradāya Ele aceitou a ordem de sannyāsa e qual é o Seu nome?”

VERSO 71: Gopīnātha Ācārya respondeu: “O nome do Senhor é Śrī Kṛṣṇa Caitanya, e Seu preceptor de sannyāsa é o afortunadíssimo Keśava Bhāratī.”

VERSO 72: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse: “‘Śrī Kṛṣṇa’ é um ótimo nome. Ele, porém, pertence à comunidade Bhāratī. Logo é um sannyāsī de segunda classe.”

VERSO 73: Gopīnātha Ācārya respondeu: “Śrī Kṛṣṇa Caitanya Mahāprabhu não depende de nenhuma formalidade externa. Ele não precisa aceitar a ordem de sannyāsa de um sampradāya superior.”

VERSO 74: O Bhaṭṭācārya perguntou: “Śrī Caitanya Mahāprabhu está em plena juventude. Como Ele consegue manter Seus princípios de sannyāsa?”

VERSO 75: “Recitarei a filosofia vedānta continuamente perante Caitanya Mahāprabhu para que Ele possa permanecer fixo em Sua renúncia, assumindo, assim, o caminho do monismo.”

VERSO 76: Então, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya sugeriu: “Se Śrī Caitanya Mahāprabhu quisesse, eu O poderia introduzir em um sampradāya de primeira classe, oferecendo-Lhe roupa açafroada e realizando o processo reformatório mais uma vez.”

VERSO 77: Gopīnātha Ācārya e Mukunda Datta ficaram muito tristes ao ouvirem isso. Portanto, Gopīnātha Ācārya se dirigiu a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya da seguinte maneira.

VERSO 78: “Meu caro Bhaṭṭācārya, não conheces a grandeza do Senhor Caitanya Mahāprabhu. Todos os sintomas da Suprema Personalidade de Deus se encontram nEle no grau máximo.”

VERSO 79: Gopīnātha Ācārya prosseguiu: “O Senhor Caitanya Mahāprabhu é famoso como a Suprema Personalidade de Deus. Aqueles que são ignorantes a esse respeito acham muito difícil entender a conclusão dos homens de conhecimento.”

VERSO 80: Os discípulos de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya retrucaram: “Com que evidência concluis que Śrī Caitanya Mahāprabhu é o Senhor Supremo?” Gopīnātha Ācārya respondeu: “Dão prova disso as afirmações de ācāryas autorizados que compreendem a Suprema Personalidade de Deus.”

VERSO 81: Os discípulos do Bhaṭṭācārya disseram: “Nós obtemos conhecimento da Verdade Absoluta através de hipóteses lógicas.”Gopīnātha Ācārya respondeu: “Não se pode alcançar verdadeiro conhecimento da Suprema Personalidade de Deus por meio de tais hipóteses lógicas ou argumentos.”

VERSO 82: Gopīnātha Ācārya prosseguiu: “Só se pode compreender a Suprema Personalidade de Deus através de Sua misericórdia, e não por adivinhações ou hipóteses.”

VERSO 83: O Ācārya continuou: “Caso alguém receba mesmo uma porção, por mínima que seja, do favor do Senhor em virtude do serviço devocional, ele pode entender a natureza da Suprema Personalidade de Deus.”

VERSO 84: “‘Meu Senhor, se alguém é favorecido mesmo que por apenas um ligeiro indício da misericórdia de Teus pés de lótus, pode compreender a grandeza de Tua personalidade. Mas aqueles que especulam a fim de compreender a Suprema Personalidade de Deus são incapazes de Te conhecer, muito embora continuem a estudar os Vedas por muitos anos.’”

VERSOS 85-86: Então, Gopīnātha Ācārya se dirigiu a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya: “És um grande erudito e mestre de muitos discípulos. Na verdade, não há na Terra nenhum outro estudioso igual a ti. Não obstante, por não teres sequer uma gota da misericórdia do Senhor, não O podes compreender, muito embora Ele esteja presente em tua casa.”

VERSO 87: “Não é por tua culpa, mas pelo veredito das escrituras. Não podes entender a Suprema Personalidade de Deus simplesmente por erudição.”

VERSO 88: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya respondeu: “Meu caro Gopīnātha Ācārya, por favor, fala com muito cuidado. Que prova tens de teres recebido a misericórdia do Senhor?”

VERSO 89: Gopīnātha Ācārya respondeu: “O conhecimento do summum bonum, a Verdade Absoluta, é a evidência da misericórdia do Senhor Supremo.”

VERSO 90: Gopīnātha Ācārya prosseguiu: “Viste os sintomas da Suprema Personalidade de Deus no corpo de Śrī Caitanya Mahāprabhu enquanto Ele esteve absorto em êxtase.”

VERSO 91: “A despeito de teres percebido diretamente os sintomas do Senhor Supremo no corpo de Śrī Caitanya Mahāprabhu, não O podes compreender. Comumente, chama-se isso de ilusão.”

VERSO 92: “Uma pessoa influenciada pela energia externa se chama bahirmukha jana, ou pessoa mundana, pois, a despeito de sua percepção, não pode entender a verdadeira substância.” Ao ouvir Gopīnātha Ācārya dizer isso, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya sorriu e começou a falar o seguinte.

VERSO 93: O Bhaṭṭācārya disse: “Estamos apenas discutindo entre amigos e considerando os pontos mencionados nas escrituras. Não fiques zangado. Simplesmente falo com base nos śāstras. Por favor, não fiques ofendido.”

VERSO 94: “Decerto que Śrī Caitanya Mahāprabhu é um devoto grandioso e incomum, mas não O podemos aceitar como uma encarnação do Senhor Viṣṇu, pois, segundo os śāstras, não há encarnação nesta era de Kali.”

VERSO 95: “Outro nome do Senhor Viṣṇu é Triyuga, pois não há encarnação do Senhor Viṣṇu em Kali-yuga. Na verdade, esse é o veredito das escrituras reveladas.”

VERSO 96: Ao ouvir isso, Gopīnātha Ācārya ficou muito triste. Ele disse ao Bhaṭṭācārya: “Tu te consideras o conhecedor de todas as escrituras védicas.”

VERSO 97: “O Śrīmad-Bhāgavatam e o Mahābhārata são as duas escrituras védicas mais importantes, mas não prestaste atenção às suas afirmações.”

VERSO 98: “O Śrīmad-Bhāgavatam e o Mahābhārata afirmam que o Senhor aparece diretamente, mas tu dizes que, nesta era, não há qualquer manifestação ou encarnação do Senhor Viṣṇu.”

VERSO 99: “Nesta era de Kali, não há līlā-avatāra da Suprema Personalidade de Deus, daí Ele ser conhecido como Triyuga. Esse é um de Seus santos nomes.”

VERSO 100: Gopīnātha Ācārya prosseguiu: “Decerto que há uma encarnação em cada era, e tal encarnação se chama yuga-avatāra. Porém, teu coração ficou tão endurecido por lógica e argumentos que não podes considerar todos esses fatos.”

VERSO 101: “‘No passado, teu filho teve corpos de três diferentes cores, de acordo com a era. Essas cores foram branca, vermelha e amarela. Nesta era [Dvāpara-yuga], Ele aceitou um corpo enegrecido.”

VERSO 102: “‘Na era de Kali, bem como em Dvāpara-yuga, as pessoas oferecem orações à Suprema Personalidade de Deus com diversos mantras e observam os princípios reguladores dos textos védicos suplementares. Agora, por favor, ouve-me falar sobre isto.’”

VERSO 103: “‘Nesta era de Kali, aqueles que são inteligentes realizam o canto congregacional do mahā-mantra Hare Kṛṣṇa, adorando a Suprema Personalidade de Deus, que aparece nesta era sempre descrevendo as glórias de Kṛṣṇa. Essa encarnação é de tez amarela e vive na companhia de Suas expansões plenárias [tais como Śrī Nityānanda Prabhu], e de Suas expansões pessoais [tais como Gadādhara], bem como de Seus devotos e associados [tais como Svarūpa Dāmodara].’”

VERSO 104: “‘O Senhor [na encarnação de Gaurasundara] tem uma tez dourada. Na verdade, todo o Seu corpo, que é muito bem constituído, é como o ouro derretido. Ele tem todo o corpo untado com polpa de sândalo. Ele aceitará a quarta ordem de vida espiritual (sannyāsa) e será muito autocontrolado. Ele Se distinguirá dos sannyāsīs māyāvādīs por estar fixo em serviço devocional e propagar o movimento de saṅkīrtana.’”

VERSO 105: Então, Gopīnātha Ācārya disse: “Não adianta citar tantas evidências dos śāstras, pois és um especulador extremamente árido. Não há necessidade de semear a terra estéril.”

VERSO 106: “Quando o Senhor ficar satisfeito contigo, também compreenderás estas conclusões e citarás os śāstras.”

VERSO 107: “Os falsos argumentos e os malabarismos filosóficos de palavras de teus discípulos não são culpa deles. Eles simplesmente receberam a bênção da filosofia māyāvāda.”

VERSO 108: “‘Ofereço minhas respeitosas reverências à Suprema Personalidade de Deus, que é pleno de qualidades ilimitadas e cujas diferentes potências provocam acordo e desacordo entre disputadores. Assim, a energia ilusória continuamente encobre a autorrealização de ambos os contendores.’”

VERSO 109: “‘Em quase todos os casos, tudo o que os brāhmaṇas eruditos falam é aceito; nada é impossível para quem se refugia em Minha energia ilusória e fala sob a influência dela.’”

VERSO 110: Após ouvir isso de Gopīnātha Ācārya, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse: “Primeiro, vai até o local onde está hospedado Śrī Caitanya Mahāprabhu e O convida aqui com Seus associados. Convida-O em meu nome.”

VERSO 111: “Leva jagannātha-prasāda e primeiro podes dá-la a Caitanya Mahāprabhu e a Seus associados. Depois disso, volta aqui e me dá boas lições.”

VERSO 112: Gopīnātha Ācārya era cunhado de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya; o relacionamento deles, portanto, era muito doce e íntimo. Em tais circunstâncias, Gopīnātha Ācārya ora o ensinava o blasfemando, ora o elogiando, ora rindo dele. Isso se sucedia desde algum tempo.

VERSO 113: Śrīla Mukunda Datta se sentiu muito satisfeito ao ouvir as afirmações conclusivas de Gopīnātha Ācārya, mas ficou muito triste e aborrecido ao ouvir as afirmações apresentadas por Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.

VERSO 114: De acordo com as instruções de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, Gopīnātha Ācārya foi até Śrī Caitanya Mahāprabhu e O convidou em nome do Bhaṭṭācārya.

VERSO 115: As afirmações do Bhaṭṭācārya foram discutidas perante Śrī Caitanya Mahāprabhu. Gopīnātha Ācārya e Mukunda Datta desaprovavam as afirmações do Bhaṭṭācārya, pois essas lhes causavam aflição mental.

VERSO 116: Ao ouvir isso, Śrī Caitanya Mahāprabhu disse: “Não faleis dessa maneira. Sārvabhauma Bhaṭṭācārya tem demonstrado grande afeição e misericórdia para coMigo.”

VERSO 117: “Por afeição paterna para coMigo, ele quer Me proteger e se certificar de que Eu siga os princípios reguladores de um sannyāsī. Que mal há nisso?”

VERSO 118: Na manhã seguinte, Śrī Caitanya Mahāprabhu e Sārvabhauma Bhaṭṭācārya visitaram juntos o templo do Senhor Jagannātha. Ambos estavam muito bem-humorados.

VERSO 119: Ao entrarem no templo, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya ofereceu um assento a Caitanya Mahāprabhu, ao passo que ele próprio se sentou no chão, prestando o devido respeito que merece um sannyāsī.

VERSO 120: Então, começou a instruir o Senhor Caitanya Mahāprabhu sobre a filosofia vedānta e, com apreço e devoção, falou o seguinte ao Senhor.

VERSO 121: O Bhaṭṭācārya disse: “A principal função de um sannyāsī é ouvir a filosofia vedānta. Portanto, sem hesitar, deves estudar a filosofia vedānta, ouvindo-a incessantemente de uma pessoa superior.”

VERSO 122: O Senhor Caitanya respondeu: “És muito misericordioso coMigo, e, assim sendo, acho que é Meu dever obedecer à tua ordem.”

VERSO 123: Assim, por sete dias consecutivos, Śrī Caitanya Mahāprabhu ouviu a filosofia vedānta exposta por Sārvabhauma Bhaṭṭācārya. Entretanto, Caitanya Mahāprabhu não dizia nada nem comentava se a filosofia apresentada estava certa ou errada. Ele simplesmente ficava ali sentado e ouvia o Bhaṭṭācārya.

VERSO 124: No oitavo dia, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse a Caitanya Mahāprabhu: “Há sete dias Tu ouves minha apresentação da filosofia vedānta.”

VERSO 125: “Tens simplesmente ouvido em constante silêncio. Já que não dizes o que pensas, se está correto ou errado, não posso saber se realmente entendes a filosofia vedānta ou não.”

VERSO 126: Śrī Caitanya Mahāprabhu respondeu: “Sou um tolo, em consequência do que não estudo o Vedānta-sūtra. Só estou tentando ouvi-lo de ti porque assim Me ordenaste.”

VERSO 127: “Só escuto em nome do cumprimento dos deveres da ordem de vida renunciada. Infelizmente, não posso entender nada do significado que apresentas.”

VERSO 128: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya respondeu: “Aceito que não entendes, mas mesmo quem não entende faz perguntas sobre o assunto.”

VERSO 129: “Estás ouvindo vezes e mais vezes, apesar do que ficas em silêncio. Não posso entender o que, na realidade, se passa dentro de Tua mente.”

VERSO 130: Então, Śrī Caitanya Mahāprabhu revelou Seu pensamento, dizendo: “Posso entender bem claramente o significado de cada sūtra, mas tuas explicações simplesmente confundiram Minha mente.”

VERSO 131: “Os versos do Vedānta-sūtra contêm significados claros em si mesmos, mas os outros significados que apresentaste simplesmente encobriram o sentido do sūtra como uma nuvem.”

VERSO 132: “Não explicas o sentido direto dos Brahma-sūtras. Na verdade, parece que o teu interesse é encobrir o sentido verdadeiro.”

VERSO 133: Caitanya Mahāprabhu prosseguiu: “O Vedānta-sūtra é o resumo de todas as Upaniṣads; portanto, todo o sentido direto existente nas Upaniṣads também está registrado no Vedānta-sūtra, ou Vyāsa-sūtra.”

VERSO 134: “Deve-se aceitar, sem interpretações, o sentido direto de cada verso. No entanto, simplesmente abandonas o sentido direto e prossegues com tua interpretação imaginativa.”

VERSO 135: “Embora haja outra evidência, deve-se aceitar a evidência dada na versão védica como a principal. As versões védicas compreendidas diretamente são evidências de primeira classe.”

VERSO 136: Caitanya Mahāprabhu continuou: “Búzio e estrume de vaca não são nada mais do que os ossos e o excremento de algumas entidades vivas, mas, segundo a versão védica, consideram-se ambos muito puros.”

VERSO 137: “As afirmações védicas são evidentes por si mesmas. Devemos aceitar tudo o que nelas se afirma. Caso as interpretemos de acordo com nossa própria imaginação, a autoridade dos Vedas se perde de imediato.”

VERSO 138: Śrī Caitanya Mahāprabhu prosseguiu: “O Brahma-sūtra, escrito por Śrīla Vyāsadeva, é radiante como o Sol. Quem tenta interpretar seu significado só faz encobrir esse brilho do Sol com uma nuvem.”

VERSO 139: “Toda a literatura védica e outros textos que seguem estritamente os princípios védicos afirmam que o Brahman Supremo é a Verdade Absoluta, o maior de todos e um aspecto do Senhor Supremo.”

VERSO 140: “Na realidade, a Suprema Verdade Absoluta é uma pessoa, a Suprema Personalidade de Deus, plena de todas as opulências. Tentas explicá-lO como sendo impessoal e sem forma.”

VERSO 141: “Onde quer que apareça uma descrição impessoal nos Vedas, os Vedas pretendem estabelecer que todas as coisas pertencentes à Suprema Personalidade de Deus são transcendentais e destituídas de características mundanas.”

VERSO 142: Śrī Caitanya Mahāprabhu continuou: “‘Todos os mantras védicos que descrevem a Verdade Absoluta impessoalmente apenas provam, no final, que a Verdade Absoluta é uma pessoa. Compreende-se o Senhor Supremo sob dois aspectos – o impessoal e o pessoal. Caso alguém considere a Suprema Personalidade de Deus sob ambos os aspectos, ele pode realmente compreender a Verdade Absoluta. Ele sabe que a compreensão pessoal é mais poderosa, pois verificamos que todas as coisas são plenas de variedade. Ninguém pode ver algo que não seja pleno de variedade.’”

VERSO 143: “Tudo na manifestação cósmica emana da Verdade Absoluta, permanece na Verdade Absoluta e, após a aniquilação, entra mais uma vez na Verdade Absoluta.”

VERSO 144: “Os aspectos pessoais da Suprema Personalidade de Deus são classificados em três casos – a saber, ablativo, instrumental e locativo.”

VERSOS 145-146: Śrī Caitanya Mahāprabhu prosseguiu: “Ao desejar tornar-Se muitos, a Suprema Personalidade de Deus lançou Seu olhar sobre a energia material. Antes da criação, não havia nem olhos nem mente mundanos. Portanto, isso confirma a natureza transcendental da mente e dos olhos da Verdade Absoluta.”

VERSO 147: “A palavra ‘Brahman’ indica a completa Suprema Personalidade de Deus, que é Śrī Kṛṣṇa. Esse é o veredito de toda a literatura védica.”

VERSO 148: “Os homens comuns não podem compreender facilmente o significado confidencial dos Vedas; as palavras dos Purāṇas, portanto, suplementam esse significado.”

VERSO 149: “‘Quão grandemente afortunados são Nanda Mahārāja, os vaqueiros e todos os habitantes de Vrajabhūmi! A fortuna deles é ilimitada, pois a Verdade Absoluta, a fonte de bem-aventurança transcendental, o eterno Brahman Supremo, tornou-Se amigo deles.’”

VERSO 150: “O mantra védico ‘apāṇi-pāda’ rejeita mãos e pernas materiais, mas afirma que o Senhor anda muito rápido e aceita tudo o que seja oferecido a Ele.”

VERSO 151: “Todos esses mantras confirmam que a Verdade Absoluta é pessoal, mas os māyāvādīs, desfazendo-se do sentido direto, interpretam a Verdade Absoluta como sendo impessoal.”

VERSO 152: “Acaso descreves como sem forma tal Suprema Personalidade de Deus cuja forma transcendental tem a plenitude das seis opulências transcendentais?”

VERSO 153: “A Suprema Personalidade de Deus tem três potências primárias. Acaso estás tentando estabelecer que Ele não tem potências?”

VERSO 154: “‘Como provam os śāstras, a potência interna do Senhor Supremo, Viṣṇu, é espiritual. Há outra potência espiritual, conhecida como kṣetra-jña, ou a entidade viva. A terceira potência, que é conhecida como ignorância, torna a entidade viva ímpia e a satura de atividades fruitivas.’”

VERSO 155: “‘Ó rei, a kṣetra-jña-śakti é a entidade viva. Embora tenha a possibilidade de viver, quer no mundo material, quer no espiritual, ela sofre as três espécies de misérias da existência material, pois se deixa influenciar pela potência avidyā [ignorância, que encobre sua posição constitucional].’”

VERSO 156: “‘Esta entidade viva, coberta pela influência da ignorância, existe sob diferentes formas no ambiente material. Ó rei, ela, assim, é proporcionalmente livre da influência da energia material, em graus maiores ou menores.’”

VERSO 157: “‘A Suprema Personalidade de Deus é sac-cid-ānanda-vigraha. Isso significa que Ele tem, originalmente, três potências – a potência de prazer, a potência de eternidade e a potência de conhecimento. Juntas, elas são chamadas de potência cit, estando presentes plenamente no Senhor Supremo. Para as entidades vivas, que são partes integrantes do Senhor, a potência de prazer no mundo material é às vezes desagradável e às vezes mista. Isso não se aplica à Suprema Personalidade de Deus, pois Ele não está sob a influência da energia material ou de seus modos.’”

VERSO 158: “A Suprema Personalidade de Deus, em Sua forma original, é plena de eternidade, conhecimento e bem-aventurança. A potência espiritual sob esses três aspectos [sat, cit e ānanda] assume três formas diferentes.”

VERSO 159: “Os três aspectos da potência espiritual chamam-se hlādinī [o aspecto de bem-aventurança], sandhinī [o aspecto de eternidade] e samvit [o aspecto de conhecimento]. Aceitamos o conhecimento desses três aspectos como conhecimento pleno da Suprema Personalidade de Deus.”

VERSO 160: “Além disso, a potência espiritual da Suprema Personalidade de Deus aparece em três fases – interna, marginal e externa –, as quais são todas ocupadas em Seu serviço devocional amoroso.”

VERSO 161: “Em Sua potência espiritual, o Senhor Supremo goza de seis classes de opulências. Tu não aceitas essa potência espiritual, e isso se deve ao teu grande atrevimento.”

VERSO 162: “O Senhor é o amo das potências, e a entidade viva é serva delas. Essa é a diferença entre o Senhor e a entidade viva. No entanto, tu declaras que o Senhor e as entidades vivas são a mesma coisa.”

VERSO 163: “A Bhagavad-gītā estabelece que a entidade viva é a potência marginal da Suprema Personalidade de Deus. Todavia, dizes que a entidade viva é inteiramente diferente do Senhor.”

VERSO 164: “‘Terra, água, fogo, ar, éter, mente, inteligência e falso ego são Minhas oito energias separadas.’”

VERSO 165: “‘Além destas energias inferiores, que são materiais, ó poderoso guerreiro, há outra energia, a energia espiritual, que é o ser vivo. As entidades vivas sustentam o mundo material inteiro.’”

VERSO 166: “A forma transcendental da Suprema Personalidade de Deus é plena de eternidade, conhecimento e bem-aventurança. No entanto, tu dizes que essa forma transcendental é um produto da bondade material.”.

VERSO 167: “Aquele que não aceita a forma transcendental do Senhor é certamente um agnóstico. Não se deve olhar nem tocar tal indivíduo. Na verdade, ele está sujeito à punição de Yamarāja.”

VERSO 168: “Os budistas não reconhecem a autoridade dos Vedas, razão pela qual são considerados agnósticos. No entanto, aqueles que se refugiaram nas escrituras védicas e, ao mesmo tempo, pregam o agnosticismo de acordo com a filosofia māyāvāda certamente são mais perigosos do que os budistas.”

VERSO 169: “Śrīla Vyāsadeva apresentou a filosofia vedānta para a libertação das almas condicionadas, mas, caso alguém ouça o comentário de Śaṅkarācārya, esse alguém perde tudo isso.”

VERSO 170: “O Vedānta-sūtra almeja estabelecer que a manifestação cósmica passa a existir graças à transformação da potência inconcebível da Suprema Personalidade de Deus.”

VERSO 171: “A pedra filosofal, após tocar no ferro, produz grande quantidade de ouro sem se transformar. Analogamente, a Suprema Personalidade de Deus manifesta-Se como a manifestação cósmica mediante Sua potência inconcebível, mas permanece imutável em Sua eterna forma transcendental.”

VERSO 172: “A teoria de Śaṅkarācārya afirma que a Verdade Absoluta Se transforma. Ao aceitarem essa teoria, os filósofos māyāvādīs denigrem Śrīla Vyāsadeva, acusando-o de erro. Assim, encontram defeitos no Vedānta-sūtra e interpretam-no para tentar estabelecer a teoria da ilusão.”

VERSO 173: “Pode-se aplicar a teoria da ilusão apenas quando a entidade viva se identifica com o corpo. Quanto à manifestação cósmica, não se pode considerá-la falsa, embora certamente seja temporária.”

VERSO 174: “A vibração transcendental oṁkāra é a forma sonora da Suprema Personalidade de Deus. Essa representação sonora do Senhor Supremo produz todo o conhecimento védico e esta manifestação cósmica.”

VERSO 175: “A vibração subsidiária tat tvam asi [“és o mesmo”] destina-se à compreensão da entidade viva, mas a vibração principal é o oṁkāra. Não se importando com o oṁkāra, Śaṅkarācārya enfatiza a vibração tat tvam asi.”

VERSO 176: Assim, Śrī Caitanya Mahāprabhu criticou o Śārīraka-bhāṣya de Śaṅkarācārya como imaginário, e apontou nele centenas de falhas. Contudo, para defender Śaṅkarācārya, Sarvabhauma Bhaṭṭācārya apresentou ilimitada oposição.

VERSO 177: O Bhaṭṭācārya apresentou várias espécies de argumentos falsos com falsa lógica e tentou derrotar seu adversário de muitas maneiras. No entanto, Śrī Caitanya Mahāprabhu rebateu todos esses argumentos e estabeleceu Sua própria convicção.

VERSO 178: Śrī Caitanya Mahāprabhu prosseguiu: “A Suprema personalidade de Deus é o ponto central de todas as relações, atuar em serviço devocional a Ele é a nossa verdadeira ocupação, e alcançar o amor a Deus é a meta última da vida. A literatura védica descreve esses três temas.”

VERSO 179: “Se alguém tenta explicar a literatura védica de maneira diferente, está se entregando à imaginação. Qualquer interpretação da versão védica, versão esta que é evidente por si mesma, é mera imaginação.”

VERSO 180: “Na realidade, não há falha da parte de Śaṅkarācārya. Ele simplesmente cumpriu a ordem da Suprema Personalidade de Deus. Ele tinha que imaginar alguma espécie de interpretação, daí ter apresentado uma espécie de literatura védica que é cheia de ateísmo.”

VERSO 181: “Dirigindo-Se ao senhor Śiva, a Suprema Personalidade de Deus disse: ‘Por favor, faze a população em geral se opor a Mim, imaginando tua própria interpretação dos Vedas. Além disso, encobre-Me de tal maneira que as pessoas fiquem mais interessadas em avançar na civilização material apenas para propagarem uma população destituída de conhecimento espiritual.’”

VERSO 182: “O senhor Śiva informou à deusa Durgā, a superintendente do mundo material: ‘Na era de Kali, assumo a forma de um brāhmaṇa e explico os Vedas por meio de escrituras falsas de maneira ateísta, similarmente à filosofia budista.’”

VERSO 183: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya ficou muito espantado ao ouvir isso. Ele ficou atordoado e não disse nada.

VERSO 184: Então, Śrī Caitanya Mahāprabhu lhe disse: “Não te espantes. Na realidade, o serviço devocional à Suprema Personalidade de Deus é a perfeição máxima da atividade humana.”

VERSO 185: “Mesmo os sábios satisfeitos consigo mesmos prestam serviço devocional ao Senhor Supremo. As qualidades transcendentais do Senhor são tamanhas que são plenas de uma potência espiritual inconcebível.”

VERSO 186: “‘Aqueles que são autossatisfeitos e não se deixam atrair por desejos materiais externos também se sentem atraídos pelo serviço amoroso a Śrī Kṛṣṇa, cujas qualidades são transcendentais e cujas atividades são maravilhosas. Hari, a Personalidade de Deus, é chamado de Kṛṣṇa por ser dotado de tais aspectos transcendentalmente atrativos.’”

VERSO 187: Após ouvir o verso ātmārāma, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse o seguinte a Śrī Caitanya Mahāprabhu: “Meu caro senhor, por favor, explica esse verso. Desejo muito ouvir a Tua explicação sobre ele.”

VERSO 188: O Senhor respondeu: “Primeiro, deixa-Me ouvir tua explicação. Depois disso, tentarei explicar o pouco que sei.”

VERSO 189: Então, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya começou a explicar o verso ātmārāma, e, de acordo com os princípios da lógica, levantou diversas premissas.

VERSO 190: O Bhaṭṭācārya explicou o verso ātmārāma de nove maneiras diferentes, com base nas escrituras. Após ouvir sua explicação, Śrī Caitanya Mahāprabhu, sorrindo levemente, começou a falar.

VERSO 191: Śrī Caitanya Mahāprabhu disse: “Meu caro Bhaṭṭācārya, és exatamente como Bṛhaspati, o sacerdote do reino celestial. De fato, ninguém neste mundo tem o poder de explicar as escrituras dessa maneira.”

VERSO 192: “Meu caro Bhaṭṭācārya, decerto explicaste esse verso com a mestria de tua vasta erudição, mas deves saber que, além dessa explicação erudita, há outro significado para o verso.”

VERSO 193: A pedido de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, o Senhor Caitanya Mahāprabhu começou a explicar o verso, sem tocar nas nove explicações dadas pelo Bhaṭṭācārya.

VERSO 194: Existem onze palavras no verso ātmārāma, e Śrī Caitanya Mahāprabhu explicou cada palavra, uma após outra.

VERSO 195: O Senhor Caitanya Mahāprabhu tomou cada palavra especificamente e a combinou com a palavra “ātmārāma”. Assim, Ele explicou a palavra “ātmārāma” de dezoito maneiras diferentes.

VERSO 196: Śrī Caitanya Mahāprabhu disse: “A Suprema Personalidade de Deus, Suas diferentes potências e Suas qualidades transcendentais têm todas valor inconcebível. Não é possível explicá-las por completo.”

VERSO 197: “Esses três itens atraem a mente de um estudante perfeito, ocupado em atividades espirituais, e superam todos os demais processos de atividade espiritual.”

VERSO 198: Śrī Caitanya Mahāprabhu explicou o significado do verso, dando evidências relativas a Śukadeva Gosvāmī e aos quatro ṛṣis Sanaka, Sanat-kumāra, Sanātana e Sanandana. Assim, o Senhor deu diversos significados e explicações.

VERSO 199: Ao ouvir Caitanya Mahāprabhu explicar o verso ātmārāma, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya se encheu de admiração. Compreendeu, então, que o Senhor Śrī Caitanya Mahāprabhu era Kṛṣṇa em pessoa e, deste modo, se condenou com as seguintes palavras.

VERSO 200: “Com certeza, Caitanya Mahāprabhu é o próprio Senhor Kṛṣṇa. Por não ter podido compreendê-lO e por estar muito orgulhoso de minha própria erudição, cometi muitas ofensas.”

VERSO 201: Quando Sārvabhauma Bhaṭṭācārya se condenou como um ofensor e se refugiou no Senhor, Este lhe desejou mostrar misericórdia.

VERSO 202: Para mostrar-lhe misericórdia, Śrī Caitanya Mahāprabhu permitiu que ele visse Sua forma de Viṣṇu. Assim, assumiu imediatamente a forma de quatro braços.

VERSO 203: Primeiro, Śrī Caitanya Mahāprabhu mostrou-lhe a forma de quatro braços e, então, apareceu perante ele em Sua forma original de Kṛṣṇa, com tez enegrecida e uma flauta nos lábios.

VERSO 204: Ao ver a forma do Senhor Kṛṣṇa manifesta em Caitanya Mahāprabhu, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya imediatamente se prostrou no chão para Lhe prestar reverências. Então, levantou-se e, de mãos postas, colocou-se a Lhe oferecer orações.

VERSO 205: Pela misericórdia do Senhor, todas as verdades se revelaram a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, que pôde entender, então, a importância de cantar o santo nome e distribuir o amor a Deus em toda parte.

VERSO 206: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya compôs cem versos em pouquíssimo tempo. Na verdade, nem mesmo Bṛhaspati, o sacerdote dos planetas celestiais, poderia compor versos tão rapidamente.

VERSO 207: Após ouvir os cem versos, Śrī Caitanya Mahāprabhu alegremente abraçou Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, que ficou logo tomado de amor extático por Deus e caiu inconsciente.

VERSO 208: Devido ao amor extático por Deus, o Bhaṭṭācārya verteu lágrimas, e seu corpo ficou cambaleante. Ele manifestou sintomas extáticos, transpirando, vibrando e tremendo. Ora dançava, ora cantava, ora chorava, ora caía para tocar os pés de lótus do Senhor.

VERSO 209: Estando Sārvabhauma Bhaṭṭācārya absorto nesse êxtase, Gopīnātha Ācārya ficou muito satisfeito. Todos os associados de Śrī Caitanya Mahāprabhu riram vendo o Bhaṭṭācārya dançar daquela maneira.

VERSO 210: Gopīnātha Ācārya disse ao Senhor Caitanya Mahāprabhu: “Senhor, provocaste tudo isso em Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.”

VERSO 211: Śrī Caitanya Mahāprabhu respondeu: “Tu és um devoto. Devido à tua associação, o Senhor Jagannātha lhe mostrou misericórdia.”

VERSO 212: Depois disso, Śrī Caitanya Mahāprabhu apaziguou o Bhaṭṭācārya, que, ao se acalmar, ofereceu muitas orações ao Senhor.

VERSO 213: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse: “Meu querido Senhor, tens salvado o mundo inteiro, mas essa não é uma tarefa muito grande. Contudo, também salvaste a mim, o que é, certamente, uma obra de poderes muito maravilhosos.”

VERSO 214: “Eu me tornara obtuso em razão de ler excessivamente tantos livros sobre lógica. Em decorrência disso, eu me tornara como uma barra de ferro. Não obstante, Tu me derreteste, e, por causa disso, Tua influência é imensa.”

VERSO 215: Após ouvir as orações oferecidas por Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, Śrī Caitanya Mahāprabhu regressou à Sua residência, e o Bhaṭṭācārya, por intermédio de Gopīnātha Ācārya, convenceu o Senhor a almoçar ali.

VERSO 216: De manhã cedo, no dia seguinte, Śrī Caitanya Mahāprabhu foi visitar o Senhor Jagannātha no templo, e viu o Senhor levantar-Se da cama.

VERSO 217: O sacerdote de lá O presenteou com guirlandas e prasāda que haviam sido oferecidas ao Senhor Jagannātha. Isso agradou muito Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 218: Atando cuidadosamente a prasāda e as guirlandas na fímbria de Sua veste, Caitanya Mahāprabhu dirigiu-Se às pressas para a casa de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.

VERSO 219: Ele chegou à casa do Bhaṭṭācārya um pouco antes do alvorecer, justamente quando o Bhaṭṭācārya se levantava da cama.

VERSO 220: Enquanto se levantava da cama, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya cantou distintamente: “Kṛṣṇa, Kṛṣṇa.” O Senhor Caitanya ficou muito satisfeito ao ouvi-lo cantar o santo nome de Kṛṣṇa.

VERSO 221: O Bhaṭṭācārya percebeu que Śrī Caitanya Mahāprabhu estava do lado de fora; apressado, foi até Ele e ofereceu orações a Seus pés de lótus.

VERSO 222: O Bhaṭṭācārya ofereceu um tapete como assento ao Senhor, e ambos se sentaram nele. Então, Śrī Caitanya Mahāprabhu abriu a prasāda e a colocou nas mãos do Bhaṭṭācārya.

VERSO 223: Até aquele momento, o Bhaṭṭācārya não lavara sequer sua boca, nem tomara banho ou concluíra seus deveres matinais. Não obstante, ficou muito satisfeito de receber a prasāda do Senhor Jagannātha.

VERSO 224: Pela misericórdia de Śrī Caitanya Mahāprabhu, erradicou-se toda a estupidez da mente de Sārvabhauma Bhaṭṭācārya. Após recitar os dois versos a seguir, ele comeu a prasāda oferecida a ele.

VERSO 225: O Bhaṭṭācārya disse: “‘Deve-se comer a mahā-prasāda do Senhor logo ao recebê-la, mesmo que esteja seca, mofada ou tenha sido trazida de uma terra distante. Não se deve considerar nem tempo nem lugar.’”

VERSO 226: “‘Um cavalheiro deve comer a prasāda do Senhor Kṛṣṇa tão logo a receba; não deve haver hesitação. Não existem princípios reguladores relacionados a tempo e lugar. Essa é a ordem da Suprema Personalidade de Deus.’”

VERSO 227: Śrī Caitanya Mahāprabhu ficou muito satisfeito ao ver isso. Ele entrou em êxtase de amor a Deus e abraçou Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.

VERSO 228: O Senhor e o servo se abraçaram mutuamente e começaram a dançar. Pelo simples fato de se tocarem, ficaram extáticos.

VERSO 229: Enquanto dançavam e se abraçavam, sintomas espirituais se manifestaram em seus corpos. Transpiravam, tremiam e vertiam lágrimas. Em meio ao Seu êxtase, o Senhor começou a falar.

VERSO 230: Śrī Caitanya Mahāprabhu disse: “Hoje conquistei os três mundos muito facilmente. Hoje ascendi ao mundo espiritual!”

VERSO 231: Caitanya Mahāprabhu prosseguiu: “Acho que hoje todos os Meus desejos foram realizados, pois vejo que Sārvabhauma Bhaṭṭācārya adquiriu fé na mahā-prasāda do Senhor Jagannātha.”

VERSO 232: “Na verdade, hoje te refugiaste indubitavelmente aos pés de lótus de Kṛṣṇa, e Kṛṣṇa, sem reservas, tornou-Se muito misericordioso para contigo.”

VERSO 233: “Meu querido Bhaṭṭācārya, hoje te libertaste do cativeiro material, cativeiro este decorrente do conceito corpóreo de vida. Despedaçaste os grilhões da energia ilusória.”

VERSO 234:  “Hoje, tua mente se tornou apta para se abrigar aos pés de lótus de Kṛṣṇa, pois, superando os princípios reguladores védicos, comeste os restos do alimento oferecido ao Senhor.” 

VERSO 235: “‘Quando alguém se refugia sem reservas aos pés de lótus da Suprema Personalidade de Deus, o ilimitado e misericordioso Senhor lhe concede Sua misericórdia imotivada. Assim, pode atravessar o intransponível oceano da ignorância. Aqueles cuja inteligência está fixa no conceito corpóreo – pensando: ‘Eu sou este corpo’ – são alimentos adequados para cães e chacais. A tais pessoas, o Senhor Supremo jamais concede Sua misericórdia.’”

VERSO 236: Após falar a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya dessa maneira, Śrī Caitanya Mahāprabhu regressou à Sua residência. Daquele dia em diante, o Bhaṭṭācārya ficou livre, pois seu falso orgulho havia sido desmoronado.

VERSO 237: Daquele dia em diante, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya não queria saber de nada além dos pés de lótus do Senhor Caitanya Mahāprabhu, e, daquele dia em diante, só conseguia explicar as escrituras reveladas de acordo com o processo do serviço devocional.

VERSO 238: Ao ver que Sārvabhauma Bhaṭṭācārya se fixara firmemente no culto do vaiṣṇavismo, Gopīnātha Ācārya, seu cunhado, começou a dançar, batendo palmas e cantando: “Hari! Hari!”

VERSO 239: The next day, the Bhaṭṭācārya went to visit the temple of Lord Jagannātha, but before he No dia seguinte, o Bhaṭṭācārya foi visitar o templo do Senhor Jagannātha, mas, antes de chegar ao templo, foi ver Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 240: Ao encontrar o Senhor Caitanya Mahāprabhu, o Bhaṭṭācārya se prostrou estirado para Lhe prestar respeitos. Após Lhe oferecer diversas orações, ele, com grande humildade, passou a falar de sua indisposição anterior.

VERSO 241: Então, o Bhaṭṭācārya perguntou a Caitanya Mahāprabhu: “Qual é o item mais importante na execução do serviço devocional?” O Senhor respondeu que o item mais importante era cantar o santo nome do Senhor.

VERSO 242: “‘Nesta era de desavenças e hipocrisia, o único meio de liberação é o cantar dos santos nomes do Senhor. Não há outra maneira. Não há outra maneira. Não há outra maneira.’”

VERSO 243: Śrī Caitanya Mahāprabhu explicou muito elaboradamente o verso harer nama do Bṛhan-nāradīya Purāṇa, e Sārvabhauma Bhaṭṭācārya se encheu de admiração ao ouvir Sua explicação.

VERSO 244: Gopīnātha Ācārya lembrou a Sārvabhauma Bhaṭṭācārya: “Meu querido Bhaṭṭācārya, o que eu te havia predito aconteceu agora.”

VERSO 245: Prestando suas reverências a Gopīnātha Ācārya, o Bhaṭṭācārya disse: “Como temos relação um com o outro e como és um devoto, o Senhor, por tua misericórdia, mostrou-me misericórdia.”

VERSO 246: “És um devoto de primeira classe, ao passo que eu estou na escuridão dos argumentos lógicos. Devido à tua relação com o Senhor, Ele me concedeu Sua bênção.”

VERSO 247: Śrī Caitanya Mahāprabhu ficou muito satisfeito com essa declaração humilde. Após abraçar o Bhaṭṭācārya, Ele disse: “Agora, vai ao templo ver o Senhor Jagannātha.”

VERSO 248: Após visitar o templo do Senhor Jagannātha, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya regressou para casa com Jagadānanda e Dāmodara.

VERSO 249: O Bhaṭṭācārya trouxe grande quantidade dos restos do excelente alimento abençoado pelo Senhor Jagannātha. Ele deu toda essa prasāda a seu próprio servo brāhmaṇa, bem como a Jagadānanda e a Dāmodara.

VERSO 250: Então, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya compôs dois versos na folha de uma palmeira. Dando a folha de palmeira a Jagadānanda Prabhu, solicitou-lhe que a entregasse a Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 251: Em seguida, Jagadānanda e Dāmodara regressaram a Śrī Caitanya Mahāprabhu levando-Lhe tanto a prasāda quanto a folha de palmeira na qual haviam sido compostos os versos. Porém, Mukunda Datta tomou a folha de palmeira das mãos de Jagadānanda antes que este pudesse entregá-la a Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 252: Então, Mukunda Datta copiou os dois versos na parede externa do quarto. Depois disso, Jagadānanda pegou a folha de palmeira de Mukunda Datta e a entregou ao Senhor Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 253: Assim que o Senhor Caitanya Mahāprabhu leu os dois versos, imediatamente rasgou a folha de palmeira. Contudo, todos os devotos leram esses versos na parede externa, guardando-os dentro de seus corações. Os versos diziam o seguinte.

VERSO 254: “Que eu me refugie na Suprema Personalidade de Deus, Śrī Kṛṣṇa, que fez Seu advento na forma do Senhor Caitanya Mahāprabhu para nos ensinar o conhecimento verdadeiro, o Seu serviço devocional e o desapego de tudo que não promova a consciência de Kṛṣṇa. Ele desceu porque é um oceano de misericórdia transcendental. Rendo-me a Seus pés de lótus.”

VERSO 255: “Que minha consciência, a qual é como uma abelha, refugie-se aos pés de lótus da Suprema Personalidade de Deus, que acaba de aparecer como Śrī Kṛṣṇa Caitanya Mahāprabhu para ensinar o antigo sistema de serviço devocional prestado a Ele mesmo. Esse sistema estava quase perdido devido à influência do tempo.”

VERSO 256: Esses dois versos compostos por Sārvabhauma Bhaṭṭācārya sempre proclamarão seu nome e fama tão alto quanto um tambor estrondoso, pois eles se tornaram colares de pérola em volta do pescoço de todos os devotos.

VERSO 257: Na verdade, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya se tornou um devoto imaculado de Caitanya Mahāprabhu; ele não conhecia nada senão o serviço ao Senhor.

VERSO 258: O Bhaṭṭācārya sempre cantava o santo nome de Śrī Kṛṣṇa Caitanya, o filho de mãe Śacī e o reservatório de todas as boas qualidades. Na verdade, cantar os santos nomes passou a ser sua meditação.

VERSO 259: Certo dia, Sārvabhauma Bhaṭṭācārya foi ter com Caitanya Mahāprabhu e, prestando-Lhe reverências, começou a recitar um verso.

VERSO 260: Ele começou a citar uma das orações oferecidas pelo senhor Brahmā no Śrīmad-Bhāgavatam; mudou, porém, duas sílabas ao final do verso.

VERSO 261: [O verso dizia:] “Aquele que busca Tua compaixão e assim tolera toda espécie de condições adversas decorrentes ao karma de seus atos passados, que se ocupa sempre em Teu serviço devocional, com mente, palavras e corpo, e que sempre Te presta reverências é, com certeza, um candidato genuíno a se tornar Teu devoto imaculado.”

VERSO 262: Śrī Caitanya Mahāprabhu imediatamente lhe chamou a atenção: “Neste verso, a palavra é ‘mukti-pade’, mas tu a mudaste para ‘bhakti-pade’. Qual é a tua intenção?”

VERSO 263: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya respondeu: “O despertar de amor puro por Deus, que é o resultado do serviço devocional, supera de longe o libertar-se do cativeiro material. Para aqueles que são avessos ao serviço devocional, fundir-se na refulgência Brahman é uma espécie de punição.”

VERSOS 264-265: O Bhaṭṭācārya prosseguiu: “Os impersonalistas, os quais não aceitam a forma transcendental do Senhor Śrī Kṛṣṇa, e os demônios, que vivem blasfemando-O e lutando contra Ele, são punidos com a fusão na refulgência Brahman. Isso, porém, não acontece à pessoa ocupada em serviço devocional ao Senhor.”

VERSO 266: “Existem cinco espécies de liberação: sālokya, sāmīpya, sārūpya, sārṣṭi e sāyujya.”

VERSO 267: “Havendo oportunidade de servir à Suprema Personalidade de Deus, o devoto puro às vezes aceita as formas de liberação sālokya, sārūpya, sāmīpya ou sārṣṭi, mas nunca aceita sāyujya.”

VERSO 268: “O devoto puro não gosta nem mesmo de ouvir sobre sāyujya-mukti, que lhe inspira temor e repugnância. Na verdade, o devoto puro preferiria ir para o inferno a se fundir na refulgência do Senhor.”

VERSO 269: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya continuou: “Existem duas classes de sāyujya-mukti: fundir-se na refulgência Brahman e fundir-se no corpo pessoal do Senhor. Fundir-se no corpo do Senhor é ainda mais abominável do que se fundir em Sua refulgência.”

VERSO 270: Sārvabhauma Bhaṭṭācārya concluiu: “‘Mesmo que se ofereçam ao devoto puro todas as espécies de liberação, ele não as aceita. Ele está plenamente satisfeito ocupado a serviço do Senhor.’”

VERSO 271: O Senhor Śrī Caitanya Mahāprabhu respondeu: “A palavra ‘mukti-pade’ tem outro significado. Mukti-pada refere-se diretamente à Suprema Personalidade de Deus.”

VERSO 272: “Todas as classes de liberação existem sob os pés da Suprema Personalidade de Deus; Ele é conhecido, portanto, como mukti-pada. Segundo outro significado, mukti é o nono assunto, e a Suprema Personalidade de Deus é o abrigo da liberação.”

VERSO 273: “Visto que posso compreender Kṛṣṇa de acordo com esses dois significados”, disse Caitanya Mahāprabhu, “que necessidade há de mudar o verso?” Sārvabhauma Bhaṭṭācārya respondeu: “Eu não era capaz de fazer essa leitura do verso.”

VERSO 274: “Embora Tua explicação seja correta, não se deve usá-la, pois há ambiguidade na palavra ‘mukti-pada’.”

VERSO 275: “Embora a palavra ‘mukti’ se refira às cinco classes de liberação; geralmente, seu sentido direto transmite a ideia de alguém se tornar uno com o Senhor.”

VERSO 276: “O próprio som da palavra ‘mukti’ de imediato induz repulsa e temor, mas, ao dizermos a palavra ‘bhakti’, naturalmente sentimos na mente bem-aventurança transcendental.”

VERSO 277: Ao ouvir esta explicação, o Senhor começou a rir e, com grande prazer, imediatamente deu um forte abraço em Sārvabhauma Bhaṭṭācārya.

VERSO 278: Na verdade, aquela mesma pessoa que estava acostumada a ler e a ensinar filosofia māyāvāda agora chegava a odiar a palavra “mukti”. Isso só foi possível pela misericórdia de Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 279: Ninguém pode reconhecer que uma pedra desconhecida seja a pedra filosofal enquanto ela não transformar, pelo seu toque, o ferro em ouro.

VERSO 280: Ao perceberem o vaiṣṇavismo transcendental manifesto em Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, todos puderam entender que o Senhor Caitanya não era nenhum outro senão Kṛṣṇa, o filho de Nanda Mahārāja.

VERSO 281: Após esse incidente, todos os habitantes de Jagannātha Purī, liderados por Kāśī Miśra, foram refugiar-se aos pés de lótus do Senhor.

VERSO 282: Mais tarde, descreverei como Sārvabhauma Bhaṭṭācārya sempre se ocupava a serviço do Senhor.

VERSO 283: Também descreverei, com todos os pormenores, como Sārvabhauma Bhaṭṭācārya prestou perfeito serviço a Śrī Caitanya Mahāprabhu oferecendo-Lhe doações.

VERSOS 284-285: Se alguém ouvir com fé e amor esses passatempos relacionados ao encontro do Senhor Caitanya Mahāprabhu com Sārvabhauma Bhaṭṭācārya, ele se livrará, muito em breve, da rede de especulação e atividades fruitivas e alcançará o abrigo aos pés de lótus de Śrī Caitanya Mahāprabhu.

VERSO 286: Orando aos pés de lótus de Śrī Rūpa e Śrī Raghunātha, desejando sempre a misericórdia deles, eu, Kṛṣṇadāsa, narro o Śrī Caitanya-caritāmṛta, seguindo seus passos.

« Previous Next »